Título: Receita tenta compensar gastança
Autor: Lu Aiko Otta
Fonte: O Estado de São Paulo, 07/08/2006, Economia, p. B5
A fiscalização da Receita Federal vai ficar mais rigorosa na segunda metade deste ano, para aumentar a arrecadação e sustentar o aumento das despesas do governo. Os Ministérios da Fazenda e do Planejamento aumentaram em R$ 4,5 bilhões a meta de arrecadação federal de 2006.
Esse aumento embute os efeitos do crescimento econômico, da alta do petróleo - que vem levando a arrecadação sobre o setor a saltos surpreendentes-, e também dos ganhos com a fiscalização, tanto na área da Receita quanto na da Previdência.
Já contando com o incremento de receitas dessas e de outras fontes, o presidente Lula assinou semana passada um decreto elevando os gastos do segundo semestre em R$ 4,8 bilhões. O dinheiro foi entregue aos Ministérios dos Transportes e do Desenvolvimento Agrário.
¿O governo vinculou o reajuste salarial da categoria ao cumprimento da nova meta de arrecadação¿, disse o presidente do Sindicato Nacional dos Auditores Fiscais (Unafisco), Carlos André Soares Nogueira. Caso a meta seja cumprida, os fiscais da ativa receberão um reajuste da ordem de 34% e os fiscais aposentados, 30%.
Como forma de apertar a fiscalização, a entidade sugeriu à Receita um controle mais estrito sobre as compensações de crédito tributário. Essas são operações em que uma empresa quita tributos utilizando impostos pagos indevidamente em outras transações. Por exemplo: uma empresa que produza bens para exportar (sobre os quais, em tese, não deve incidir imposto algum) tem direito a créditos tributários no valor dos tributos que vieram embutidos nos preços das matérias-primas que utilizou. Ela pode usar esses créditos para pagar outros impostos que tenha a recolher. Embora tecnicamente correto, esse mecanismo é sujeito a fraudes, das quais a mais comum é a utilização de créditos inexistentes.
¿Há um estoque de R$ 70 bilhões em compensações que precisariam ser revistas¿, disse o presidente da Unafisco. Ele disse que, em alguns Estados, uma fiscalização mais rigorosa mostrou que 80% dos créditos tributários compensados era irregular.
A maior parte dos R$ 4,5 bilhões de arrecadação extra, porém, não virá de operações especiais de fiscalização, mas dos recolhimentos regulares que a Petrobrás faz aos cofres federais. Graças à alta do petróleo no mercado internacional, os lucros da empresa têm ficado acima do esperado, engordando a arrecadação do Imposto de Renda da Pessoa Jurídica (IRPJ) e da Contribuição Social sobre o Lucro Líquido (CSLL).
Além desses dois tributos, que aumentam a chamada ¿receita administrada¿, o preço do petróleo puxou para cima o recolhimento dos royalties sobre a exploração. Eles engordam um item chamado ¿outras receitas¿, cujo crescimento sustentou as despesas ao longo do primeiro semestre.
O pagamento de tributos pelo setor de petróleo e combustíveis só em junho passado foi R$ 1,2 bilhão maior do que o de junho de 2005. Foi uma surpresa para a própria Receita.
REFIS 3
O comando da Receita conta com mais um fator para impulsionar a arrecadação este ano: o Refis 3. O programa, adotado pelo governo por pressão do Congresso Nacional, cria condições para que empresas em débito com o Leão acertem suas contas.
O coração do Refis 3 é o parcelamento, em até 130 meses, de dívidas tributárias (estimadas em R$ 880 bilhões). Para ter direito a esse parcelamento o empresário não pode atrasar nem a prestação da dívida, nem os impostos que vencem regularmente a cada mês. Por isso, em tese, o Refis 3 aumentará a arrecadação.
Mas os técnicos apostam as fichas em um outro item do Refis 3: o que permite o pagamento à vista das dívidas tributárias vencidas até fevereiro de 2003, com desconto de 30% nos juros e de 80% nas multas. Para a Receita, essa medida ajudará a elevar o caixa no fim do ano.
Everardo Maciel, ex-secretário da Receita, acha que a elevação da arrecadação é apenas um ajuste a partir de um cálculo conservador feito no início do ano. ¿É um aumento da ordem de 1%, que é uma margem de erro razoável¿, disse. ¿Não há razões excepcionais para o aumento da Receita, não houve aumento da pressão fiscal.¿