Título: Balança não ajuda a elevar o PIB
Autor: Márcia De Chiara
Fonte: O Estado de São Paulo, 20/08/2006, Economia, p. B3

Pela primeira vez desde 2000 o setor externo dará contribuição negativa para o desempenho do Produto Interno Bruto (PIB) neste ano, por causa do real valorizado em relação ao dólar e da elevada taxa de juros, que mantém o câmbio baixo.

Nas contas da LCA Consultores, o saldo das exportações e importações de produtos e serviços deve contribuir com 0,9 ponto porcentual negativo para o desempenho do PIB, a soma de todas as riquezas produzidas no País. A consultoria acaba de rever de 3,8% para 3,7% a taxa de crescimento do PIB deste ano por causa do recuo das projeções do PIB agrícola, de 3,1% para 2,8%, e da produção industrial, de 4,7% para 4,2%.

Segundo o economista da LCA, Braulio Borges, a contribuição negativa do setor externo é a maior desde 1995 (-3 pontos porcentuais). ¿É o efeito do câmbio aparecendo no PIB¿, ressalta. Segundo ele, o que vai sustentar o crescimento da economia é a demanda doméstica, com contribuição de 4,6 pontos porcentuais neste ano. No ano passado, o PIB cresceu 2,3%. O setor externo contribuiu com 0,8 ponto porcentual e a demanda doméstica com 1,5 ponto porcentual. A demanda doméstica inclui o consumo das famílias, do governo, os investimentos e a variação dos estoques da economia como um todo.

A MB Associados é outra consultoria que revisou para baixo a taxa de crescimento da produção industrial deste ano, de 4,5% para 3,8%, e aguarda só o resultado do PIB do segundo trimestre para ajustar o PIB deste ano. ¿A nossa estimativa é de um crescimento de 3,5% com viés de baixa¿, diz o economista Sergio Valle. Ele explica que o viés de baixa pode sinalizar um crescimento de 3%, com recuo de 0,5 ponto porcentual em relação à previsão atual. ¿O crescimento de 4% previsto pelo governo está completamente descartado.¿

Valle diz que os primeiros indicadores de julho, como a produção de veículos, papelão ondulado, consumo de energia elétrica e o pedágio nas rodovias, em termos absolutos, foram bons. Mas, retirando os efeitos sazonais, o resultado não é animador.

¿Pelo nosso modelo, esses indicadores antecedentes mostram que a produção industrial de julho teria crescido 2,4% ante o ano passado, o que é pouco, e só 0,2% ante junho.¿ O economista lembra que em julho de 2005 a indústria começou a dar os primeiros sinais de enfraquecimento, portanto a base de comparação é fraca.

JUROS ALTOS

Além do efeito negativo do setor externo sobre o desempenho do PIB, Valle destaca que o reflexo da política monetária de juros altos sobre a demanda está sendo mais forte do que o previsto. ¿Mesmo com o aumento do salário mínimo, da Bolsa Família e o reajuste do funcionalismo público, a demanda interna não está reagindo.¿

¿Nosso crescimento é envergonhado. Estamos crescendo com o freio de mão puxado¿, observa o diretor da RC Consultores, Fábio Silveira. Na sua avaliação, a principal trava do ritmo de crescimento é o juro real elevado, hoje de 9,4%, diante de uma Selic de 14,75% ao ano.

O segundo fator negativo, destaca, é a perda de dinamismo do setor exportador, por causa do real valorizado. Esse setor é um grande empregador de mão-de-obra, o que ajuda a disseminar a retração para outros setores. O terceiro inibidor do ritmo de atividade é a crise da agricultura que afetou a renda nas cidades do interior.

Silveira diz que reduziu de 4,5% para 4% o crescimento da produção industrial, mas manteve em 3,7% a projeção para o PIB. ¿Estamos bem calibrados.¿ Seguindo essa linha, o Santander Banespa acaba de reduzir, de 4,1% para 3,7% , a previsão para o PIB deste ano.