Título: Missão da ONU sobre corrupção, só após eleições
Autor: Jamil Chade
Fonte: O Estado de São Paulo, 23/08/2006, Nacional, p. A12

A Organização das Nações Unidas (ONU) fará investigação sobre a corrupção no Brasil, mas foi aconselhada por membros do governo a não iniciar a missão no País antes de terminarem as eleições. A relatora especial das Nações Unidas para o Combate à Corrupção, Christy Mbonu, está em negociações com o governo desde fevereiro para agendar a missão. O Brasil será o primeiro país fora da África a ser avaliado pela ONU. A especialista admite que seu plano inicial era uma visita em junho, mas recebeu a sugestão de diplomatas de não ir ao País antes que as eleições acabassem.

"Eu queria ir ao Brasil em junho, mas me disseram que seria difícil antes de outubro", explicou Christy. Segundo as Nações Unidas, a previsão é de que a viagem ocorra no início de 2007.

Em Brasília, membros do governo negam que o problema seja a eleição em si e impactos de uma eventual visita. O obstáculo seria a agenda dos principais ministros.

A especialista conta que não pretende ir ao Brasil "para descobrir um novo escândalo ou incriminar algum político". "O que estou fazendo é debatendo quais os mecanismos que cada governo e sociedade tem para combater a corrupção. Quero levantar por que o combate à corrupção funciona em alguns locais e não em outros", afirmou Christy. As conclusões sobre sua visita serão publicadas em um relatório que será enviado a todos os governos.

Ela também preparou um questionário que enviará ao governo, onde pede explicações sobre o que é feito contra a corrupção de funcionários públicos, membros do governo e ainda alerta para o financiamento de partidos e como a lei regula as atividades partidárias. Outro ponto do questionário são as irregularidades em licitações públicas, além da corrupção do Judiciário. "Se há corrupção entre os juízes, um país não tem nem como punir os corruptos", disse.

Desde que assumiu seu posto, em 2004, a relatora da ONU já visitou Quênia e Nigéria, seu país de origem e considerado o mais corrupto do mundo. "Existe relação clara entre corrupção e pobreza. Se há corrupção, não há como ter uma sociedade que luta pelo desenvolvimento. A corrupção contamina todos os direitos básicos: o direito à vida, à alimentação, direitos civis e políticos. Enfim, a corrupção está na base de várias violações", afirmou .

Em um documento enviado à Subcomissão de Direitos Humanos da ONU, a relatora ainda considera a corrupção um "câncer" na sociedade, que afeta a confiança de investidores, promove a desigualdade, mina a lei, a administração da Justiça e é completamente subversiva a um sistema eleitoral e a uma participação democrática .

Para várias organizações internacionais, os países africanos são os mais corruptos do mundo. A ONU também quer enviar sua relatora à China, mas a autorização para entrar no país é difícil.

No caso do Brasil, o governo se comprometeu a aceitar a entrada de todos os relatores da ONU. A promessa está sendo cumprida, ainda que a data das visitas seja alvo de negociações, como no caso da relatora contra a corrupção.