Título: O controle da poluição
Autor:
Fonte: O Estado de São Paulo, 16/07/2006, Notas e Informações, p. A3

Em 20 anos, o Programa de Controle da Poluição do Ar por Veículos Automotores (Proconve) atingiu duas metas: reduzir drasticamente os volumes de emissão de poluentes pela frota nacional de veículos leves e incentivar o desenvolvimento tecnológico brasileiro. Nesse período, as normas instituídas pelo programa e a disposição da indústria de autopeças, das montadoras e das refinarias em cumpri-las tornaram possível o desenvolvimento de técnicas incorporadas à fabricação dos veículos, de tal eficiência que a emissão de alguns tipos de gases caiu em até 99%, como foi o caso do monóxido de carbono.

Além dos benefícios ambientais, o País se valeu das vantagens econômicas proporcionadas pelo programa. Os automóveis nacionais estão entre os mais competitivos em mercados externos que exigem alto padrão tecnológico nos equipamentos de controle de emissão de gases.

Também a qualidade da gasolina brasileira melhorou. Há 20 anos, o produto apresentava alta concentração de chumbo tetraetílico, composto altamente poluente. Em 1991, o combustível nacional tornou-se o primeiro do mundo a ficar totalmente isento da substância que ataca o sistema nervoso humano, quando inalado em altas concentrações. Também o teor de enxofre do diesel foi reduzido.

Em 1986, quando o Proconve foi instalado, um veículo leve saído das montadoras brasileiras emitia 54 gramas de monóxido de carbono por quilômetro rodado. Hoje, esse índice é de apenas 0,3 grama. Reduções drásticas também foram registradas em relação a emissão de hidrocarbonetos (95%), monóxidos de hidrogênio (94%) e aldeídos (92%).

É evidente que esses números não se reproduzem na mesma proporção na qualidade do ar das grandes cidades. A eficiência no controle da poluição é registrada apenas entre os carros recém-fabricados. Como a frota nacional tem idade média de 10 anos (5 milhões de veículos têm mais de 15 anos e rodam em situação precária) e grande parte dos veículos não têm manutenção adequada, o desempenho dos equipamentos instalados para controle da emissão de poluentes fica comprometido.

Além disso, o Proconve ainda não conseguiu bons resultados nas frotas de veículos pesados (ônibus e caminhões), que rodam movidos a diesel, combustível com alto teor de enxofre. O crescimento desordenado das motos no trânsito das cidades também precisa de atenção, uma vez que a emissão de poluentes desse tipo de veículo é bastante alta se comparada com a dos automóveis novos.

Mas alguns efeitos benéficos já podem ser registrados nas condições atmosféricas, principalmente nas grandes concentrações urbanas, onde os alertas por causa da concentração de poluentes são muito menos freqüentes. Conforme dados da Companhia de Tecnologia de Saneamento Ambiental (Cetesb), no ano passado, apenas uma vez a concentração de monóxido de carbono ultrapassou o limite considerado seguro para a saúde pública, de 9 ppm (partículas por milhão).

A população das regiões metropolitanas e das grandes cidades está, no entanto, ainda longe de respirar ar puro. Para isso, o mesmo empenho do governo em implantar o Proconve terá de ser demonstrado em outras iniciativas. A frota de veículos continuará crescendo, envelhecendo e, sem o programa de inspeção que obriga revisões anuais de itens mecânicos e de segurança, mais e mais carros, caminhões, ônibus e motos circularão sem condições de uso. A regulamentação desse programa, instituído pelo Código de Trânsito Brasileiro, está engavetada no Congresso desde 2001.

O motivo é a disputa pela arrecadação resultante dessas vistorias. Governadores e prefeitos do País brigam pelo direito de realizar a inspeção e, assim, garantir a receita. Enquanto isso, avanços como os obtidos pelo Proconve são colocados em risco, uma vez que o programa segue etapas que devem ser rigorosamente cumpridas até 2020 para que os níveis de emissão de poluentes baixem cada vez mais. Obstáculos como o jogo de interesses dos governantes podem não só atrasar o programa, como comprometer seriamente seus resultados.

Shopping Estadão