Título: Sem nem fazer campanha, Sarney deve se reeleger pelo AP
Autor: João Domingos
Fonte: O Estado de São Paulo, 16/07/2006, Nacional, p. A11

O ex-presidente José Sarney se preparou em duas frentes para, aos 76 anos, ter vida fácil na sua terceira campanha para se eleger senador pelo PMDB do Amapá. Na esfera federal, ao manter o apoio à reeleição do presidente Luiz Inácio Lula da Silva, Sarney assegurou a continuidade da liberação de verbas para o Estado. E, no plano local, conseguiu garantir para si o direito de ser o único candidato dos grandes partidos a disputar o Senado.

Sarney terá, portanto, o apoio de uma imensa frente que inclui, além do seu PMDB, o PT, o PSDB, o PDT, o PP, o PPS e o PTB. Entre os oito que vão lutar para tomar a vaga de Sarney, a única que pode dar um pouco de trabalho ao ex-presidente é Cristina Almeida, do PSB. O PFL lançou José Negreiros de Araújo apenas para preencher a vaga de candidato, visto que está numa outra coligação. O PSOL disputará com a professora Celisa Capellari, sem maiores pretensões.

Os outros que têm candidato a senador são os nanicos PCB, PAN, PMN, PSL e PSTU, sem nenhuma condição de competir. Se bem que Liduína Bastos do Nascimento (PSTU), de 42 anos, mãe de quatro filhos, cobradora de ônibus nascida no interior do Ceará, promete atazanar a vida de Sarney.

"Vou dizer que o povo do Amapá tem de expulsar o Sarney daqui", afirma ela.

O próprio Sarney nem sabe quem são seus adversários. "São duas moças, uma muito competente, a Cristina", diz ele. Cristina tem 40 anos, fama de brigona e é negra. Foi soldado da PM e atualmente é funcionária da Assembléia Legislativa. Na divisão do governo Lula entre os partidos aliados, ela recebeu a superintendência do Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (Incra).

Quando o PSB do Amapá rompeu com Lula, Cristina perdeu o cargo. Voltou para a Assembléia Legislativa. O presidente da Assembléia, Jorge Amanajás (PSDB), adversário de Cristina, recusou-se a lhe arrumar um lugar. Ela pegou suas coisas e foi para o setor de serviços gerais, tirou a vassoura de trás da porta e começou a trabalhar na limpeza.

Hoje está licenciada para fazer a campanha. "Tenho certeza de que vou crescer muito. Vou lutar para vencer o Sarney", diz . Cristina, no entanto, nunca disputou uma eleição.

Vai ser difícil para ela. Não só pelos partidos que estão por trás do ex-presidente, caso raro de união entre os adversários PT e PSDB. Mas porque Sarney é uma espécie de entidade que reina absoluta no Amapá.

Ele nem vai lá fazer campanha. Manda que os outros digam que é candidato. Quando visita o Estado, sua chegada é notícia nos jornais.

Mas mesmo à distância, Sarney é o político mais presente no Estado.

Tudo lembra o ex-presidente. Quem conseguiu a verba para a transformação de um acanhado aeroporto em aeroporto internacional? Sarney. Quem incluiu Macapá e Santana na Zona Franca de Manaus? Sarney.

Quem lutou para levar a famosa Rede Sarah de Hospitais para o Amapá? Sarney, claro. Uma rede de postos de gasolina tem o nome de Presidente Sarney. Um restaurante no centro de Macapá também. É a homenagem em vida ao benfeitor.

Na quarta-feira ele encaminhou projeto ao Senado para criar a Universidade Federal do Oiapoque. Aliado do presidente Lula desde a campanha de 2002, ninguém duvida de que vai conseguir aprovar a nova faculdade.

"Eu me dou muito bem com o senador Sarney e também com o presidente Lula. Isso é muito importante para conseguir trazer verbas para o Estado e fazer obras como a do aeroporto, da Zona Franca, do Sarah, da BR-156, que liga Macapá a Oiapoque, na fronteira com a Guiana Francesa, e da ponte sobre o Rio Jari, para nos ligar ao Pará", atesta o governador Valdez Goes (PDT), candidato à reeleição. Ele tem o apoio irrestrito de Sarney para tentar um novo mandato contra o forte adversário João Capiberibe, do PSB.

O Amapá existe como território desde 1945, quando deixou de pertencer ao Estado do Pará. Transformado pela Constituição de 1988 em Estado, a partir de 1990 elegeu Sarney seu primeiro senador com mandato de oito anos. Desde então, Amapá e Sarney caminham juntos.