Título: Exportadores começam a virar o jogo
Autor: Márcia De Chiara
Fonte: O Estado de São Paulo, 16/07/2006, Economia, p. B1

Fabricantes de calçados, móveis , alimentos e até de tecidos, produtos manufaturados com forte presença no mercado internacional, decidiram parar de lamentar os efeitos negativos da baixa cotação do dólar em relação ao real nas vendas externas e começam a virar o jogo das exportações.

As alternativas para reverter a queda nas vendas incluem desde o aumento da fatia no mercado doméstico, passam pelo corte nos custos e chegam ao caso extremo, que é a "exportação" de fábricas para países vizinhos, como a Argentina.

A mudança no humor das indústrias exportadoras fica nítida na prévia da 160ª Sondagem Conjuntura da Indústria de Transformação da Fundação Getúlio Vargas. Para 8% das 513 indústrias consultadas, o nível de demanda externa aumentou neste mês e para 13% houve queda. Em julho de 2005, 5% das companhias informaram que a demanda externa crescia e 28% disseram que recuava.

De acordo com a pesquisa, a diferença entre o porcentual de empresas que avaliam a demanda externa positiva e negativamente é hoje de 5 pontos porcentuais negativos, um resultado bem melhor do que os 23 pontos negativos de julho de 2005. Também está acima da média dos saldos dos últimos 10 anos, que é de 10 pontos porcentuais negativos.

"Até abril, o câmbio vinha sendo apontado como o vilão, o fator limitante da produção industrial", observa o coordenador da pesquisa, Aloisio Campelo Jr. Na sondagem anterior, muitas empresas chegaram a fazer queixas abertas contra o câmbio, principalmente o setor têxtil e de vestuário, lembra o economista. Ele ressalta que expectativas em relação ao mercado externo vinham se deteriorando gradativamente, mas agora algo mudou.

"Faz seis meses que abolimos a palavra crise", afirma Paulo Santana, diretor comercial e de Marketing da Azaléia, a maior fabricante de calçados manufaturados do País. A empresa, que no fim de 2005 chegou a fechar uma fábrica no Sul, decidiu ampliar as vendas internas para compensar a queda de quase 60% nas exportações em 3 anos.

Em 2003, quando o câmbio começou a ratear, ela exportava 9,5 milhões de pares de sapatos. Para este ano, a previsão é vender 4 milhões de pares no mercado externo, que deve representar 11% dos faturamento, ante 20% no ano passado.

Santana conta que a saída encontrada foi se voltar agressivamente para o mercado doméstico com o lançamento de três novas marcas. A primeira é voltada para o mercado de pré-adolescentes e já responde por 5% das vendas. A segunda marca é de um tipo de calçado que mistura sapato com tênis, o sapatênis, que representa 10% do faturamento.

A última tacada foi dada no início deste mês. Pela primeira vez em 50 anos, a empresa optou por uma linha de calçados femininos para as classes de maior poder aquisitivo. "Nosso foco sempre foi sapato de volume", diz Santana. "A briga vai ser feroz para dividir a mesma fatia do bolo do mercado interno", prevê.

Essa disputa já foi sentida pela Santana Têxtil, fabricante de índigo. "O dólar em baixa nos atrapalhou porque os grandes exportadores deixaram de exportar e ampliaram a oferta no mercado interno", diz Daniel Moura, diretor comercial da empresa.

Para driblar a concorrência e se tornar mais competitiva nas exportações, a companhia, que exporta de 8% a 9% da produção para países da América do Sul, decidiu investir US$ 15 milhões numa fábrica na Província do Chaco, na Argentina.

Segundo Moura, a decisão de erguer a quinta fábrica do grupo num país vizinho foi motivada por uma conjugação de fatores. Entre eles estão escapar das cotas na importação de tecidos impostas pelo Mercosul e aproveitar o potencial de consumo do mercado argentino, que é crescente. O fato de o peso argentino ter uma relação mais favorável do que o real em relação ao dólar e de o custo naquele país ser menor deve favorecer as exportações da Argentina para a América do Sul.