Título: 'Valorização do real é inevitável'
Autor: Marcelo Rehder
Fonte: O Estado de São Paulo, 02/08/2006, Economia, p. B4

O ministro da Fazenda, Guido Mantega, disse ontem que os empresários brasileiros terão de se acostumar com um real mais valorizado. Segundo ele, a valorização cambial é inevitável, dado o sucesso do País na área de comércio exterior e na solidez de seus fundamentos macroeconômicos, como controle da inflação, superávit primário (resultado de receitas menos despesas do governo, sem considerar despesas financeiras) e crescimento do Produto Interno Bruto (PIB).

"Estamos fadados a ter uma moeda valorizada, mas o que estamos fazendo é um esforço para impedir que essa valorização continue aumentando", afirmou o ministro durante o 3º Fórum de Economia da Fundação Getúlio Vargas (FGV), que terminou ontem em São Paulo. "O Brasil tem o câmbio flutuante, que consideramos o melhor regime cambial, mas há alguma interferência do governo nesse câmbio."

Para ele, essa interferência se concentra nas compras de dólares realizadas pelo Banco Central e nos leilões de títulos cambiais promovidos pelo Tesouro. Desde o início do governo Lula, em 2003, essas operações já somam US$ 150 bilhões.

"Se o governo não estivesse atuando, a cotação do dólar já estaria abaixo de R$ 2,00, e aí sim a situação seria problemática", afirmou. Mantega lembrou que outros países emergentes "bem-sucedidos", como Rússia, Coréia e Argentina, também tiveram iniciativas semelhantes para conter uma valorização excessiva de suas moedas.

Na avaliação do ministro, a taxa de câmbio não está tão valorizada como reclamam os empresários. "Pegamos uma cesta de moedas de 15 países e fizemos uma comparação do câmbio real de hoje com o dos últimos 20 anos e constatamos que estamos no mesmo nível de 1999, quando houve a desvalorização do real", argumentou. Mas admitiu que a situação atual não é a ideal. "Eu gostaria de um câmbio melhor, assim como gostaria de um juro menor, mas as coisas não são como a gente gostaria que fossem, e sim conforme as nossas possibilidades."

Mantega ressaltou que o governo não cogita adotar medidas adicionais para a área de câmbio e voltou a descartar o controle de capitais. Segundo ele, o pacote de medidas voltadas para o exportador, anunciado na semana passada, serve para atenuar a valorização do taxa de câmbio. O ministro disse que só ouviu elogios dos exportadores ao pacote cambial. Segundo ele, a única reclamação foi a de que a permissão para manter 30% dos recursos no exterior poderia ter sido bem mais generosa.

Mantega ponderou que dificilmente o Brasil voltará a ter o dólar cotado a R$ 2,90 ou R$ 3,00, como tinha no passado, quando era um país muito mais frágil, com uma dívida muito maior e um saldo comercial menor, conforme as palavras do ministro.

"Os empresários têm que se acostumar com níveis menores. Quanto mais o Brasil melhora, mais a tendência é de valorização da taxa cambial, dado que o País passa a atrair mais investidores internacionais."

Para Mantega, a elevação do Brasil a grau de investimento pelas agências de classificação de risco internacionais pode se realizar já no ano que vem, e não em 2008 como era previsto pelo governo.

AMEAÇA Sobre os dados da Sondagem Industrial divulgada segunda-feira pela FGV mostrando que 34% das empresas pesquisadas pretendem aumentar preços, o ministro disse não ver ameaças à inflação.

Ele fez questão de ressaltar, no entanto, que o governo se manterá vigilante para coibir abusos. "Não hesitaremos em reduzir alíquotas de importação se houver elevação de preços acima do razoável, como já fizemos no caso do aço. "