Título: Diretor da Petrobrás diz que Santos será uma nova Bacia de Campos
Autor: Irany Tereza
Fonte: O Estado de São Paulo, 23/07/2006, Economia, p. B4

Guilherme Estrella, diretor da área de exploração e produção de petróleo da Petrobrás, bem que tenta, mas não consegue falar das recentes descobertas de óleo leve na Bacia de Santos sem estampar um largo sorriso. ¿Tenho certeza de que Santos será uma nova Bacia de Campos. Com caixa alta. As perspectivas são muito boas mesmo¿, comemora. Para se ter uma idéia do tamanho da descoberta, hoje a Bacia de Campos é responsável por mais de 80% da produção de petróleo do Brasil.

Pelos cálculos de Estella, nos próximos cinco anos, a estatal vai investir cerca US$ 4,5 bilhões na exploração e produção em Santos. Foram duas descobertas de óleo, uma atrás da outra, do mês passado para cá, nos dois únicos poços furados. O primeiro está a 7,6 mil metros da superfície e o trabalho de perfuração durou 468 dias, a um custo de mais de US$ 100 milhões. Ambos os blocos revelaram a existência de petróleo leve - bem mais valorizado que o de Campos - em rochas abaixo da camada de sal do subsolo marinho. Estrella tenta, também, não comentar o volume das reservas, que ainda não tiveram confirmada a viabilidade econômica. Mas não há como disfarçar a empolgação.

Há campos gigantes em Santos?

Os dados que temos apontam para isso.

Como é o plano para a Bacia de Santos?

É muito ambicioso. Vamos efetivamente colocar em produção a área de Mexilhão, com gás, iniciando com 6 milhões de metros cúbicos, em 2009. Já pertence ao PlanGás, plano de antecipação da produção de gás aprovado pelo CNPE, o aumento de produção de Merluza, de 1 milhão para 2,5 milhões de metros cúbicos por dia até 2008, com a interligação do campo de Lagosta. Há também a entrada em produção de acumulações que já descobrimos na área de Mexilhão, de gás e óleo leve. E também no BS-500, em dois campos de óleo leve e gás.

E quanto às duas descobertas recentes de óleo leve?

Há cerca de dois anos a área de exploração mapeou oportunidades em águas ultraprofundas, consideradas fronteiras exploratórias. Temos, em associação com a BG e duas companhias portuguesas, a Petrogal e a Partex, dois blocos na Bacia de Santos. Em ambos, o BMS-10 e BMS-11, fizemos duas grandes descobertas. São poços em lâmina d¿água de 2 mil a 2,1 mil metros e entre 5 mil e 6 mil metros de rocha. Não é a mesma jazida e são ambientes geológicos diferentes. Mas são os dois primeiros poços nessa área, que nunca tinha sido perfurada. Os bons resultados abrem excelente perspectiva.

É um indicativo de que há mesmo uma jazida comercial?

Poderia dizer que sim. Mas são expectativas ainda não confirmadas inteiramente. São muito preliminares. De qualquer forma, a coisa seria completamente diferente se esses poços tivessem tido resultados negativos. Aí, a área seria praticamente abandonada, porque são poços altamente custosos, de pelo menos US$ 60 milhões cada um. É três vezes mais que o custo da Bacia de Campos. Exigem projetos de engenharia muito sofisticados.

Quando a Petrobrás terá certeza de que ali há uma jazida suficientemente grande para garantir o investimento?

Calculamos que em três anos poderemos dar essa resposta, de que são jazidas que contêm volume de óleo e gás suficientes para que haja produção comercial. Mas tudo depende de desenvolvimento tecnológico. Eu não diria que essa tecnologia não existe, mas é de ponta, tanto nos projetos de poço quanto de completação para efeito de produção. Está todo mundo aceso, trabalhando com arrojo para em cinco anos, eventualmente, colocar esses campos em produção.

Nesses três anos de exploração, quanto será investido?

Uns US$ 500 milhões em ambos os blocos, só em exploração. Mas o que estamos vislumbrando é uma abordagem diferente. Na medida em que novas fronteiras como essas são descobertas, não podemos usar as mesmas premissas, sejam de engenharia de poço ou de tecnologia de produção, que vínhamos utilizando até então. É uma experiência enriquecedora, ainda mais em situações como essa que, ao que tudo indica, se transformarão em descobertas comerciais.

Quanto a Petrobrás pretende investir na Bacia de Santos?

A Bacia de Santos está despontando como nova província importantíssima. Somente em exploração vamos investir US$ 1,2 bilhão por ano em todo o Brasil. Calculo que na Bacia de Santos vamos colocar entre US$ 1 bilhão e US$ 1,5 bilhão até 2011, só em exploração. Em produção, são outros quinhentos. Vamos botar Mexilhão em produção, interligar (os campos de) Lagosta a Merluza. Vai ser, mais ou menos, o dobro disso.

Quantos campos estão sendo explorados em Santos em águas ultraprofundas?

Em seis blocos, a Petrobrás é operadora. Furamos os primeiros dois poços e descobrimos esse óleo leve. O pessoal da geologia está, eu diria, até excitado. Foram dois sucessos em condições geológicas distintas.

Vocês têm um problema extra: com o mercado aquecido, como conseguir equipamentos para todos esses blocos?

Acabamos de contratar, com empresas brasileiras, cinco sondas. A fabricação provavelmente não será aqui porque nossos estaleiros estão absolutamente lotados de obras. Mas são empresas brasileiras: duas sondas com Queiroz Galvão, duas com a Norberto Odebrecht e uma com a Petroserv. Os contratos estão sendo assinados. Essas sondas chegarão entre 2009 e 2010. Já é um reforço para enfrentar um item crítico, que é sonda.

A situação hoje já é de crise na contratação desses equipamentos?

Não exatamente crise. Mas os preços estão muito altos. Teve aumento de 100%. Nossos equipamentos são fretados. Aliás, da frota de 25, 26 sondas que temos hoje, entre 6 e 8 são nossas. A intenção é também construir plataformas dessas para grandes profundidades. A faixa de maior atratividade para as grandes companhias está sendo a ultraprofunda, entre 2 mil e 3 mil metros de lâmina d¿água. Esse é o limite. A partir de 3 mil metros se passa a um tipo de rocha que já não tem mais petróleo. As empresas estão contratando muitas sondas e o preço está muito alto. Mas pretendemos construir uma sonda nossa para exploração a 3 mil metros. Essas cinco que estamos contratando vão até 2 mil metros e podem ser adaptadas para 3 mil metros já serão um reforço muito grande no futuro.

É coincidência isso ocorrer quando o preço do petróleo dispara para mais de US$ 70 o barril?

O petróleo com preços elevados sustenta novos investimentos. Mas a Petrobrás tem a sua governança corporativa com padrões para aprovação de projetos. E, certamente, esses parâmetros não estão em US$ 70 o barril. É muito abaixo disso. A alta do petróleo influencia, mas apenas indiretamente. E as áreas de fronteira são as últimas que temos a explorar. Não adianta também achar que há outras áreas onde se tem a possibilidade de descobrir grandes campos.

Não tem? E a história de que há uma outra bacia sob a Bacia de Campos?

Temos na coluna geológica brasileira uma espessa camada de sal. Na maioria dos casos, a rocha geradora do petróleo está muito abaixo do sal, que é uma rocha impermeável. Só que o sal se move, por conta da grande pressão das rochas acima dele. Como uma pasta de dentes que você aperta e sai pelo lado. Essa camada flui tanto, que em determinado lugar o óleo vem para reservatórios mais novos, como é a Bacia de Campos. Por isso, temos os gigantescos Campos de Marlim, Albacora, Roncador... Essa é uma explicação simples, mas verdadeira. Então, dizer que existe em Campos a possibilidade muito grande de achar grandes campos em rochas pré-salinas é um pouco de exagero. Embora reconheça que há muito geólogo por aí com a língua queimada (risos). Geologia é isso mesmo. A gente joga com probabilidades, com intuições.

Por serem as Bacias de Campos e de Santos limítrofes, podemos depreender que em Santos pode haver grandes reservatórios, como em Campos?

Também. A Bacia de Campos tem sido testada nessas áreas bastante profundas e não tem respondido até agora. Já furamos uma meia dúzia de poços. A opinião que tenho sobre Santos não foi formada depois dos dois poços.

Dá a impressão de que, se o senhor pudesse, diria: ¿Acho que temos campos gigantes em Santos, sim¿.

O que acontece é o seguinte: os dados que temos apontam para isso. Os dados indiretos que temos hoje. O dado direto, só na ponta da broca. Embora os dados das sísmicas sejam espetaculares, uma coisa linda, temos de botar a broca, pois a indústria petrolífera quebra a cara todos os dias achando que uma coisa é maravilhosa e, quando fura, não dá nada.

Quanto já foi investido nessa nova tecnologia e como, em linhas gerais, ela é?

Se cria modelos novos que são testados. O poço 617-D, da descoberta do BMS-10, está furando há 468 dias. Ou seja, um ano e três meses. Foi o primeiro poço descobridor. Ele está a 7,6 mil metros: cerca de 5 mil metros de rocha e 2 mil de água. Como ele é inclinado, chega ao total de 7,6 mil. Esse poço está nos custando mais de US$ 100 milhões. O outro está a uma profundidade de 5,130 mil metros, com lâmina d¿água de 2,1 mil, ou seja, pouco mais de 3 mil metros de rocha. Esse está sendo perfurado há 112 dias. É um processo de aprendizado. No segundo poço, estamos sendo muito mais eficientes porque a tecnologia foi toda testada no primeiro.

Vamos torcer para que Santos seja uma nova Bacia de Campos, ou melhor ainda.

Tenho certeza de que será. Todos os geólogos e engenheiros que estão trabalhando lá têm certeza de que será uma nova Bacia de Campos, com caixa alta. As perspectivas são muito boas mesmo. Quando o plano diretor (para exploração na bacia) foi apresentado ao Conselho de Administração, em março ou abril, não lembro direito, os membros do conselho bateram palmas. Isso nunca aconteceu antes.