Título: Servidor da Saúde monta esquema paralelo à Planam
Autor: Marcelo Auler
Fonte: O Estado de São Paulo, 17/08/2006, Nacional, p. A15

Nas investigações sobre a máfia dos sanguessugas, a Polícia Federal e a CPI se depararam com um personagem especial no Rio: Nylton José Simões Filho. O funcionário do Ministério da Saúde, que começou como aliado dos Vedoin nos negócios com as emendas da bancada fluminense para a compra de ambulâncias e ônibus de projetos de inclusão digital, fez tanto sucesso que criou duas ONGs de fachada e montou negócio próprio para concorrer com a Planam - sem jamais deixar o emprego no ministério. Darci e Luiz Antonio Vedoin são os donos da Planam, empresa que dominava o esquema fraudulento.

O sucesso do trabalho de Simões como intermediário dos negócios com emendas, ambulâncias e ônibus pode ser medido pelo fato de o Rio ter o maior número de políticos envolvidos com o esquema dos sanguessugas - 13 deputados federais, que continuam nos cargos e foram citados no relatório parcial da CPI. Outros dois foram inocentados, mas são investigados pelo Ministério Público.

Os escândalos atingiram ainda outros 10 ex-deputados: seis da atual legislatura e quatro que estiveram na Câmara entre 1998 e 2002. Entre estes, dois foram cassados, André Luiz (PMDB), por tentar extorquir o empresário de jogos Carlinhos Cachoeira, e Roberto Jefferson (PTB), por causa do mensalão. Um terceiro, o bispo Carlos Rodrigues (sem partido), renunciou. Cornélio Ribeiro (PMDB) trocou a Câmara pela Assembléia em 2002. Para o presidente da CPI dos Sanguessugas, Antônio Carlos Biscaia (PT-RJ), boa parte do envolvimento ostensivo da bancada do Rio nesses escândalos "é resultado do trabalho de Simões."

A maior demonstração do sucesso dele, porém, está no fato de ter crescido a tal ponto que abandonou a parceria com os Vedoin para abrir um esquema próprio de cooptação de parlamentares e captação de emendas. Segundo o empresário Ronildo Pereira Medeiros, um dos operadores da quadrilha, ele se transformou em concorrente, "captando recursos de emendas parlamentares para ele mesmo executar". Para facilitar o "trabalho", segundo afirmaram Ronildo e Luiz Antonio Vedoin, Simões abriu as organizações não-governamentais Instituto Brasileiro de Cultura e Educação (Ibrae) e Instituto Pró-Rio.

Em 2005, o Ibrae, que oficialmente está sediado em Rio Bonito, mas funciona em uma pequena sala no centro do Rio, teria recebido R$ 5,8 milhões por meio de emendas. Para o exercício de 2006 estavam previstos R$ 15 milhões. Já o Instituto Pró-Rio trabalhava com cifras mais modestas. Obteve neste ano R$ 450 mil, por meio do deputado Paulo Baltazar (PSB-RJ), para desenvolver o projeto Esporte Vocês.

Como funcionário do Ministério da Saúde, Simões, aparentemente, recebe sem trabalhar. De acordo com o cadastro do ministério, ele estaria cedido à Fundação Municipal de Saúde de Niterói, trabalhando no Hospital Municipal Orêncio Freitas. No hospital, nem a responsável pela enfermagem, Therezinha Ana Meneguini, nem o departamento de pessoal têm informações a seu respeito. Nunca viram Simões trabalhando.

Na Fundação Municipal de Saúde de Niterói, município governado pelo petista Godofredo Pinto, ele não aparece como servidor emprestado pelo Ministério da Saúde. Mas a representação do ministério no Rio informa que seu salário continua sendo pago regularmente, pois a folha de ponto tem sido atestada todos os meses pela fundação.

O enfermeiro Nylton Simões, de 45 anos, trabalha para órgãos estatais desde 1982, três anos antes de ingressar no Ministério da Saúde como estatutário. Entre dezembro de 2003 e outubro de 2004, serviu na Secretaria de Estado de Governo, órgão responsável pela articulação política da governadora Rosinha Garotinho (PMDB). Nesse período, era representante da Planam.

Simões Filho mora no bairro Jardim Imperial, em Itaboraí, onde é tratado pelos moradores como "doutor Nylton". É proprietário de uma casa de padrão superior ao das demais residências da área: em um terreno ajardinado, dois pavimentos, ampla varanda e piscina. O imóvel foge também ao padrão do que se poderia esperar de um casal de servidores públicos. Os vizinhos dizem que há algum tempo ele não é visto na região.

"Não tenho nada com isto, estou sofrendo muito. Por favor, não me envolva nesta história", pediu, chorando, Rosely, sua mulher, também enfermeira e funcionária do Ministério da Saúde.