Título: Lula vai enfatizar crescimento em programa de governo, mas sem metas
Autor: Vera Rosa, Sérgio Gobetti
Fonte: O Estado de São Paulo, 29/08/2006, Nacional, p. A4

O programa de governo do presidente Luiz Inácio Lula da Silva para o segundo mandato vai trocar o discurso inflamado da mudança na economia, contrário à armadilha fiscal, por compromissos mais políticos, que debitam na conta da "herança" recebida dos tucanos as restrições impostas até agora aos investimentos. A plataforma que será lançada hoje, em cerimônia com a presença de Lula, destaca a necessidade de crescimento mais acelerado, mas abandona a meta de 7% ao ano, prevista em 2002. Além disso, mantém inalterado o superávit primário - economia de gastos para pagamento dos juros da dívida.

Tratado quatro anos atrás como transitório, para afastar os temores de calote na dívida pública, o superávit não só foi elevado - de 3,75% do Produto Interno Bruto (PIB) para 4,25% - como virou quase uma cláusula pétrea na cartilha do governo. No diagnóstico dos petistas, o desafio de reduzir a dívida ainda está presente, embora o governo tenha obtido êxito na diminuição da vulnerabilidade externa.

"Em 2002, esse negócio de vulnerabilidade externa era um fetiche para o PT", constata o ministro do Planejamento, Paulo Bernardo. "Hoje, vamos atravessar o período eleitoral com indicadores excelentes e não adianta os adversários ficarem falando no tamanho do salto dos outros. Cadê a tensão pré-Copom?", pergunta ele, numa referência ao nervosismo que caracterizava as reuniões para a definição da taxa de juros.

Nas ações classificadas como "prioritárias", o novo programa de Lula ressuscita a retórica da inclusão social como "eixo do desenvolvimento". O texto afirma que o esforço para estabilizar a economia deve cumprir os objetivos de "crescimento com distribuição de renda".

Depois do escândalo do mensalão, a defesa da reforma política - que já constava no programa de 2002 - volta à cena em nova embalagem, muito mais vistosa. Ela agora integra o time das medidas prioritárias para a governabilidade. O conteúdo, porém, é o mesmo: a pregação da fidelidade partidária, do financiamento público de campanha e do voto em lista para cargos no Legislativo.

Escaldado pelos efeitos perversos de promessas não cumpridas - como a de criar 10 milhões de empregos - e após assegurar que o governo do PT resgataria a vocação do Brasil para crescer 7% ao ano, Lula evitará metas quantitativas. Para este ano, o Planalto prevê que a expansão da economia atinja 4% - bem distante dos 7% almejados em 2002 -, mas o mercado trabalha com cenário ainda menos otimista.

ESCOLHA "O presidente já manifestou preferir crescimento moderado e permanente com distribuição de renda a um patamar maior que cause descontrole. Não dá para estabelecer a China como parâmetro", argumenta o ministro das Relações Institucionais, Tarso Genro.

Uma exceção sobre a ausência de metas numéricas poderá estar na educação - tema carimbado como "compromisso" para eventual segundo mandato de Lula. Texto preliminar a que o Estado teve acesso diz ser necessário "aumentar progressivamente" os investimentos destinados à educação "até o patamar de 6% do PIB". Hoje, o investimento global no País em educação - contando recursos federais, estaduais e municipais - alcança 4,5% do PIB , algo em torno de R$ 95 bilhões.