Título: Brasil renegocia com a Nasa participação na ISS
Autor: Herton Escobar
Fonte: O Estado de São Paulo, 29/07/2006, Vida&, p. A27

Representantes da Nasa e da Agência Espacial Brasileira (AEB) fizeram ontem a primeira reunião - via teleconferência - para renegociar o acordo de participação do Brasil no projeto da Estação Espacial Internacional (ISS). A parceria está sem rumo definido há pelo menos quatro anos, desde que ficou claro que o País não conseguiria cumprir com os compromissos firmados no acordo original, de 1997, que previa a fabricação de seis peças para a base orbital, no valor de US$ 120 milhões.

Desde então, a lista de equipamentos a serem contratados foi reduzida e renegociada diversas vezes, sem chegar ainda a um resultado compatível com as condições orçamentárias do País. A reunião de ontem foi a primeira desde o vôo do astronauta Marcos Pontes, em abril, e da retomada definitiva dos vôos com os ônibus espaciais da Nasa - os únicos capazes de transportar as partes que faltam para conclusão da ISS, interrompida há mais de dois anos pela tragédia com o Columbia.

¿Isso muda totalmente o quadro dos termos de construção da estação¿, disse ao Estado o gerente do Programa ISS-Brasil da AEB, Raimundo Mussi, antes da reunião. ¿A decisão governamental é que continuemos a participar (da construção da ISS).¿ O Brasil é um dos sócios minoritários da estação, que conta com a participação de 16 países.

Segundo Mussi, o objetivo é chegar a um acordo que seja adequado para ambos os lados. ¿Não há mais tempo a perder¿, disse. O orçamento da agência espacial para este ano, segundo ele, tem R$ 5 milhões reservados para a ISS. As negociações deverão continuar via telefone até que um novo protocolo possa ser assinado. As exigências da Nasa são rígidas, e a construção das peças - por empresas brasileiras - deverá levar vários anos. ¿Fazer as peças não é só querer¿, disse Mussi. ¿Temos de fazer a qualificação das empresas e garantir a qualificação de cada funcionário que vai operar cada máquina, apertar cada botão.¿

No ano passado foi anunciada parceria com o Serviço Nacional de Aprendizagem Industrial (Senai-SP), que ficaria responsável pelo desenvolvimento das peças brasileiras. Segundo Mussi, porém, essas peças nunca foram definidas. ¿Há apenas um contrato genérico de que eles construiriam protótipos de peças que viessem a ser contratadas¿, afirmou. ¿O Senai disse que pode fazer; falta a gente dizer o que é para ser feito.¿

ASTRONAUTA A reunião de ontem não teve a participação de Pontes. Declarações recentes do astronauta voltaram a causar estranheza dentro da AEB, dois meses após seu retorno do espaço e de sua polêmica decisão de entrar para a reserva da Aeronáutica.

Em um longo artigo publicado em sua webpage há duas semanas, Pontes conta como o Brasil esteve ameaçado de ser ¿dispensado¿ do projeto da ISS e se coloca como interlocutor brasileiro nas negociações. ¿Nesses últimos meses tenho trabalhado intensamente junto à Nasa, aqui em Houston, para resolver o problema da permanência do Brasil no programa. Os resultados positivos já são reais e estamos prestes a resolver de vez o problema¿, escreveu o astronauta.

Segundo ele, o risco do País ser expulso do programa ainda existe, mas a Nasa mostrou-se disposta a modificar os componentes da participação brasileira. ¿Esta semana (retrasada) estarei discutindo essa possibilidade com a agência americana¿, disse. ¿Ela deverá, então, enviar brevemente uma proposta de alteração técnica para a AEB.¿

Segundo a Agência Espacial Brasileira, a primeira comunicação oficial com a Nasa foi a teleconferência de ontem. O astronauta não possui mais nenhum vínculo com a AEB. ¿Sou a única pessoa que pode falar oficialmente com a Nasa¿, disse Mussi ao Estado. ¿O Pontes tem amplo conhecimento dos trâmites da Nasa e continua fazendo gestões por conta própria. A Nasa sabe que não pode assumir nenhum compromisso com ele e não vemos necessidade de impedi-lo de falar¿, completou Mussi. ¿Se ele tem quem escute, não temos como evitar isso.¿

Procurado pelo Estado, Pontes disse que participa apenas como um ¿elemento de ligação¿. ¿Eu participo como tenho feito ao longo de oito anos no projeto defendendo a participação brasileira no programa e sendo o único representante brasileiro aqui em Houston¿, disse. ¿Não tenho nenhum poder de decisão. Porém minha função torna-se essencial no momento em que é necessário o trabalho de convencimento e diplomacia técnica para manter o contato saudável com a Nasa.¿