Título: Nem na agricultura há consenso
Autor: Denise Chrispim Marin e Tânia Monteiro
Fonte: O Estado de São Paulo, 14/09/2006, Economia, p. B6

Apesar da aliança estratégica formal, Índia e Brasil não se mostram afinados nem mesmo quando o assunto é a posição sobre acesso a mercado agrícola do G-20. Trata-se do bloco de 23 economias em desenvolvimento da Rodada Doha da Organização Mundial do Comércio (OMC), sob a liderança dos dois países. O G-20 atua em favor da liberalização do setor, do fim dos subsídios à exportação e da redução e disciplina de subvenções à produção agrícola.

O Brasil quer diminuir ao máximo a possibilidade de exceções à abertura agrícola mundial. Já a Índia pretende incluir todos os itens de sua agricultura de subsistência nessas margens de proteção.

As diferenças entre Índia e Brasil levaram os ministros dos dois países a aprovar, na reunião do G-20 do último sábado, no Rio, a proposta de mergulhar na discussão sobre o tratamento para produtos especiais e as salvaguardas para chegar posições comuns nos próximos meses. Quanto menos brechas houver nas exigências do G-20 sobre o capítulo agrícola da Rodada Doha da OMC, menor a possibilidade de uma diáspora no grupo e mais consistentes serão suas demandas no momento em que as negociações multilaterais forem retomadas.

Essa lógica já impôs ao Brasil uma flexibilização de sua posição anterior e a tolerância a alguma margem para proteção à agricultura de subsistência, que foram registradas indiretamente no comunicado final da reunião do G-20. Em princípio, o Brasil teme que, por menor que seja, essa margem seja suficiente para que outras economias em desenvolvimento, como a Índia, mantenham toda a sua pauta de importação agrícola sob proteção.

Na prática, os setores produtivos da Índia e do Brasil indicam mais competição direta que possibilidade de complementaridade - algo que tenderá a restringir-se a poucas áreas, como a bancária, de serviços e de energia. Esse cenário já causou fracassos nas tentativas anteriores de derrubada das barreiras ao comércio bilateral. Entre eles, impediu a negociação de um acordo de livre comércio entre o Mercosul e a Índia, que acabou limitada a um acerto para a redução de tarifas de importação para 450 itens de lado a lado, firmado em 2005. Setores importantes, como o automotivo, não foram incluídos no acordo.

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