Título: Oferta restrita de energia abre espaço para usinas movidas a óleo e a carvão
Autor: Renée Pereira
Fonte: O Estado de São Paulo, 24/09/2006, Economia, p. B4

Na falta de gás suficiente para abastecer as térmicas e licenças ambientais para construir hidrelétricas, a alternativa foi abrir espaço para usinas movidas a diesel, óleo combustível e carvão. Uma política que incentivou a volta das polêmicas usinas emergenciais, contratadas durante o racionamento de energia, em 2001, que deram origem ao seguro-apagão, pago por toda a sociedade brasileira.

Essas usinas, cujos contratos foram contestados judicialmente, fizeram parte do programa emergencial que propunha criar uma proteção para o País até 2005, enquanto a oferta de energia não era ampliada. Cinco anos se passaram, o programa acabou, a oferta não foi expandida de forma substancial e as polêmicas térmicas reconquistaram espaço no novo modelo elétrico.

Com dificuldades para ampliar a produção, o governo viu novamente nas usinas a diesel e óleo combustível uma forma de garantir a eletricidade. Nos dois leilões de energia nova que o Estado realizou, foram contratadas 46 térmicas, sendo 25 movidas a óleo combustível e diesel (817 MW/médios) e duas a carvão (546 MW/médios). Uma parte dessas usinas era do programa emergencial.

Segundo o diretor-executivo da Associação Brasileira de Geração Flexível (Abragef), Marco Antônio Veloso, das unidades contratadas durante o racionamento, 501 MW foram habilitados pelos leilões e 322 MW estão operando no sistema isolado, em Manaus e no Amapá. Outros 278 MW deixaram o País rumo ao Oriente Médio e outras foram vendidas, provavelmente para empreendedores que também participaram dos leilões de energia promovidos pelo governo.

Construir esse tipo de usina, movida por fontes poluentes, tornou-se um bom negócio no País. Além das unidades já contratadas, a Empresa de Pesquisa Energética (EPE) habilitou 43 usinas a diesel e óleo combustível para o próximo leilão, que ocorre dia 10 de outubro. Isso representa 4.070 MW ou 20% da capacidade instalada total que participará do evento. Duas térmicas a carvão devem entrar no leilão com 1.192 MW de potência. A contratação dos empreendimentos, porém, dependerá do preço.

Na avaliação do secretário de Meio Ambiente do Estado de São Paulo, José Goldemberg , o Brasil está na contramão da história, já que o resto do mundo vem procurando alternativas para diminuir a participação de fontes poluentes na matriz energética. Ele lembra ainda que o carvão no Brasil é de péssima qualidade.

Além do efeito estufa, o combustível provoca um fenômeno bastante conhecido nas grandes cidades, o smog - camada de névoa escura altamente tóxica formada por finas partículas de poluição que provoca problemas respiratórios. ¿O óleo combustível também é muito poluente, pois é o resíduo mais pesado do petróleo.¿

Para Goldemberg, os órgãos ambientais precisam encontrar saídas para o complicado processo ambiental das usinas hidrelétricas - a maior vocação do País, que não polui. Na opinião dele, a solução passa pelas compensações ambientais bem feitas. ¿Freqüentemente, as empresas querem economizar nessas medidas, o que contribui mais para atrasar a expansão do setor.¿

Das seis usinas hidrelétricas que serão licitadas no próximo leilão de energia, duas ainda não conseguiram licença ambiental prévia. Esse tem sido o maior problema do setor elétrico nos últimos anos, já que os potenciais hídricos mais fáceis já foram explorados. Sobraram empreendimentos localizados em áreas mais sensíveis a impactos ambientais. ¿Mas é preciso avaliar o interesse de alguns e o de milhares de pessoas¿, diz Goldemberg. Na avaliação dele, o País tem preservado de um lado e poluído de outro. ¿É preciso haver equilíbrio.¿

Na opinião do diretor-presidente da Associação Nacional dos Consumidores de Energia (Anace), Paulo Mayon, está havendo uma mudança na matriz energética brasileira que está levando a uma energia mais cara e poluente.

¿O impacto da emissão das usinas a diesel, óleo combustível e carvão é grande. Junta-se a isso o fato de elas serem instaladas próximas dos centros urbanos. Ou seja, estamos caminhando para uma armadilha¿, define.