Título: Economia de Cuba deve muito à Venezuela
Autor: Juan Forero
Fonte: O Estado de São Paulo, 05/08/2006, Internacional, p. A27

No momento em que Raúl Castro assume a tarefa de comandar Cuba no lugar do seu irmão Fidel, pela primeira vez em 47 anos, surpreendentemente há uma coisa a menos para ele se preocupar - a situação da economia de Cuba.

O merecimento se deve, em grande parte, ao salva-vidas econômico lançado a Cuba pelo presidente da Venezuela, Hugo Chávez, que está usando as grandes reservas de petróleo do país para respaldar o governo de Fidel e contra-atacar a política do governo Bush na América Latina.

Para exasperação das autoridades americanas - há muito determinadas a forçar uma mudança de governo sufocando a economia cubana com um embargo -, o patrocínio da Venezuela pode aliviar parte da pressão sobre Raúl Castro.

Fidel Castro, de 79 anos, está se recuperando de uma cirurgia abdominal ainda inexplicada. Raúl Castro, de 75 anos, que na segunda-feira foi nomeado líder temporário pelo irmão, ainda não fez uma aparição em público. Neste ínterim, o governo comunista tem deixado claro que continuará a governar o país, o que tem conseguido há quase 50 anos com a ajuda de seus amigos ideológicos.

¿O atual regime de Havana está trabalhando com governos que têm a mesma mentalidade, particularmente o da Venezuela, para construir uma rede de apoio político e financeiro destinada a impedir pressões externas para uma mudança¿, diz um relatório apresentado no mês passado ao presidente Bush pela Comissão de Ajuda para uma Cuba Livre, presidida pela secretária americana de Estado, Condoleezza Rice.

Wayne Smith, um ex-diplomata americano em Havana, disse que, nos últimos anos, o governo Bush mudou sua política de trabalhar abertamente para minar o governo de Fidel para tentar garantir que ele não seja substituído por Raúl nem por outra figura comunista.

¿Interpondo-se nesse caminho estão Chávez e a Venezuela, dando assistência a Cuba - e não apenas assistência, mas formando uma aliança com Cuba¿, disse Smith, um membro sênior do Centro de Política Internacional, com sede em Washington. ¿Isso simplesmente deixa o pessoal de Bush louco.¿

No seu primeiro comentário público sobre a doença de Fidel, Bush emitiu uma declaração quinta-feira dizendo: ¿Peço ao povo cubano que trabalhe por uma mudança democrática na ilha.¿

¿Nós os apoiaremos em seu esforço para construir um governo de transição em Cuba comprometido com a democracia e estaremos atentos àqueles que se interpuserem ao nosso desejo de uma Cuba livre¿, acrescentou Bush.

Um dos últimos países comunistas do mundo, Cuba tem uma economia que está longe de ser saudável. Mas o país está muito longe daquele que foi deixado desamparado quando seu benfeitor de longa data, a União Soviética, entrou em colapso, a partir de 1989.

Em comparação com o sombrio início da década de 90, quando as importações - a grande maioria delas vindas da Europa Oriental - despencaram quase 75% em três anos, a economia de Cuba tem demonstrado importantes indícios de renovação nos últimos anos.

No mercado da Rua 19 de Havana - onde os produtores vendem diretamente aos consumidores -, as bancas estão transbordando de abacates e mangas enormes. As vagens têm quase 30 centímetros de comprimento. Pães saem quentinhos do forno. Há fornecedores oferecendo lagostas e camarão recém-pescados. E o local está fervilhando de clientes.

Para os vendedores, o dinheiro obtido é tão bom que alguns abandonaram postos de trabalho no governo para vender frutas e legumes. ¿Eu ganhava US$ 5 por mês¿, disse José Antonio Milanés Vasco, que era funcionário de um armazém de alimentos estatal. ¿Agora ganho US$ 3 por dia. Minha vida foi totalmente transformada.¿

Philip Peters, um especialista em economia cubana do Instituto Lexington, com sede na Virgínia, disse que tais testes com reformas de abertura de mercado têm ajudado a levantar a economia da ilha.

Mercados públicos como o da Rua 19, observou Peters, foram apoiados por Raúl no início da década de 90, quando, pela primeira vez, o governo permitiu que os produtores vendessem a safra excedente depois que o Estado não conseguiu pagar os subsídios agrícolas.

Hoje em dia, disse Peters, há 300 desses mercados em todo o país. E, enquanto o Estado continua a fornecer uma cota mensal às famílias de arroz, feijão, óleo, leite e outros itens básicos, os chamados ¿mercados livres¿ transformaram alguns produtores em capitalistas de risco e revitalizaram o setor agrícola. ¿Obviamente, Cuba está muito longe da crise que a afetou na década de 90¿, disse Peters. ¿Naquela época, a questão era se a economia iria sobreviver. Isso agora não é mais um problema.¿

Em vez disso, a questão para qualquer governo pós-Fidel, particularmente para um governo chefiado por Raúl, é se as aberturas econômicas vão se ampliar. Embora o campo político deva continuar rigorosamente controlado por Raúl, nos últimos anos, ele tem enviado sinais de que Cuba poderá interessar-se pelos tipos de reformas econômicas que foram adotadas por outros governos autoritários, como os da China e do Vietnã.

Embora seja o comandante do Exército, Raúl tem administrado a indústria de turismo da ilha, que também foi um dos primeiros testes de Cuba em permitir bolsões controlados de liberalização econômica. Hoje, esses bolsões geram US$ 2 bilhões anuais de divisas externas.