Título: BNDES poderá ampliar crédito
Autor: Fabio Graner, Lu Aiko Otta
Fonte: O Estado de São Paulo, 05/08/2006, Economia, p. B3

As grandes empresas terão mais acesso a empréstimos do Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES), graças a um dispositivo que entrou "de contrabando" na Medida Provisória 315, que regulamentou o pacote cambial. Numa engenharia financeira elogiada até pelos observadores mais críticos, o banco terá seu patrimônio aumentado sem que, para isso, o Tesouro Nacional tenha de injetar dinheiro na instituição.

Dessa forma, o BNDES ampliará sua capacidade geral de emprestar. Além disso, será contornado o principal problema do banco no momento, que é a impossibilidade de financiar empresas de maior porte como a Petrobrás.

O BNDES tem uma dívida com o Tesouro, de aproximadamente R$ 7 bilhões, que contraiu para comprar ações da Vale do Rio Doce. Esse empréstimo venceria em 2027, mas agora não terá mais prazo de vencimento, porque foi transformada numa dívida "perpétua". Na prática, embora seja uma dívida, esses R$ 7 bilhões - ou parte dele, pois valor exato não foi definido - farão parte do chamado capital de referência do banco, que é utilizado para determinar quanto ele pode emprestar.

O efeito dessa engenharia é semelhante ao de um aporte de capital, ou seja, uma injeção de dinheiro. Mas, nesse caso, o Tesouro Nacional não precisou desembolsar nada. Dessa forma, foi contornado um problema que há anos dividia o governo e rendeu muito bate-boca entre os grupos chamados "desenvolvimentistas" e os ditos "fiscalistas". O ex-presidente do BNDES Carlos Lessa, por exemplo, brigou muito por uma capitalização, mas enfrentou oposição ferrenha do então secretário do Tesouro Nacional, Joaquim Levy. Ele era contra a capitalização porque a operação representaria uma despesa. Por isso reduziria o superávit primário do governo.

A solução encontrada na MP, porém, agradou aos que se alinhavam a Levy na resistência à capitalização do BNDES. Na avaliação desse grupo, foi uma solução "bem bolada" porque atendeu aos dois lados: ampliou a capacidade de emprestar do BNDES sem criar um problema no cofre federal. O inspirador desse desenho, segundo esses técnicos, teria sido o secretário-executivo do Ministério da Fazenda, Bernard Appy.

Embora tenha ficado livre do pagamento da parte principal da dívida, o BNDES terá de pagar juros mais altos. Na operação, o atual indexador da dívida, a TR, será trocada pelo Índice de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA).

Segundo o secretário do Tesouro Nacional, Carlos Kawall, a engenharia financeira permitirá ao BNDES emprestar para empresas de grande porte. "Esse era o problema que se buscou resolver, pois os empréstimos para os grupos econômicos são limitados a 25% do patrimônio de referência", disse. "A medida permite uma exposição maior a esses grupos.".

Ele disse também que a operação não provocará nenhuma alteração no superávit primário ou na dívida líquida do setor público, dois dos principais indicadores de solidez fiscal. "Essa medida é neutra, porque a dívida continua sendo um ativo da União e sua mera mudança não gera impacto fiscal", afirmou Kawall.