Título: Grandes empresas entram na onda bilionária do bem-estar
Autor: Patrícia Cançado e Ana Paula Lacerda
Fonte: O Estado de São Paulo, 09/10/2006, Negócios, p. B10

A Coca-Cola tem uma parceria com a Academia de Medicina Chinesa Tradicional para desenvolver novas bebidas a partir de ervas chinesas. No começo do ano, nos Estados Unidos, o Wal-Mart esgotou todo o seu estoque de roupas de algodão orgânico para ioga em apenas dez dias. No Brasil, o Pão de Açúcar criou uma linha de alimentos saudáveis, roupas para esporte e artigos zen para casa e banho. Uma das redes de franquia que mais crescem atualmente no País é a carioca Mundo Verde, especializada em produtos naturais. São 112 lojas em 11 Estados - 15 delas foram abertas neste ano.

Há algo errado no mundo dos negócios? Não exatamente. Bem-vindo à era do bem-estar, que está provocando uma revolução no consumo mundial. As empresas estão tendo de se reposicionar - em alguns casos, se reinventar - para acompanhar uma mudança importante nos hábitos do consumidor.

O homem moderno ganhou peso e stress e agora paga caro para recuperar qualidade de vida. 'O mundo todo busca a saúde do corpo e da mente, os pilares do bem-estar. Mesmo empresas que não eram originalmente do segmento querem ter sua imagem associada a esse conceito', diz Silvia de Féo, diretora-executiva da Fitness Brasil, empresa que promove eventos de fitness e bem-estar.

O economista americano Paul Zane Pilzer, autor do livro The Wellness Revolution (A Revolução do Bem-Estar), diz que essa pode ser a terceira grande onda de negócios do mundo - a primeira foi a dos automóveis e a segunda, a dos computadores. Nos Estados Unidos, a indústria do bem-estar pode movimentar US$ 1 trilhão até 2010, segundo Pilzer. Em cinco anos, esse mercado saiu de US$ 200 bilhões para os atuais US$ 500 bilhões naquele país.

No Brasil, ainda não existe estimativa que englobe toda essa indústria, mas não há dúvidas de que fazer massagem, praticar ioga e pilates, comer produtos naturais, usar cosméticos de origem vegetal ou acender velas e incenso deixou de ser coisa de comunidade alternativa. Virou um negócio bilionário no País.

Uma pesquisa recente do instituto Euromonitor revelou que os alimentos industrializados voltados à saúde e ao bem-estar movimentaram US$ 7,9 bilhões em 2005 no Brasil. Em 2002, essa cifra era 50% menor. 'Todo mundo está de olho nesse mercado. Mas ele só irá se desenvolver quando houver regras mais claras por parte da Anvisa', diz Marcel Motta, analista do Euromonitor para o Brasil.

Para Andrea Mota, diretora de novas bebidas da Coca-Cola Brasil, área criada no ano passado, há um longo caminho a ser percorrido, mas esse mercado vai crescer muito daqui para a frente. A expectativa do Euromonitor é que ele cresça 50% nos próximos três anos.

ESTILO DE VIDA

Esse mercado tem mudado rápido. Há três anos, Isabela Fortes, recém-chegada de uma temporada de três anos num mosteiro na Índia, era uma estranha no ninho na sociedade carioca. Ela havia abandonado a promissora carreira num banco de investimentos para dar aulas de ioga.

O empresário Marcos Wettraich, fundador do portal Ibest, enxergou na amiga Isabela uma tendência de mercado. Wettraich pode ser considerado um sujeito visionário. Em 1995, quando a internet ainda era um assunto restrito ao mundo acadêmico, ele investiu no Ibest.

Wettraich associou-se à Isabela para criar o Nirvana, um espaço chique onde há aulas de ioga, pilates, spa, restaurante orgânico e loja de roupas e artigos para casa e banho. O primeiro Nirvana foi aberto em 2004, numa casa na Gávea. Hoje são duas unidades e 2 mil alunos matriculados. 'No futuro, vamos virar um clube e cobrar luva do associado', diz Wettraich. No começo do ano, o Nirvana teve de recusar alunos .

Os donos não têm interesse em transformar o Nirvana numa rede de franquias. Por enquanto, o plano é abrir unidades em São Paulo e Brasília, desde que encontrem o sócio apropriado.

A primeira onda de bem-estar começou nas academias de ginástica. Em 1999 o Brasil contava com 4 mil academias e hoje são 7 mil, freqüentadas por mais de 2,1 milhões de pessoas. Em 2005 o faturamento delas foi de R$ 1,6 bilhão.

IOGA COM ESTEIRA

Aos poucos, as academias foram incorporando tai chi chuan, ofurô e hatha ioga ao ambiente de esteiras, barras de ferro e bicicletas ergométricas. As novas academias já nascem com a pretensão de serem centros de bem-estar.

A rede A! Body Tech, com oito unidades no Rio de Janeiro, tem núcleos de massoterapia, estética e atividades orientais. O negócio está longe de ser tocado por neo-hippies. Tem entre seus sócios o empresário Alexandre Accioly, o jogador de futebol Ronaldo, o ator Rodrigo Santoro.

Até marcas tradicionais ligadas ao esporte querem pegar carona nessa nova mania. Recentemente, a Adidas lançou no Brasil uma sapatilha para ioga, assinada pela estilista Stella McCartney. A grife também tem uma linha de roupas para relaxar, com cores e materiais mais leves. O mundo, definitivamente, não é mais o mesmo.