Título: Paiol, entre o xadrez e os bonecos de chuchu
Autor: Ana Paula Scinocca
Fonte: O Estado de São Paulo, 29/10/2006, Especial, p. H6

Antes de ser Picolé de Chuchu, por achado do humorista Zé Simão, Geraldo José Rodrigues Alckmin Filho foi Geraldinho Paiol, por corruptela de um apelido dado por sua mãe, dona Myriam Penteado. Feliz da vida com o nascimento do caçula e único homem entre seus três filhos, ela costumava chamá-lo de 'Palhacinho da Mamãe'. Em família, a alcunha foi passando por transmutações até chegar em Paial, depois Paiol. Ruim de bola, bom de números, jogador aficionado de xadrez, interessado desde cedo em decorar nomes científicos de peixes, aluno sempre aplicado, mas nunca o primeiro da turma, Geraldinho Paiol teve infância rural e adolescência sem sobressaltos em Pindamonhangaba, cidade onde nasceu e debutou na política, aos 19 anos, como vereador.

O candidato tucano à Presidência da República cresceu em uma família com ligações sólidas, sem desconfortos materiais - e longe dos épicos sociais e geográficos que fazem a biografia de seu adversário, o presidente Lula . Mas também aprendeu cedo a lidar com as lambadas da vida. Quando tinha 10 anos, certa manhã estava pegando a bicicleta para sair da fazenda do Instituto de Zootecnia - onde a família morava porque o pai era veterinário contratado pelo Estado - e ir até a escola, no centro de Pindamonhangaba. 'Aí eu disse para ele: Paiol, vai na igreja e reza pela sua mãe', lembra Thereza Faria Santos, a Nhá, que chegou adolescente na fazenda para ajudar a cuidar das crianças. 'Falei isso porque ela teve uma noite difícil, com crise de bronquite. Mas não deu tempo dele rezar, não. Quando entrei, vi que ela já tinha morrido'.

Geraldinho Paiol perdeu cedo a mulher que andava pela casa chamando pelo 'palhacinho', mas ninguém lembra dele falando muito sobre isso. 'Ele era o menorzinho, mais quieto. Reagiu se apegando muito ao pai', conta Nhá. 'Ele perdeu a mãe aos 10 anos, eu perdi a minha aos 13 - e a gente nunca tocou no assunto', diz Eduardo San Martin, engenheiro que conheceu Alckmin em seu aniversário de 6 anos. Após perder a mãe, Alckmin retomou sua rotina sem sustos.

Quando criança, teve a fase em que gostava de brincar de fazendinha - com cavalos e vacas feitas com pedaços de mamão e chuchu por Nhá e cercados improvisados por seu pai com bambu. Depois, teve a fase em que entendia de peixes e recitava a diferença entre uma 'molinésia latipina' e um 'lebiste'. 'Ele dizia assim mesmo, com os nomes científicos', diz João Ribeiro, prefeito de Pinda e amigo de infância. Teve a fase em que mergulhou no xadrez. Sabia nomes das aberturas, a história de enxadristas e tentava bater no tabuleiro o pai, Geraldo José Rodrigues Alckmin Filho, maior influência em sua formação e campeão de referências nos 'causos' que costuma contar - à frente até de Mário Covas. Depois, resolveu ser médico - e aí só falava no assunto, até passar no vestibular.

Em todas as suas fases, Alckmin arrastava os amigos. 'Ele e eu éramos os mais novos da turma - mas ele chegava animado, ensinando coisas para todo mundo', diz Eduardo San Martin. 'Ele tinha uma influência sobre a gente. Não era nem muito bagunceiro, nem muito quieto, estava sempre sentado ali pelo meio da classe. Só fazia diferença no futebol, onde era bem ruinzinho. Mas conseguia interessar a gente no que ela gostava. Foi o primeiro da turma a ter carro e a levar a gente para a praia', diz o dono de farmácia Antônio Mauro de Castro, o Fanta, também amigo do período escolar.

Quando completou 19 anos, Geraldinho Paiol encontrou outra área de interesse. 'Um dia fui jogar xadrez com o pai dele. Perguntei pelo Geraldo e o pai respondeu: ih, agora ele inventou de ser vereador.' Alckmin começou a se dividir entre a Medicina e a política.

Paiol virou vereador e assinava como Geraldo Rodrigues Alckmin Filho. Depois foi prefeito e virou Geraldo Alckmin Filho. Deixou a medicina, virou vice-governador, passou a assinar Geraldo Alckmin. Na campanha pela presidência, chegou a ser chamado nos outdoors de Geraldo. 'Mais um pouquinho e volta ser Paiol', brinca Nhá.