Título: Economistas têm 91 propostas para o governo funcionar
Autor: Fernando Dantas
Fonte: O Estado de São Paulo, 29/10/2006, Economia, p. B1

Já existe um plano detalhado para cortar gastos e aumentar a eficiência do setor público, o grande tabu do segundo turno da campanha eleitoral. Para além dos muitos trabalhos teóricos e acadêmicos sobre o assunto, um grupo de 20 economistas está prestes a lançar o livro Gasto Público Eficiente: 91 propostas para o desenvolvimento do Brasil, no qual traçam um roteiro detalhado de medidas para fazer o Estado brasileiro funcionar melhor, gastando menos.

Tema da disputa eleitoral, o ajuste das despesas públicas ganhou conotação negativa junto ao eleitorado, sendo tratado como sinônimo de demissões de funcionários e cortes de benefícios sociais e previdenciários. As propostas de Gasto Público Eficiente têm o atrativo de não estar centradas em temas espinhosos, como a reforma da Previdência.

No quarto capítulo, de autoria do especialista Raul Velloso, são listadas sugestões mais conhecidas, como o fim da indexação do valor mínimo das despesas de saúde ao crescimento do PIB e da gratuidade total nas universidades públicas.

Na maior parte, porém, o livro aborda a possibilidade de economias e melhoras de eficiência em diversas áreas menos exploradas pelos economistas e menos conhecidas pela opinião pública, como leilões eletrônicos, política de pessoal, transferências para Estados e municípios, distribuição de royalties de petróleo, consórcios intermunicipais, processo orçamentário e funcionamento dos tribunais de contas.

Há um capítulo sobre os furos crescentes que ameaçam a Lei de Responsabilidade Fiscal (LRF) - e o que fazer para tapá-los - e outro em que se mostra como as regras político-eleitorais brasileiras levam ao mau uso dos recursos públicos, não apenas nas eleições, mas, sobretudo, nos mandatos dos políticos eleitos.

O economista Marcos Mendes, consultor legislativo do Senado e organizador do livro, bancado pelo Instituto Fernand Braudel, diz que ¿é possível fazer economias substanciais no setor público e gerar mais serviços com gasto menor¿. Na introdução, ele explica que ¿a opção feita neste livro é de explorar os aspectos micro e gerenciais, como forma de complementar o debate¿.

Segundo Mendes, um estudo do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea), que deve ser divulgado em breve, avalia que o desperdício anual nos municípios brasileiros é de cerca de R$ 16 bilhões - isto é, eles poderiam oferecer os mesmos serviços públicos economizando essa quantia.

É exatamente nesse tipo de desperdício que Gasto Público Eficiente está centrado. O livro mostra, por exemplo, como as atuais regras de repartição do Fundo de Participação dos Municípios (FPM) - repasses de impostos federais - têm distorções que entopem micromunicípios de verbas que nem têm como gastar, enquanto cidades médias repletas de pobres e problemas sociais ficam à míngua.

Na introdução do livro, Mendes esclarece que ¿um Estado mais eficiente e austero não é necessariamente um Estado mínimo, mas aquele que gasta nas áreas onde a sua atuação é mais necessária e eficiente, muitas vezes complementando a economia de mercado¿.

CAÇADORES DE RENDA Os primeiros capítulos do livro, que tem prefácio do ex-ministro da Fazenda Rubens Ricupero, são dedicados a discutir, em termos teóricos, a questão do tamanho do Estado. Os economistas Cláudio Shikida e Ari Francisco de Araújo Júnior mostram, por exemplo, que em 1988 a carga tributária brasileira, de 22% do Produto Interno Bruto (PIB), era muito inferior à americana, de 29%. Em 2004, a carga americana ainda se mantinha em 29%, enquanto a brasileira subiu para 36%.

Um dos pontos mais enfatizados pelos autores de Gasto Público Eficiente é que o gigantismo do Estado estimula a ação dos chamados ¿caçadores de renda¿ (tradução do termo inglês rent-seekers), que buscam ganhos por meio de proteção contra a competição, influência junto aos parlamentares ou mesmo pela indução de gastos desnecessários pelos poderes executivos.

Segundo os autores, uma sociedade onde predominam os caçadores de renda ¿é aquela em que muitas vezes vale mais a pena ir a um jantar com autoridades e pessoas influentes, onde se pode fazer relacionamentos valiosos, do que ficar em casa estudando para se tornar um profissional mais eficiente¿.