Título: 'Tucano precisa sair da toca do falso moralismo'
Autor: Wilson Tosta
Fonte: O Estado de São Paulo, 16/10/2006, Nacional, p. A5

O governador eleito da Bahia, Jaques Wagner (PT), agora um dos coordenadores da campanha presidencial à reeleição, garante: se depender dele, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva não recorrerá à 'baixaria' contra o tucano Geraldo Alckmin. Em entrevista ao Estado, Wagner acusa Alckmin de fazer uma campanha monotemática - em cima do tema corrupção - para esconder um projeto 'altamente conservador', de 'transferência de todo o patrimônio para a iniciativa privada'.

'Alckmin precisa sair da toca do falso moralismo e vir defender idéias para o Brasil', desafia, afirmando que o adversário esconde suas proposições por serem 'ingratas para a população brasileira'. E diz que, na 'inevitável' comparação com a gestão do ex-presidente Fernando Henrique Cardoso, Lula se sairá melhor, porque 'os números são os números'.

A que atribuir a realização de um segundo turno? Os fatores podem ser múltiplos. Evidentemente que o susto do dossiê deve ter dado uma perturbação no eleitor indeciso. E acho que existem questões locais que podem ter influenciado. Eu acho que vitória é vitória, a regra do jogo é dois turnos, portanto não acho nenhuma aberração ter segundo turno. Acho que o dossiê pode ter tirado aí 1% ou 2% dos votos.

A resposta do PT ao caso do dossiê Vedoin foi satisfatória?

Olha, algumas pessoas já foram afastadas. O problema é que há um frisson. Estamos vivendo, na minha opinião, um clima complicado de execução penal sem julgamento. Estou muito à vontade para discutir ética e corrupção, porque não reconheço no governo do PSDB-PFL nenhum exemplo de comportamento. Nos quadros deles, há figuras que violaram painel, grampearam telefones, se envolveram em corrupção. Agora, se alguém do PT errou, como errou, tem de pagar.

O presidente vai seguir na campanha uma linha de comparação?

Minha sugestão é que não entremos na baixaria. Então, por exemplo, eu acho deprimente alguém que pretenda ser presidente da República ficar dizendo que a grande missão dele será vender um avião, que é um equipamento da Força Aérea Brasileira, não do presidente. É de um besteirol isso que o Alckmin falou que ele deve ter perdido muito voto. Eu acho deprimente. Alguém que pretenda ser presidente do Brasil, já foi governador, querer fazer chacota e ganhar voto numa dimensão tão pequena... Agora, não quero ficar nesse debate, quero debater Brasil, quero saber o que o Alckmin pensa. A única coisa que disse (no debate da TV Bandeirantes) foi repetir um mantra treinado: 'Onde está o dinheiro?' E a cada resposta dizer: 'Viu que ele não respondeu? Viu que ele não respondeu?' Pode ter animado a tropa dele, mas não ganhou um voto.

O mapa eleitoral do primeiro turno mostrou um País dividido. Como fazer para melhorar o desempenho do presidente especialmente em São Paulo e no Sul?

Olha, para quem faz política com responsabilidade, seja de que partido for, não há pior sugestão para o Brasil do que começar a fazer ilação de que Brasil se divide entre Norte e Sul, entre ricos e pobres. Volto ao meu tema: o Brasil escolhe entre dois caminhos, dois projetos político-administrativos diferentes e quase contraditórios. Concordo, tem um corte no meio, e o Lula ganha para cima e o Alckmin ganha para baixo. Mas não é tão assim. Eu acho que não há uma razão única. Por exemplo, o motivo que levou o Alckmin a ganhar no Sul é o mesmo em todos os Estados? Eu não acho. Por que foi bem votado no Nordeste? 'Ah, porque tem Bolsa-Família.' Tem Bolsa-Família em São Paulo também...

Como estão as conversas para o segundo turno?

Estou fazendo um esforço para que o PDT decida pelo apoio ao presidente Lula. Lutamos juntos contra o programa generalizado de privatização. Portanto, na hora em que vamos decidir sobre o futuro do País , o que pesa mais é que País eu quero. E aí são dois projetos diferentes. A tentativa do Alckmin é ficar no samba de uma nota só, monotemático, só na tentativa de estigmatizar, da corrupção, da ética, porque não quer discutir. Estou falando com pureza d' alma: não tem como comparar. Não tem, porque os números são os números. A Petrobrás vale cinco vezes mais, porque fizermos uma gestão para potencializar a empresa. Não adianta eles ficarem com conversa fiada.

A questão da privatização no governo passado vai ser uma linha de campanha?

O problema é que o candidato do PSDB se esconde, então o presidente Lula fica levantando as questões. O projeto de Brasil do Alckmin é altamente conservador, é de transferência de todo o patrimônio para a iniciativa privada. Não concordamos com isso. Por isso, estou insistindo: queremos dizer que Brasil a gente defende, o Alckmin precisa dizer o que defende. Então precisa dizer, em vez de ficar se escondendo atrás de 'cadê o dinheiro'. Precisa sair da toca do falso moralismo e vir defender idéias para o País. O Brasil não vive só de combate à corrupção. O combate à corrupção é fundamental, mas o Brasil vive de idéias para o futuro. Ele não quer mostrar, porque algumas delas são ingratas para a população brasileira. Esconde, porque a comparação com o Fernando Henrique é inevitável.