Título: Incra apóia líder do MST em briga com Judiciário
Autor: Angela Lacerda
Fonte: O Estado de São Paulo, 20/10/2006, Nacional, p. A16

A superintendente do Incra no Recife, Maria de Oliveira, pregou ontem uma reforma do Judiciário e uma ação radical do governo federal e do Estado com objetivo de fazer reforma agrária na zona da mata pernambucana, área tomada pela plantação da cana-de-açúcar.

As afirmações foram feitas em entrevista que Maria de Oliveira concedeu para comemorar a revogação da prisão preventiva do coordenador nacional do MST Jaime Amorim, pelo Superior Tribunal de Justiça (STJ). Na sede do Incra, ao lado de Amorim e dirigentes estaduais do MST, ela compartilhou a avaliação do movimento de que a Justiça persegue os movimentos sociais de luta pela terra.

'Não há lucro para o governo nem para a sociedade com a prisão de pessoas que estão trabalhando e resgatando o País', afirmou. 'Esse processo de perseguição é visivelmente contra os trabalhadores rurais organizados no País.'

Para Maria, houve maior cobrança da prisão de Amorim 'pelo vínculo internacional' no processo que ele responde. O líder é acusado de invasão de prédio público e formação de quadrilha, por conta de protesto contra o governo Bush, em novembro do ano passado, quando comandou um grupo que apedrejou e pichou o consulado norte-americano no Recife. 'Não sei por que ficam preferencialmente mais fortes as coisas internacionais, e não as coisas brasileiras', comentou ela.

Em entrevista, Amorim reforçou a tese. 'Foi exigência dos Estados Unidos para garantir no Brasil uma orientação que é dada ao mundo inteiro, a de transformar os militantes que lutam pela causa social em terroristas.' E se preparado para tudo: para a prisão, para a vitória, para morrer.

Maria disse que é preciso modificar o comportamento do Judiciário. 'O Brasil não mudará se não passar por uma reforma muito forte da postura e da forma como o Judiciário vem trabalhando no País', afirmou. Ela avaliou como 'ruim' e 'simplório' o modelo de reforma agrária. 'Já cobramos de Brasília o encaminhamento de processos mais radicais no campo da reforma agrária, um ato de governo de intervenção fundiária.'

Segundo a superintendente do Incra, a intervenção fundiária que defende envolve ações contra concentração da terra, crime ambiental, crime contra trabalhadores rurais e desrespeito aos direitos humanos. Ela citou a zona canavieira de Pernambuco como exemplo de área passível dessa intervenção. E ressaltou que pertence à União grande parte do território ocupado pelas usinas de cana, as quais têm débitos trabalhistas e passivos 'impagáveis'. Nesse caso, caberia, segundo ela, a retomada das áreas da União e a intervenção do governo nos débitos.

'Pernambuco tem plantador de maconha, traficante, tem depósito de armas, tem cidades onde mais se mata no País, tudo por causa do processo fundiário', argumentou. 'Ou se passa por uma reestruturação apontada pela intervenção de governo, ou teremos muita dificuldade de manter a tranqüilidade no Estado de Pernambuco.'

O Estado tem cerca de 33 mil famílias acampadas - entre sem-terra, índios e quilombolas - e seis movimentos de luta pela terra reconhecidos pelo Incra.