Título: México, uma prioridade
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Fonte: O Estado de São Paulo, 05/10/2006, Notas e Informações, p. A3
A visita a Brasília do presidente eleito do México, Felipe Calderón, amanhã, será uma boa oportunidade para o governo e os empresários brasileiros defenderem uma ampliação do acordo comercial entre os dois países. A proposta de um acordo bem mais ambicioso que o entendimento em vigor foi apresentada na última semana por diplomatas brasileiros, na capital mexicana. Em final de mandato, o presidente Vicente Fox deve ser cauteloso em relação a novos compromissos, deixando as decisões mais importantes para o sucessor. Mas o futuro presidente pode ser desde já incluído na discussão sobre as possibilidades de maior comércio bilateral.
Calderón esteve ontem na Colômbia e no Peru. Sua agenda incluía contatos no Chile, hoje. Não se trata apenas de cortesia. Depois de firmar acordos de livre-comércio com os mercados mais desenvolvidos, o governo mexicano tem procurado aprofundar a relação comercial com os parceiros da América do Sul. Seu último grande passo, nesse rumo, foi a negociação do ingresso no Mercosul.
O México já tem com a Argentina e com o Uruguai pactos comerciais mais amplos que o acordo com o Brasil, que cobre apenas um décimo dos produtos comercializados e estabelece cotas para veículos. É possível ir muito mais longe. A grande novidade, agora, é a pressão do setor privado brasileiro por um acordo mais amplo com o México, o parceiro mais competitivo na América Latina. As autoridades de Brasília são empurradas pelo empresariado para cuidar do assunto com maior ousadia e menor propensão defensiva.
A proposta brasileira ainda não contempla um acordo de livre-comércio, mas inclui todos os produtos da pauta bilateral no compromisso de liberalização. O objetivo geral seria um corte de 30% nas tarifas. Poderia haver uma lista de exceções, com redução de apenas 20% nas alíquotas.
Será necessário vencer alguma resistência dos dois lados. As vendas brasileiras para o México aumentaram de US$ 1,7 bilhão em 2000 para US$ 4,1 bilhões no ano passado. As exportações mexicanas para o Brasil avançaram muito menos, crescendo de US$ 750 milhões para US$ 840 milhões no período. Cerca de dois terços do superávit brasileiro de US$ 3,2 bilhões no ano passado resultaram do comércio de veículos. Isso pode explicar a resistência mexicana a uma abertura maior desse comércio. As cotas de veículos com tarifa zero aumentaram de 130 mil unidades em 2003 para 210 mil neste ano e para 2007 estava previsto o livre intercâmbio. Mas os mexicanos preferem adiar a completa liberalização dessas trocas.
Do lado brasileiro também há setores que se consideram vulneráveis à competição mexicana. A indústria petroquímica é um exemplo. Mas é pouco prático admitir que as dificuldades de alguns setores possam impedir a ampliação do comércio entre as duas maiores economias latino-americanas. Os negociadores devem ser capazes de encontrar soluções para essas dificuldades.
Se os mexicanos pretendem valer-se do mercado latino-americano para diversificar seu comércio - muito dependente dos EUA, apesar de seus acordos comerciais com muitos outros países -, o Brasil é o parceiro ideal para isso. Nenhum outro mercado na América Latina é tão grande quanto o brasileiro e nenhuma outra economia da região oferece tantas possibilidades de intercâmbio, graças a sua produção diversificada.
O governo e o empresariado mexicanos deram prioridade à integração norte-americana e isso é compreensível. Também a maioria dos sul-americanos tem considerado prioritária a associação comercial com os Estados Unidos - o que só o governo petista parece não haver entendido. Mas o atraso na aproximação entre Brasil e México foi certamente uma falha estratégica dos dois lados. As duas maiores economias da América Latina poderiam ter-se beneficiado consideravelmente de uma cooperação mais intensa há muito mais tempo.
O governo brasileiro, que tem errado tanto na estratégia latino-americana, ganhará um ponto muito importante, se buscar com empenho a ampliação do comércio com o México.