Título: Na volta, festa pela 'dádiva de Deus'
Autor: João Domingos
Fonte: O Estado de São Paulo, 31/10/2006, Especial, p. H3
Mais místico e menos mal-humorado, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva pregou ontem o mote 'deixa o homem descansar'. Ao retornar a Brasília, após conquistar nas urnas o direito de ficar mais quatro anos nos palácios do Planalto e da Alvorada, ele repetiu que a disputa em segundo turno com o tucano Geraldo Alckmin foi uma 'dádiva de Deus', pois permitiu esclarecer propostas de governo. 'Teve gente que achou que o segundo turno ia facilitar a vida deles, mas na verdade facilitou a nossa vida, porque deixou claro para a sociedade o que estava em disputa neste país.'
Há quatro anos, precisamente a 29 de outubro de 2002, o petista chegava a Brasília para iniciar o governo de transição visivelmente de mau humor, menos solícito e paciente com a imprensa e sem esconder um certo desconforto no novo cenário. À época, pessoas nas margens das pistas e gramados o saudaram. Ontem, com mais de 5 milhões de votos além do que no pleito anterior, Lula foi recepcionado por poucos moradores da cidade no trajeto da base ao Alvorada. Mas, como há quatro anos, a militância do PT o esperou na base aérea e na portaria do Palácio.
Às 10h30, no desembarque na base aérea, a banda da Aeronáutica tocou a música-tema da vitória de Ayrton Senna na Fórmula 1 e Aquarela do Brasil, de Ary Barroso. Cerca de 300 militantes aguardavam o presidente na saída da base. Lula e a primeira-dama Marisa Letícia puxaram uma carreata até o Alvorada. Lá, os dois desceram do carro para cumprimentar um grupo de 50 militantes.
O presidente atendeu de pronto pedidos da imprensa para comentar a vitória. Marisa vestia uma camiseta de campanha. Embora pequeno, o grupo de militantes gritava sem parar 'Lula, guerreiro/do povo brasileiro', e deu trabalho para os seguranças ao tentar agarrar o presidente.
Separado dos militantes e jornalistas por um espelho d'água, Lula agradeceu aos eleitores de Brasília, onde conseguiu ultrapassar Alckmin no segundo turno, com 56,96% dos votos válidos. No primeiro turno, ele teve menos votos que Alckmin na capital. 'Acho que a militância, definitivamente, ocupou as ruas desse País', afirmou. 'A virada em Brasília foi muito importante.'
Em meio aos gritos dos militantes, o presidente, então, fez gesto pedindo silêncio. 'Quero dizer: olha, a gente que usou na campanha 'deixa o homem trabalhar'; agora, em algum momento, tem de dizer 'deixa o homem descansar'.' Depois, disse que nesta semana participará de um ato, em Brasília, para agradecer pelo apoio da militância. À tarde, daria quatro entrevistas para emissoras de televisão no Alvorada.
Indagado se esperava a recepção, Lula sorriu: 'Esperava.' O presidente comentou a eleição de Eduardo Campos (PSB) para o governo de Pernambuco e a 'vitória estupenda' da senadora petista Ana Júlia Carepa na disputa pelo governo do Pará. Em seguida, atendeu ao pedido do fotógrafo oficial do Planalto, Ricardo Stuckert, e posou abraçado com Marisa no gramado do Alvorada.
CARREATA
Em seguida, chegaram ao Palácio do Planalto dezenas de veículos com outros 300 manifestantes da carreata que não conseguiram acompanhar o comboio presidencial. Eles chegaram ao Planalto quando Lula já havia se deslocado para a residência oficial. A carreata percorreu todo o Eixo Rodoviário Sul e entrou pelo Eixo Monumental, em direção ao Alvorada.
Os ministros da Fazenda, Guido Mantega, da Justiça, Márcio Thomaz Bastos, e da Secretaria-Geral, Luiz Dulci, acompanharam Lula no comboio ao Palácio da Alvorada, em carro oficial.