Título: Especialistas consideram baixo o risco de guinada na economia
Autor: Marcelo Rehder, Cleide Silva
Fonte: O Estado de São Paulo, 31/10/2006, Especial, p. H5

O risco de guinada na economia no segundo mandato do presidente Luiz Inácio Lula da Silva é baixo, segundo economistas liberais e heterodoxos, apesar das declarações do ministro Tarso Genro sobre o fim da era Palocci. De forma geral, avaliam que essa discussão é estéril, porque a política econômica é do presidente. Em comum, ainda, não acreditam que o País cresça mais que entre 3% e 4% nos próximos quatro anos, embora discordem das ações que devem ser tomadas para um crescimento maior.

O professor do Instituto de Economia da UFRJ, Reinaldo Gonçalves, que participou dos programas econômicos do PT desde as eleições de 1989, diz que 'essa conversa dele (Tarso) é desprovida de sentido'. Ele explica que nunca houve era Palocci e, na verdade, quem manda é o próprio Lula, cuja orientação é 'zero de marola' na área econômica, especialmente quanto ao câmbio e à inflação.

'É como se dissesse: 'não quero problema nessas áreas'. E os serviçais seguem isso, sem a menor resistência. Vão fazer a linha de menor resistência', afirmou. Gonçalves, que se desfiliou do partido em janeiro de 2004, diz que a política econômica não tem um tripé, mas um 'quadrúpede', formado por câmbio flutuante, metas de inflação, megassuperávit e liberalização cambial e financeira. 'Não há nenhuma evidência de que isso vá mudar', diz ele.

Alojado na diretoria-executiva do Banco Itaú, o ex-diretor do Banco Central Sérgio Werlang concorda que a política econômica é de Lula. 'Foi ele quem escolheu seus subordinados e não vejo por que mudaria a política pela qual ele mesmo optou', afirmou.

Ele considera que há espaço para queda mais rápida dos juros, mas pondera que um crescimento de 5% do PIB ao ano é 'forte demais' como projeção para o segundo mandato. Para aumentar essa velocidade, Werlang diz que seria necessário aprovar uma longa agenda de reformas - trabalhista, do Judiciário, lei das agências reguladoras, além do aumento da abertura comercial -, o que ele considera difícil de ocorrer. Já o professor da UFRJ defende o controle de capitais, aumento da reserva cambial e do investimento do setor público como receita para um crescimento maior.

'Com essa política, vamos ficar com medíocres 3%', previu Gonçalves, para quem a discussão levantada por Tarso é uma 'lorotagem' - misto, segundo ele, de lorota com bobagem. No domingo, o ministro das Relações Institucionais pregou o fim da era Palocci e declarou que houve nos últimos anos uma 'preocupação paranóica' com a inflação baixa com reduzidas taxas de crescimento. Nesse sentido, o País estaria passando de uma política conservadora para uma desenvolvimentista.

Para o economista da PUC-Rio José Márcio Camargo, as declarações de Tarso fazem parte de uma disputa dentro do PT para ver 'quem vai apitar na política econômica'. Ele diz que é difícil prever o resultado dessa disputa, mas não acredita em mudanças.

'Se o governo acabar com a autonomia informal do BC e reduzir rapidamente os juros, o resultado será mais inflação. Acho difícil que aconteça, porque está claro para Lula que um dos pilares de sua popularidade é a inflação baixa',diz Camargo.

Assessor do senador Tasso Jereissati (PSDB-CE), o professor da FGV Samuel Pessôa disse que viu com muita tristeza 'uma das lideranças mais importantes do novo governo querendo retomar um debate de dez anos atrás' e se confessou 'superpreocupado'. Ele também afirmou que, se houver mudanças nos pilares econômicos, o País 'vai desperdiçar a chance, depois de um longo processo, de virar um país normal'. Pessôa defendeu o momento atual da economia, com solidez externa e controle da inflação, ainda que não acredite em ritmo maior do crescimento econômico nos próximos anos.