Título: PF ataca quadrilha de contrabando de cigarro e prende 97
Autor: Paulo Baraldi, João Naves
Fonte: O Estado de São Paulo, 11/10/2006, Economia, p. B8

A Polícia Federal e a Receita Federal desbarataram ontem o que pode ser considerada a maior organização criminosa para contrabando de cigarros no País. A operação, chamada 'Bola de Fogo', teve a participação de 750 agentes da PF além de servidores da Receita, que cumpriram até ontem à noite 97 prisões em 11 Estados.

Entre os presos estão advogados, empresários, servidores públicos e familiares que eram usados como laranjas. Fazendas e diversos bens devem ser seqüestrados pela Justiça. De acordo com a PF, foram adquiridos por meio de lavagem de dinheiro. Também foram apreendidos carros de luxo e armas como pistolas automáticas e um fuzil AR-15. Os crimes investigados são contrabando, descaminho, sonegação fiscal, corrupção ativa e passiva, exploração de prestígio, falsidade ideológica, evasão de divisas, lavagem e ocultação de ativos ilícitos. Mais de 300 contas bancárias de cerca de 80 pessoas físicas e jurídicas estão bloqueadas pela Justiça.

O esquema era dividido em três organizações criminosas. A princípio, descobriu-se que empresas faziam contrabando do produto vindo do Paraguai. Com a investigação, policiais souberam que havia parte do esquema no Brasil, a partir de produção local para exportação, distribuída ilegalmente no mercado interno.

No Estado de São Paulo, a PF prendeu 25 pessoas, entre eles Daniel e Davi Yang Ching, sócios da Sudamax Indústria e Comércio de Cigarros, instalada em Cajamar, na Região Metropolitana de São Paulo, e apontada como produtora e uma das distribuidoras do produto.

A Sudamax - fechada ontem pela Receita, que também apreendeu todos os insumos e cigarros prontos das empresas investigadas - comercializava oito marcas, seis para o mercado interno e outras duas para exportação. Em nota, a Sudamax informou que 'não existe nenhum ato de infração por sonegação fiscal contra a empresa'.

Os empresários Daniel e Davi Yang Ching mantinham no Paraguai a Tabacalera Sudan SRL, responsável pela fabricação dos cigarros da marca US Mild. Na verdade, o produto era fabricado no Brasil para exportação, com isenção de tributos, mas era vendido no mercado doméstico. 'Dava a impressão de que era trazido ilegalmente, mas era produzido aqui', disse o delegado Gilberto Pinheiro, que coordenou a ação em São Paulo. O selo de qualidade e autenticidade também são suspeitos de serem falsificados.

'Eles não corriam o risco de passagem pela fronteira e tinham toda a estrutura montada para produzir o cigarro paraguaio com melhor qualidade e mais aceitação no mercado interno', disse o delegado. Segundo Pinheiro, durante a investigação, iniciada em janeiro, 23 mil caixas de cigarros foram apreendidas, com valor estimado em R$ 13 milhões. A sonegação é calculada em R$ 10 milhões no período de dois a três anos, quando a empresa entrou para o esquema. Com o dinheiro ilícito do comércio de cigarros, a polícia investiga a compra de outras companhias do grupo no setor imobiliário e empresas offshore no Uruguai.

Além dos 2 chineses, foram presos 2 policiais federais em Marília, o servidor da Receita João Leandro Vilaça da Conceição, com US$ 500 mil, e 2 advogados, suspeitos de comprar sentenças judiciais favoráveis à empresa. A PF ainda apreendeu em São Paulo cerca de US$ 750 mil e R$ 250 mil, 3 armas de fogo e 25 veículos, entre eles um Volkswagen Touareg e uma Ferrari, de Hyran Georges Delgado Garcete.

O empresário, preso em Mato Grosso do Sul, é apontado como o chefe de uma das organizações. Ele era, de acordo com a polícia, o responsável pela entrada de grande quantidade de cigarros contrabandeados, armas e drogas no Brasil. Naquele Estado, 26 integrantes do grupo estão presos. Além do líder Garcete, há mais empresários, funcionários públicos e advogados como Félix Nunes da Cunha, um dos contratados pelo governador eleito André Puccinelli (PMDB).

'Félix é um laranja no esquema', disse o delegado Alexandre Custódio, coordenador regional da operação em Mato Grosso do Sul. Segundo Custódio, embora na condição de 'laranja', o advogado cuidava das transações comerciais do acusado e estava consciente de que era 'dinheiro sujo'.

Garcete é dono de mansões e dezenas de empresas, e transformou parentes como a mãe, Alzira Garcete, e a irmã Daniela Delgado Garcete, em laranjas. O empresário acumulou bens avaliados em mais de R$ 100 milhões nos últimos cinco anos, quando passou a financiar grandes compras de cigarros paraguaios, fabricados no Brasil. Segundo Custódio, o americano Peter Young, um dos proprietários da United Manda UC, com sede em Nova York, faz parte do esquema de Garcete. Também é investigada uma ramificação da Sudamax na África.

Em Natal, Rio Grande do Norte, a PF encontrou a Distribuidora de Alimentos e Produtos de Consumo Dunas, a terceira organização. Segundo a PF, ela era a atacadista de cigarros ilícitos do Paraguai, provenientes tanto da Sudan como de outras fabricantes, e do US Mild, da Sudamax. Outra distribuidora seria a Tabacalera Central, dos irmãos Roque e Roni Silveira.

Os débitos tributários não pagos no setor de cigarros passam de R$ 4 bilhões. A Receita estima a sonegação em R$ 600 milhões por ano. Hoje, das 16 fabricantes de cigarros no Brasil, 9 têm os registros cancelados, mas funcionam com liminares.

BALANÇO

97 pessoas haviam sido presas na Operação Bola de Fogo até a noite de ontem

750

policiais e servidores da Receita Federal participaram da operação

23 mil

caixas de cigarro foram apreendidas pelos agentes

R$ 13 milhões

é o valor estimado da carga apreendida pela Polícia Federal na operação