Título: PT muda campanha e convoca bons de voto
Autor: Vera Rosa
Fonte: O Estado de São Paulo, 03/10/2006, Especial, p. H3

A crise provocada no Palácio do Planalto e no PT pelo fracasso da tática montada para reeleger o presidente Luiz Inácio Lula da Silva no primeiro turno da disputa fez o comando da campanha mudar radicalmente sua estratégia. Na tentativa de compensar as fragilidades da cúpula petista, Lula chamou para ajudá-lo na campanha o time dos 'bons de voto' do PT: os governadores eleitos Jaques Wagner (Bahia), ex-ministro das Relações Institucionais, e Marcelo Déda (Sergipe ), além do deputado federal eleito Ciro Gomes (PSB), ex-ministro da Integração Nacional.

Wagner e Déda desembarcarão hoje em Brasília para conversar com o presidente. O governador eleito da Bahia defendeu a saída do presidente do PT, deputado Ricardo Berzoini (SP), do comando do partido e disse que dirá isso a Lula. 'Um presidente de partido sob suspeita, que estiver sendo investigado, não tem a menor condição de ficar no comando ', afirmou ele, em Salvador.

O coordenador da campanha, Marco Aurélio Garcia, pôs ontem o cargo à disposição, mas Lula não aceitou. Menos de 24 horas depois de eleito, Wagner anunciou que cobrará da cúpula do PT que 'aperte' os códigos de conduta do partido e puna os culpados no escândalo do dossiê Vedoin, uma papelada que petistas tentaram comprar, por R$ 1,75 milhão, para associar o então candidato do PSDB José Serra, hoje governador eleito de São Paulo, com a máfia das ambulâncias.

'Não tenho nenhum medo de dizer que as práticas incorretas que já reincidiram sobre nosso partido, com prejuízos para o presidente Lula, têm de ser duramente criticadas e afastadas. Meu partido não foi feito para viver na marginalidade nem para conviver com ilegalidade', insistiu. 'Quem compra um dossiê de um marginal é tão errado quanto o marginal.'

Berzoini negou envolvimento com o escândalo. 'O papel mais responsável que a gente pode ter agora é cuidar do segundo turno e não estimular as discussões internas e divisões no partido', disse. 'Tenho a consciência tranqüila de que não cometi nem incentivei ninguém a cometer ilegalidade.'

O comitê da reeleição vai alterar toda a estratégia em São Paulo, maior colégio eleitoral do Brasil e onde Lula teve o pior desempenho. Não sem motivo a temperatura do fogo amigo subiu.

Na mesma linha de Wagner, Déda sugeriu uma 'mudança radical' na direção do PT. 'Precisamos resgatar a alma do PT, cortar os galhos que não prestam mais, se quisermos vencer a eleição contra o candidato do PSDB, Geraldo Alckmin'. Para Déda, a 'matriz paulista' do PT não ajuda mais a sigla. Ao contrário. 'O PT paulista era o coração, o cérebro, mas virou um intestino com uma diarréia brutal', afirmou.

CONSELHO POLÍTICO

Depois da reunião do Conselho Político da campanha com Lula, ontem à noite, no Palácio da Alvorada, Ciro Gomes estreou sua nova função: chefia do departamento de ataques e pronta resposta. Com a língua afiada, Ciro dirigiu a artilharia contra o governo de Fernando Henrique Cardoso, na tentativa de associar Alckmin com o que chamou de 'retrocesso'.

'Se a discussão ética tomou o relevo que tomou, vamos tratá-la. Não creio que seja ético explorar escândalos que merecem severa apuração e punição para manipular consciências. Isso não é ético', destacou Ciro. 'Se falhas houve, vamos corrigi-las, mas não é razoável que o País seja induzido a esquecer que essa gente da coalizão do PSDB e do PFL é responsável pelos mais graves escândalos impunes da história republicana brasileira.'

Para Marco Aurélio Garcia, o governo e o PT estão absolutamente aptos para enfrentar a batalha do segundo turno. 'Sobretudo, não vamos permitir a volta do governo da privataria', disse. 'Vamos fazer comparações com a administração do PSDB porque Lula entra no 2º turno não só com propostas e programas, mas com realizações que dão base a esse programa. Não são pedaços de papel que vão ser oferecidos, mas realizações concretas que avalizam as perspectivas para o segundo mandato.'