Título: Inércia da CTNBio vai continuar, diz seu presidente
Autor: Lígia Formenti
Fonte: O Estado de São Paulo, 22/10/2006, Vida&, p. A31

O presidente da Comissão Técnica Nacional de Biossegurança (CTNBio), Walter Colli, tem uma previsão que vai agradar a grupos ambientalistas e desapontar pesquisadores: são praticamente nulas as possibilidades de o País ter neste ano alguma nova decisão sobre liberação comercial de sementes transgênicas. 'Com sorte, podemos avaliar uma vacina transgênica para uso veterinário. No restante, existe ainda um longo caminho a percorrer.'

Para cientistas, esse resultado é frustrante. 'Não há uma gana para aprovar todo e qualquer transgênico. Mas o fato de não termos avaliado nem um processo de liberação até o fim, durante um ano de trabalho, é extremamente penoso', afirma um dos cientistas da comissão, que prefere não ter seu nome revelado.

Com exceção de Colli, são poucos os integrantes da CTNBio que hoje se sentem à vontade para expressar suas opiniões. Eles dizem o que pensam, mas sob a condição de que o sigilo seja mantido. 'Todos são muito suscetíveis. Qualquer crítica depois é cobrada na reunião', conta um dos integrantes.

Esse clima de 'patrulha' reflete como hoje funciona a comissão. 'São dois grupos que se digladiam o tempo todo. Um favorável à aprovação rápida e outro, que usa de todos os meios para retardar as discussões', afirma um pesquisador, favorável ao encaminhamento sem demora de tantas questões pendentes.

Além de exigências que, para alguns cientistas, são exageradas, o grupo 'vegetariano' adora uma divagação. O que torna as discussões praticamente intermináveis. O cientista dá um exemplo. Num pedido de importação de milho argentino para ser usado em granjas do Nordeste, ambientalistas gastaram horas discutindo por que não usar o milho brasileiro da região Centro-Oeste. Ao saber que se tratava de um problema de logística, eles trataram então de fazer discursos pedindo melhoria nas estradas. 'Quem não perde a paciência com isso?', afirma. 'Justamente por isso, muitos dos integrantes do conselho faltam à reunião.'

É o alto absenteísmo que vem preocupando o presidente da CTNBio. 'Faço um apelo para que todos compareçam', disse Colli depois da reunião de quinta-feira. 'A comissão está sendo xingada de burocrata. Mas sem presença de um grupo razoável, não tenho como colocar em votação assuntos tão importantes.'

Depois da reformulação da comissão, fruto da Lei de Biossegurança, a CTNBio passou a ter 54 integrantes, metade deles suplente. Para aprovação de uma liberação comercial, são necessários 18 votos favoráveis - dois terços dos titulares. 'O problema está na lei. Em vez de uma comissão, eles criaram uma assembléia geral. E, assim, dificilmente as coisas andam', diz Colli.

'Estamos discutindo problemas técnicos. Mas a verdade é que muita gente não sabe nada, não faz questão de saber e quer apenas discutir temas políticos, sociais', afirma um cientista.

Um outro integrante, da ala mais cautelosa, tem uma visão diferente de todo o processo. Para ele, não há dentro do próprio governo uma clara sinalização sobre que política adotar com transgênicos. 'Daí acontece isso. Um grupo, que tem pressa em aprovar qualquer coisa, fica criando falsas crises, para tentar garantir resultados que lhe interessam.' E completa: 'As coisas somente vão andar quando o governo disser o que quer nesta área. Caso contrário o jogo de acusações vai continuar'.

Este é um dos únicos pontos em que pesquisadores e ambientalistas concordam.