Título: 'Importação é armadilha para o crescimento'
Autor: Ariosto Teixeira
Fonte: O Estado de São Paulo, 22/10/2006, Economia, p. B3

O aumento das importações líquidas subtraiu um ponto porcentual do crescimento do Produto Interno Bruto (PIB) no primeiro semestre, segundo conclusão de economistas da gestora de fundos Quest. O trabalho sobre o desempenho da indústria foi feito a partir de dados do IBGE e da Fundação Centro de Estudos do Comércio Exterior (Funcex) relativos ao período.

Segundo o economista-chefe da Quest, Paulo Pereira Miguel, o fenômeno tende a ganhar força em 2007 e se tornar ¿obstáculo relevante¿ ao cumprimento da promessa do presidente Luiz Inácio Lula da Silva de expansão de 5% do PIB. ¿Vai ser quase impossível sair da armadilha do baixo crescimento¿, afirmou Miguel.

Segundo ele, a aceleração das importações líquidas foi propiciado pela valorização do real, que tornou mais barato importar que fabricar no País. Miguel sustenta que o fenômeno decorre especialmente da crença dos empresários do setor produtivo de que o câmbio ¿que está aí, em torno de R$ 2,20, veio para ficar¿.

Para Miguel, o cenário que encoraja as importações difere dos movimentos observados em 1998 e 2002, nos quais a deterioração das contas externas produziu a desvalorização do real ante o dólar e interrompeu o fluxo de importações. ¿Esse risco acabou com o fim da vulnerabilidade nas contas externas e as empresas se sentem encorajadas a substituir fornecedores locais por produto importado, que é mais barato e lhes garante competitividade¿, diz ele.

O estudo evidencia, segundo o economista, os problemas de gestão da política macroeconômica ¿no atual governo¿. Além disso, mostra outra diferença importante em relação ao período 1999-2002: a produção situava-se sempre um degrau acima do consumo aparente (valor bruto de produção mais exportações menos importações). Isso significava que as exportações cresciam mais que as importações e agora essa situação está se invertendo, conforme revelam as simulações gráficas do estudo.

O fenômeno explica também, conforme Miguel, os números maiores do consumo das famílias (4%) em relação ao crescimento do PIB ( 3%) no primeiro semestre. Ou seja, o consumo interno aumentou estimulado pela transferência de recursos públicos (alta real de 15% do salário mínimo , expansão do programa Bolsa-Família e controle inflacionário rigoroso), sem transferir esse incremento para a produção industrial.

Além de afetar o crescimento do PIB, o fenômeno desvendado pelo estudo da Quest mostra dois efeitos perversos: a) o setor industrial que mais está sofrendo é o intensivo em trabalho, que cresceu negativamente 0,1% no período de agosto de 2005 a agosto de 2006; b) a criação líquida de empregos industriais foi zero nesse período.

A expansão dos setores intensivos de capital e o de petróleo e commodities não foi suficiente para a perda de dinamismo dos 14 setores intensivos de mão-de-obra. Os setores que mais desempregaram foram os de calçados (13,6%), madeira (12,6%), máquinas e equipamentos (58%), fumo (4,8%) e o de vestuário (4,3%). Os sete setores que mais cresceram a oferta de emprego foram os de refino de combustíveis (10,3%), alimentos e bebidas (8%), eletroeletrônicos (4,7%) e veículos (3,9%).