Título: Magistrados estão insatisfeitos com cortes
Autor: Fausto Macedo
Fonte: O Estado de São Paulo, 20/11/2006, Nacional, p. A5

Os juízes e os promotores estão insatisfeitos e irritados com os sucessivos cortes que o Executivo tem promovido no Orçamento dos tribunais e do Ministério Público (MP). Eles dizem que não aceitam mais o papel de reféns dos governos estaduais e do federal.

A ordem é pôr na parede os chefes de Executivo para que não reduzam ainda mais o montante que consideram adequado para cobrir despesas com pessoal e custeios.

'Vamos pressionar porque a Constituição deu autonomia administrativa e financeira aos tribunais', avisou o juiz Rodrigo Collaço, que preside a Associação dos Magistrados Brasileiros (AMB), maior entidade da toga no mundo. 'O Executivo não é o dono do País nem o dono do Orçamento. Existe tradição no Brasil de que o Executivo é o dono do dinheiro. A arrecadação não pertence a nenhum segmento do Poder, deve ser dividida de forma mais equilibrada.'

O argumento central é que o Judiciário não constrói ponte nem estrada. 'Praticamente toda a verba é destinada ao pagamento de pessoal', lembra Collaço. 'A Constituição ampliou acentuadamente a área de atuação e prestação de serviços do Judiciário. Houve um natural aumento do quadro de servidores e de juízes.'

Os governos alegam queda na arrecadação. A União reclama que desembolsa 20% da folha salarial com o Judiciário, o Legislativo e o MP. Essas repartições custam R$ 47 bilhões por ano ao contribuinte, conforme revelou o Estado. Em 1996, R$ 15 bilhões eram suficientes para cobrir o contracheque desses segmentos. Em 10 anos, um salto de 213% ante inflação de 86%. 'O governo não deve reclamar de gastar 20% com a democracia', reage Collaço. 'A Justiça e o MP cumprem atuação importante no atendimento à demanda do País em busca de atenuação para a falta de boas políticas públicas.'

'O Judiciário é refém do Executivo', atesta Ricardo Lewandowski, ministro do Supremo Tribunal Federal (STF), onde cada magistrado fechará o ano com cerca de 14 mil processos julgados, além de decisões liminares. 'É antiga a reivindicação do Judiciário para que tenha um porcentual fixo do Orçamento e possa se programar. Hoje existe uma negociação no âmbito dos três Poderes e o Executivo sempre leva a melhor', diz Lewandowski.

É o caso de São Paulo. Celso Limongi, desembargador-presidente do Tribunal de Justiça paulista - o maior do País, com 1,8 mil juízes, 360 desembargadores e 45 mil servidores -, lamenta o corte de R$ 700 milhões no Orçamento de 2007. O TJ pediu R$ 4,7 bilhões, vai ficar com R$ 4 bilhões. 'Fizemos uma previsão muito realista, infelizmente o governo cortou.'

O sonho de Limongi é tornar a Justiça mais aberta, com atendimento 24 horas. 'Tenho de fazer os fóruns trabalharem à noite. São muitos processos.'

TETO

O artigo 20 da Lei de Responsabilidade Fiscal é alvo da promotoria. A norma estabelece para o MP teto de 2% sobre a receita corrente líquida.

Os promotores reconhecem que a Lei Fiscal é fundamental para conter abusos de políticos, mas fustigam o artigo que limita seu quinhão em 2%. 'É inconstitucional, porque a Carta prevê autonomia orçamentária ao MP', adverte o procurador José Carlos Cosenzo, presidente da Associação Nacional dos Membros do MP.

Os promotores apelaram ao STF com uma ação de inconstitucionalidade. 'O MP deve fazer seu Orçamento de acordo com seus interesses e necessidades', sustenta Cosenzo. 'Na média, as despesas do MP não ultrapassam 1,6% da receita.' Em alguns Estados, porém, o teto de 2% estoura, atingindo os 4%.'Em São Paulo, o MP consome cerca de 1,2% da receita, mas há Estados do Norte e do Nordeste em que chega agosto e o dinheiro já acabou. Os procuradores-gerais têm de recorrer aos governadores e a independência do Ministério Público fica muito comprometida.'