Título: Mudanças na diretoria do BC são 'especulações naturais', diz Meirelles
Autor: ANDRÉ PALHANO, VERA ROSA E GUSTAVO FREIRE
Fonte: O Estado de São Paulo, 08/11/2006, Economia & Negócios, p. B4

Presidente do BC não confirma saída de diretores; para ele, instituição tem de 'manter inflação na meta'

O presidente do Banco Central (BC), Henrique Meirelles, classificou ontem como 'especulações naturais' as notícias publicadas no Estado sobre a suposta troca de diretores do BC para o segundo mandato do presidente Lula. 'Não há nada nesse sentido', enfatizou Meirelles, acrescentando que, no momento em que houver definições do presidente da República sobre a composição do governo, 'veremos com os diretores quais são os planos de cada um'.

Ao ser questionado sobre a produção industrial de setembro, Meirelles disse que 'não se deve dar maior atenção a dados pontuais mensais'. Segundo ele, o importante é observar a tendência, que, segundo ele, é de crescimento, como mostram por exemplo, os dados mais recentes de demanda agregada da economia. 'As condições estão dadas para um crescimento maior', sublinhou. Assim como tem feito nas últimas palestras e entrevistas, o presidente do BC destacou que este maior crescimento esperado não virá com mais inflação. 'É importante que possamos discutir o crescimento, sem que isso signifique comprometer conquistas que já fizemos, como a estabilidade. Não vamos inflacionar a economia', reiterou.

Segundo Meirelles, é necessário que se faça uma distinção da função de cada órgão governamental nesse processo de crescimento mais acelerado. 'A função do BC é a de manter a inflação na meta, levando a uma queda dos prêmios de risco e a uma redução dos juros de longo prazo. É preciso que saiamos de vez do dilema do passado entre inflação e crescimento.'

'SOLUÇÃO NEGOCIADA'

Na esteira da discussão sobre crescimento econômico, o presidente Lula quer construir uma 'solução negociada' com o presidente do BC para mudar alguns diretores da instituição. Já se sabe que um dos cotados para deixar o BC, no fim de dezembro, é o diretor de Política Econômica, Afonso Bevilaqua.

Ortodoxo e considerado 'linha dura' pelo governo, Bevilaqua já esteve várias vezes na 'marca do pênalti', especialmente no ano passado, mas Meirelles conseguiu segurá-lo no cargo. O diretor é um dos nomes apontados no Planalto como 'burocrático' e 'tecnocrata'. No diagnóstico do grupo desenvolvimentista da Esplanada, cria entraves para o crescimento. Bevilaqua sempre foi identificado pelo Planalto como líder da ala conservadora do BC, contrário à queda mais acelerada dos juros. Age, porém, sob a chancela de Meirelles, que Lula pretende manter no comando da instituição, ao menos no primeiro ano do segundo mandato.

Em conversas reservadas, o presidente tem dito que Meirelles 'segurou o rojão' nos momentos difíceis do governo e não planeja descartá-lo. É muito grato ao trabalho do comandante do BC. Observa, no entanto, que pretende entrar em entendimento com ele para alterar parte da diretoria do BC.

Em 2002, após ser eleito deputado federal mais votado pelo PSDB de Goiás, Meirelles só aceitou a missão de trocar o certo pelo duvidoso depois de obter garantias de Lula de que teria 'plena autonomia' para montar sua equipe.

'O presidente não fará nada sem consultá-lo', assegurou ontem um interlocutor de Lula. 'Mas realmente ele já disse que há, no Banco Central, alguns diretores que não entendem nada de 'povo', são burocráticos, tecnocratas e só pensam em viés de alta e viés de baixa.' Figuram no time dos conservadores do BC, ao lado de Bevilaqua, os diretores Rodrigo Azevedo (Política Monetária), Mário Mesquita (Estudos Especiais) e Paulo Vieira da Cunha (Assuntos Internacionais), todos afinados com a linha da Pontifícia Universidade Católica (PUC) do Rio de Janeiro.