Título: Gasto público eficiente
Autor: Roberto Macedo
Fonte: O Estado de São Paulo, 16/11/2006, Espaço Aberto, p. A2

Este é o título de livro recém-lançado, organizado por Marcos Mendes, economista e consultor legislativo do Senado Federal, conhecido por estudos na área de Finanças Públicas, entre eles, alguns premiados. Foi também uma iniciativa do Instituto Fernand Braudel de Economia Mundial, associado à Faap.

É uma coletânea de 14 artigos escritos por 20 autores, um grupo que inclui nove professores e pesquisadores universitários e seis consultores dos quadros de carreira do Senado e da Câmara. Há também dois consultores independentes especializados em contas públicas, um economista do Banco Mundial, outro do BNDES e um consultor legislativo da Câmara dos Deputados que também é professor. Ou seja, combina-se o enfoque acadêmico com o de pessoas que vivem o processo legislativo e conhecem os meandros da burocracia e da política de Brasília.

Tem 475 páginas, mas há um resumo das 91(!) propostas que emergem das análises focadas nos temas centrais: a exagerada dimensão do gasto público no Brasil e a ineficiência com que é realizado. Assim, são voltadas para cortar ou conter esse gasto de forma seletiva e aumentar a eficiência do governo ao gastar. Segundo Mendes, para ¿fazer mais com menos recursos e priorizar programas públicos eficazes¿. E, ainda, para ¿quebrar os mecanismos que transformaram o Estado num instrumento de concentração de renda, de privilégios dos que têm acesso aos recursos públicos¿.

O livro é oportuno, pois cresce a percepção de que o Brasil está muito longe dos melhores desempenhos econômicos de sua história, e hoje come poeira na corrida mundial pelo crescimento do PIB. Nesse desempenho melancólico se percebe também que o Estado se tornou uma carga demasiado pesada e ineficiente para a economia, comprometendo esta no seu funcionamento.

As propostas assim se agrupam: reduzir as despesas obrigatórias, instituir uma política de pessoal de longo prazo, conter também a despesa do Legislativo (inclusive do Tribunal de Contas), do Judiciário e do Ministério Público, reduzir e racionalizar as transferências a Estados e municípios, redirecionar para investimentos os recursos distribuídos a Estados e municípios a título de ¿royalties¿ sobre exploração de petróleo, estimular a formação de consórcios intermunicipais, aperfeiçoar e implementar plenamente a Lei de Responsabilidade Fiscal (LRF), tornar o orçamento mais realista e transparente, com equilíbrio fiscal sem necessidade de contingenciamento, modificar a ação do Tribunal de Contas da União para enfatizar o aspecto gerencial mediante auditorias voltadas para a eficiência dos programas em andamento - e não apenas para a legalidade formal das contas -, ampliar o uso do pregão eletrônico nas compras governamentais e reduzir os custos de campanha e o uso do gasto público com finalidade eleitoral.

Assim, há esses detalhes que escapam às análises usuais limitadas à visão macroeconômica do setor público, a qual enfatiza a carga tributária, o total dos gastos, o déficit e a dívida, e ignora os aspectos microeconômicos e gerenciais indispensáveis à tomada de medidas corretivas.

Todos os capítulos são interessantes, e destaco três para mostrar a importância do conjunto. O que trata da LRF tem entre seus autores dois conhecidos analistas das contas governamentais, José Roberto Afonso e Amir Khair, com história de militância ligada a partidos distintos (PSDB e PT, respectivamente). Isso reforça as medidas que propõem para aperfeiçoar essa lei na qual foram depositadas grandes esperanças de melhor gestão fiscal. Entretanto, a LRF revelou brechas pelas quais maus gestores continuam a escapar de seu crivo, como a falta de regulamentação e efetivo funcionamento do Conselho de Gestão Fiscal para definir critérios que evitem a ¿contabilidade criativa¿ desses gestores. Por exemplo, é preciso redefinir o conceito de ¿restos a pagar¿ para evitar as manobras de cancelamento, ao final de mandatos, de despesas já empenhadas, cujo ônus acaba sobrando para sucessores.

Outro artigo a destacar é do próprio Marcos Mendes, que aponta o forte crescimento das despesas dos Poderes que não o Executivo, no qual se concentra a maioria das análises de aumento de gastos. E, ainda, o de Alexandre Rocha, que propõe a referida modificação para o papel do Tribunal de Contas da União, aplicável também aos estaduais e municipais, para alcançar também a avaliação da eficiência de gestão dos governantes. Como outros, são assuntos importantes que não vêm recebendo a devida atenção da literatura e da imprensa.

O livro não discute a viabilidade política de suas propostas, enfatizando que o papel dos autores é apresentá-las, pois ficariam muito limitadas se previamente selecionadas por esse critério. Entendo que também é difuso, e que a quem cabe cuidar dessa viabilidade é a classe política. Dentro da nossa tradição carente de estadistas, ela só reage sob pressão, e é lamentável que ainda não tenha acordado efetivamente para a imperiosa necessidade de conter os gastos públicos e aprimorar-lhes a eficiência. Entretanto, uma grande pressão já se acumula nessa direção por conta do fraco crescimento da economia. Como no caso da inflação, em algum momento medidas corretivas se imporão ou por um surto de clarividência dos políticos e/ou pela imperiosa necessidade ditada pelo contínuo agravamento dos problemas que elas pretendem solucionar.

Assim, companheiros autores do livro, sua contribuição é bem-vinda e ajuda muito numa luta que continua. Quanto ao companheiro Lula, que reivindicou dos eleitores que fosse deixado a trabalhar, aí está uma agenda para quem de fato quiser fazer isso por um futuro bem melhor para o País.