Título: Venezuelano vive em guerra com meios de comunicação
Autor: Denise Chrispim Marin
Fonte: O Estado de São Paulo, 14/11/2006, Nacional, p. A4

TVs privadas só dão espaço a críticos do governo; aTV estatal, aos que apóiam o presidente

Hugo Chávez vive em pé de guerra com os meios de comunicação. As emissoras de TV costumam ceder generosos espaços aos políticos da oposição e a analistas críticos ao governo, e pouca ou nenhuma oportunidade aos defensores do presidente. Algumas emissoras de rádio também seguem essa linha, embora não todas. Os dois principais jornais, El Nacional e El Universal, já são bem mais equilibrados, procurando dar espaço a todas as posições - embora seus artigos de opinião sejam em geral críticos ao governo.

Durante a tentativa de golpe contra Chávez, em abril de 2002, seus partidários atacaram edifícios de emissoras de TV. Os jornalistas não podiam sair às ruas. As TVs e a maioria das rádios não noticiaram a reação de ministros, parlamentares e militares leais a Chávez, que retomaram o Palácio Miraflores. Apenas uma emissora de rádio, vinculada à Igreja Católica, que tinha um repórter dentro do palácio, noticiou a reação oficialista. As TVs e rádios se justificaram dizendo que não tinham condições de segurança para trabalhar.

Nas eleições de dezembro do ano passado, algumas TVs se engajaram na campanha de boicote à votação, denunciando fraude. O Nacional e o Universal deram manchetes sobre o boicote. Uma coisa é engajar-se numa campanha; outra, noticiar o que está acontecendo. Chávez e seus auxiliares não fazem essa distinção. Naquela e noutras ocasiões, representantes do governo ameaçaram usar a Lei de Responsabilidade Social do Rádio e da Televisão (Resort), aprovada em 2004, que prevê a cassação das concessões de emissoras que veiculem mensagens consideradas impróprias por um órgão chamado Diretório de Responsabilidade Social, composto por 11 membros, dos quais 7 são nomeados pelo governo. Há poucos dias, Chávez voltou a lembrar as emissoras de que as suas concessões são públicas, e expiram em 2007.

Por outro lado, o governo usa abertamente a estatal Venezolana de Televisión (VTV) para veicular mensagens favoráveis a Chávez e atacar os seus adversários. A estatal só dá espaço para os que apóiam o governo, e exibe longas gravações de Chávez recitando poemas revolucionários, num culto à sua personalidade.

Durante a campanha do ano passado, a VTV exibia um videoclipe em desenho animado com María Corina Machado, diretora da Súmate, uma ONG que luta pela transparência política e liderou o boicote à votação. No clipe, ela se ajoelha diante do Tio Sam e recebe dele ordens e malas de dinheiro. A música diz que ela se vendeu e traiu a pátria. Isso porque a ONG recebeu US$ 53 mil do National Endowment for Democracy, um fundo suprapartidário do Congresso americano que financia projetos para fortalecer a democracia em todo o mundo. María Corina foi processada por 'traição' e poderia pegar até 28 anos de cadeia. Esse é o clima na Venezuela.