Título: Presidente do BC perde força no segundo mandato de Lula
Autor: Ribamar Oliveira
Fonte: O Estado de São Paulo, 30/10/2006, Nacional, p. H7
Cargo voltará a ser subordinado à Fazenda; banco perderá independência para decidir sobre política monetária
No segundo mandato do presidente Luiz Inácio Lula da Silva, o presidente do Banco Central ficará novamente subordinado ao Ministro da Fazenda, segundo fontes governamentais. Esta mudança significará que o presidente do BC não terá mais, como ocorre atualmente, independência para decidir sobre a política monetária sem ouvir sequer as opiniões do seu superior hierárquico. Ele não terá também um canal direto com o presidente Lula, mas por meio do ministro da Fazenda.
A avaliação feita hoje no governo é que, por várias circunstâncias, o Banco Central terminou ganhando, no primeiro mandato de Lula, uma independência de fato e não uma autonomia operacional para atingir a meta de inflação fixada pelo Conselho Monetário Nacional (CMN). No segundo mandato, dizem as mesmas fontes, o presidente pretende deixar claro ao presidente do BC e a seus diretores a diferença entre autonomia operacional, necessária para a política de metas de inflação, e independência.
As críticas que mais se ouvem em setores do governo são dirigidas ao ex-ministro da Fazenda Antonio Palocci. Ele é acusado de ter assumido um compromisso com o atual presidente do BC, Henrique Meirelles, de dar independência total à instituição. De acordo com esses críticos, Palocci não tomava conhecimento sequer dos nomes que seriam indicados para a diretoria do BC e não se manifestava sobre a condução da política monetária.
A situação de completa independência ficou ainda mais caracterizada quando, com a saída de Palocci, o economista Guido Mantega assumiu o Ministério da Fazenda. Para permanecer no cargo, Meirelles exigiu não ter mais que se subordinar ao ministro da Fazenda, dadas as conhecidas divergências de Mantega com a política monetária, e abriu um canal direto de comunicação com o presidente.
Ainda não se sabe qual o nome que o presidente Luiz Inácio Lula da Silva escolherá para o Ministério da Fazenda, em seu segundo mandato. Mas há uma intensa articulação nos bastidores do governo pela permanência de Guido Mantega no cargo. O chamado ¿grupo desenvolvimentista¿ defende a permanência de Mantega, para conduzir uma política monetária, a partir de 2007, que permita queda mais rápida da taxa real de juro e um ritmo mais forte de crescimento da economia.
Segundo os mesmos informantes, Mantega tem apoio da ministra-chefe da Casa Civil, Dilma Rousseff, apontada como o nome mais forte do segundo mandato de Lula. A força de Dilma no governo está sendo comparada à do ex-ministro José Dirceu, em seus primeiros meses na Casa Civil, antes do escândalo envolvendo o seu assessor Waldomiro Diniz. Dilma será o ¿novo capitão do time¿, como observou uma fonte.
A questão a ser considerada, quando se procura avaliar os rumos da economia no segundo mandato, é que as contas da União só fecharão se a economia crescer 5% ao ano. Se o crescimento for menor, o presidente Lula terá de fazer aquilo que disse que não faria, na campanha eleitoral: cortar gastos. Mesmo com crescimento de 5%, algumas despesas terão de ser contidas, como os benefícios previdenciários, lembram os mesmos informantes.
Por isso, o esforço atual da equipe econômica é estudar medidas que ajudem o País a crescer fortemente nos próximos anos. É nesse sentido que uma redução mais rápida dos juros é considerada indispensável.
PROGRAMA ECONÔMICO
Alguns setores do governo e do PT consideram que os juros não cairão por um ato de vontade do presidente. Mas a avaliação é a de que uma mudança no perfil da atual diretoria do Banco Central poderá ajudar o governo a ter uma política monetária mais adequada ao rápido crescimento da economia.
Para ajudar a reduzir os juros, a idéia em discussão na área econômica prevê que o presidente da República apresente à Nação um programa econômico cujo centro será a fixação de um teto para as despesas. A partir desse teto, as despesas cairiam todo ano 0,1% do PIB em relação ao ano anterior.
Até mesmo a ministra Dilma Rousseff já estaria convencida da necessidade dessa medida. Segundo a proposta, o presidente dará garantia à sociedade de que as despesas para áreas essenciais, como educação e saúde, não terão cortes. Ao contrário, poderão até mesmo apresentar crescimento real nos próximos anos, desde que em porcentual inferior ao do Produto Interno Bruto (PIB). A proposta na mesa de discussão prevê aumento real para a saúde e para a educação equivalente ao crescimento da população, ou seja, de 1,5% ao ano.
Outras despesas, como é o caso dos salários do funcionalismo público, não terão correção e deverão cair em relação ao PIB. No caso do salário mínimo, um grupo importante de técnicos é favorável a que ele passe a ter apenas a correção pelo Índice Nacional de Preços ao Consumidor (INPC), como prevê a Constituição. Mas existe uma grande polêmica no governo e no próprio PT, pois há setores que consideram indispensável que, no segundo mandato, Lula continue com uma política de ¿recuperação¿ do valor do salário mínimo.
Ainda se discute no governo como será feito o programa: se por meio de uma emenda constitucional ou apenas por uma lei complementar. O governo vai aproveitar a discussão em torno da prorrogação da Contribuição Provisória sobre Movimentações Financeiras (CPMF) e do mecanismo que desvincula as despesas da União (conhecido na área técnica como DRU) para apresentar o programa.
Com relação à CPMF, praticamente há consenso de que a alíquota do tributo deverá cair ao longo dos anos, mas não há acordo sobre em que momento essa redução acontecerá. Alguns argumentam que será preciso coordenar a queda da alíquota da CPMF com a redução do superávit primário, que poderá cair antes do término do segundo mandato, segundo avaliações da área técnica.
No caso da DRU, a proposta em debate na área técnica prevê a ampliação da desvinculação dos atuais 20% para 30% ou 35% ao longo de alguns anos. O governo vai propor a criação de uma DRE e uma DRM, que desvincule também as receitas estaduais e municipais. Com isso, espera contar com o apoio de governadores e prefeitos.