Título: Detidos em maio já estão soltos
Autor: Eduardo Nunomura, Isabela Salgueiro
Fonte: O Estado de São Paulo, 06/08/2006, Nacional, p. A8

Delação premiada livrou da prisão os donos da Planam, principais envolvidos no esquema de R$ 110 milhões

O leitor deve estar se perguntando: no que vai dar essa tal Operação Sanguessuga? E a CPI? Alguém vai ser punido? Quarenta e sete pessoas foram presas no dia 4 de maio e hoje, três meses depois, todas já estão soltas e uma continua foragida. "É difícil, há uma tradição de não deixar ninguém preso", comenta o procurador da República Mário Lúcio Avelar, um dos responsáveis pela investigação da máfia dos sanguessugas. Trata-se, contudo, de uma impunidade só aparente. O volume de informações, provas e evidências já colhidas por Avelar, pelo juiz Jeferson Schneider e pelo delegado da Polícia Federal Tardelli Boaventura é suficiente para punir chefes e membros da quadrilha, servidores, parlamentares e prefeitos.

O instrumento jurídico da delação premiada permitiu que os empresários da Planam Darci Vedoin, seu filho Luiz Antônio, o genro Ivo Marcelo Spínola Rosa e Ronildo Pereira Medeiros, integrante da máfia, fossem soltos. Como contaram o que sabiam, detalhando ricamente o funcionamento do esquema fraudulento da compra de ambulâncias, vão ter suas penas reduzidas de um terço a dois terços. Os Vedoin responderão por formação de quadrilha, corrupção ativa, fraude em licitações e lavagem de dinheiro. Somando, algo entre 8 e 30 anos de pena para cada um, com a ressalva de que cometeram "alguns deles (os crimes) múltiplas vezes". O restante da máfia, cerca de 30 pessoas, foi solto porque ou tinha papel irrelevante ou obteve habeas-corpus. Só Sinomar Martins Camargo está foragido - ele representava a Planam em alguns Estados. "Todos vão ser condenados, tenho absoluta certeza", declara o procurador Avelar.

Batizada de sanguessuga, a operação da PF foi a 29ª deste ano. Quando foi deflagrada, poucos apostariam no que estava por vir. Foram presos dois ex-deputados e oito assessores de parlamentares, sabia-se que o esquema atuava com emendas do orçamento e envolvia a compra de mais de mil ambulâncias, numa fraude que chegava a R$ 110 milhões para os cofres federais. Durante 2005, a PF grampeou os membros da máfia, reunindo material suficiente para 140 inquéritos. Mas pelas gravações revelou-se que as prisões eram só uma pequena parte da quadrilha. O câncer estava instalado no Congresso.

As confissões dos Vedoin removeram suspeitas de que só assessores haviam induzido parlamentares a praticar delitos. Eles eram parte interessada no golpe. A proposta era simples como coordenadas cartesianas: a Planam tinha interesse em vender ambulâncias a preços superfaturados, prefeitos e parlamentares queriam participar do esquema mediante propina e no Ministério da Saúde pressões e influências políticas permitiam liberação de recursos. De uma lista original de 15 inquéritos no Supremo Tribunal Federal envolvendo parlamentares, saltou-se para os atuais 57. Já na CPI dos Sanguessugas são investigados hoje 87 deputados e 3 senadores.

A maioria alega inocência e disputará as eleições. A CPI deve apresentar seu relatório esta semana, mas os acusados só deverão ser julgados após as eleições. Para os que não forem julgados, mas se reelegerem, o processo pode continuar em 2007. Já o delegado Boaventura, que chefia a força-tarefa da PF , deve concluir os inquéritos em pouco mais de dois meses. Na área criminal, as chances dos acusados são mínimas