Título: Balanços de bancos já alertam para o avanço do calote
Autor: Renée Pereira
Fonte: O Estado de São Paulo, 06/08/2006, Economia, p. B3

Provisões para cobrir créditos de liquidação duvidosa aumentaram 65,7% em relação a 2005

Renée Pereira

Apesar dos lucros recordes, os primeiros balanços referentes aos resultados dos bancos no primeiro semestre deste ano trazem um alerta para a economia brasileira: o índice de inadimplência está em alta e ninguém garante que vai parar por aí. Exemplo disso é que as provisões para devedores duvidosos deram um salto de 65,7% em relação a igual período do ano passado, de R$ 4,46 bilhões para R$ 7,38 bilhões. Na média, os atrasos acima de 60 dias subiram de 2,1%, em 2005, para 3,3%, em 2006, segundo levantamento da agência de classificação de risco, Austin Rating. Em 2004, o índice estava em 1,5%.

Na avaliação de especialistas, esse é o resultado da estratégia dos bancos de crescer num nicho de mercado mais arriscado, como é caso do crédito para pessoa física e para micro, pequenas e médias empresas. Apesar do risco de inadimplência ser maior, o retorno é superior ao das demais modalidades de empréstimos, afirma o presidente da Austin Rating, Erivelto Rodrigues. ¿Além disso, eles aumentaram as provisões e formaram um colchão para garantir o aumento das operações.¿

Ele diz que os lucros maiores dos bancos nos últimos anos devem-se exclusivamente ao aumento do crédito no mercado e das receitas de prestação de serviços por causa da elevação das tarifas. ¿Com a tendência de queda e as últimas reduções da taxa Selic (hoje em 14,75%), a remuneração dos títulos públicos diminuiu. Isso fez com que os bancos mudassem o mix de crédito para ganhar dinheiro com clientes de maior risco.¿ Além disso, as empresas passaram a apostar no mercado de capitais para se financiar.

Segundo o presidente da Associação Nacional das Instituições de Crédito, Financiamento e Investimento (Acrefi), Erico Ferreira, os empréstimos têm crescido acima de 30%. Em 2004 avançaram 33% e no ano passado, 38%. A expectativa neste ano é de que subam 25%. ¿Isso não significa que está crescendo menos. É que não dá para manter o mesmo ritmo todo ano, já que a base é mais forte.¿ Para o executivo, ainda há espaço para crescer. Ele cita a participação de 33% do crédito no Produto Interno Bruto (PIB), que ainda está longe da média de muitos países em desenvolvimento. Na avaliação dele, com taxa de juros menor, mais pessoas são incentivadas a entrar no mercado, já que o País tende a crescer e a renda, a melhorar.

Por enquanto, porém, alguns bancos dão sinais de que vão puxar o freio de mão no crédito para conter a inadimplência. O analista João Augusto Salles, da consultoria Lopes Filho, lembra que no resultado do Itaú, que saiu na semana passada, a instituição mudou o planejamento de abertura de lojas da financeira Taií. Eles previam chegar ao fim de 2006 com 940 unidades. O número foi revisto para 900. Isso porque o índice de inadimplência de pessoa física subiu de 6,5% para 7,1%.

Segundo Ferreira, da Acrefi, quase todos as modalidades de crédito tiveram aumento no atraso dos pagamentos. Até os empréstimos consignados, com desconto na folha de pagamento. O motivo, explica, é que a morte de idosos está acima das previsões dos bancos.

Apesar de acreditar no contínuo aumento do crédito, ele reconhece que as instituições estão sendo mais rigorosas na concessão de empréstimos e financiamentos. ¿Não há uma resposta mágica para reduzir a inadimplência, mas a instituição do cadastro positivo ajudaria bastante.¿ Segundo Salles, da Lopes Filho, essa escalada da inadimplência já era esperada. ¿As instituições têm de encontrar o ponto de equilíbrio entre risco e retorno. A margem de pessoa física é muito alta, mas a inadimplência não pode crescer mais que a carteira de crédito.¿

O analista do Instituto de Ensino e Pesquisa em Administração Edson Carminatti diz que o mercado está se adequando a uma nova situação, que é o empréstimo para consumidor de maior risco. ¿Vejo os índices em queda.¿ Para Rodrigues, da Austin Rating, apesar do calote, os bancos estão ¿em céu de brigadeiro¿. ¿O spread (diferença entre custo de captação e de empréstimo) compensa o risco.¿