Título: Sérgio Cabral tem 68% dos votos no Rio e a maior vitória no 2º turno
Autor: LUCIANA NUNES LEAL, FABIANA CIMIERI
Fonte: O Estado de São Paulo, 30/10/2006, Nacional, p. H20

Candidato do PMDB derrotou Denise Frossard, do PPS; parceria entre governo federal e estadual é inédita

O senador Sérgio Cabral Filho, de 43 anos, do PMDB, manteve o favoritismo registrado durante toda a campanha e foi eleito governador do Rio, com 68% dos votos válidos. A deputada Denise Frossard (PPS) teve 32%. O segundo turno foi marcado pela grande proporção de votos nulos e brancos. A soma dos dois - 16,2% - é 5,4 pontos porcentuais maior que no primeiro turno, quando Cabral obteve 41,4% dos votos válidos e Denise, 23,7%.

A eleição de Cabral consolida uma vitória importante para o PMDB governista e inaugura uma parceria entre governo estadual e federal que há muitos anos não se via no Estado. Aliado do presidente Luiz Inácio Lula da Silva no segundo turno, Cabral diz que a aproximação beneficia o Rio.

À noite, com a vitória já confirmada, Cabral definiu sua tarefa a partir de 1º de janeiro: arrumar a casa.

Apesar de ser o candidato da governadora Rosinha Garotinho, Cabral disse ontem que tem muitas mudanças para fazer. A principal delas, reduzir a estrutura de governo e cortar secretarias. ¿Será o governo do Sérgio Cabral¿, avisou o governador eleito ao ser perguntado se sua vitória poderia ser traduzida como o triunfo da continuidade, como definira pela manhã o ex-governador Anthony Garotinho.

Cabral chegou ao comitê central de sua campanha, em Jacarepaguá, na zona oeste do Rio, às 19h30, sob o aplauso de correligionários. Uma festa para 4 mil pessoas foi organizada com direito a bateria de escola de samba, chope e salgadinhos.

O governador eleito discursou para o grupo em cima de um trio elétrico, agradecendo em primeiro lugar a Deus pela eleição. Em seguida, agradeceu à população do Rio pela confiança e à família, especialmente à mulher, Adriana, que estava ao seu lado. Ele também fez agradecimentos a Lula, seu aliado no segundo turno.

Cabral contou que recebeu telefonemas de Lula e do governador de Minas Gerais, Aécio Neves (PSDB), no início da noite. O governador eleito disse que pretende unir-se a Aécio no movimento para superar a crise política ajudando a criar uma agenda propositiva para o País. ¿Acho que é a hora de o Brasil encontrar um caminho. Estabelecer um pacto. Estarei ao lado do governador Aécio Neves nessa direção, que é a de uma agenda propositiva. O Brasil sai das urnas com o desejo claro desse entendimento.¿

Cabral disse ainda que pretende se inspirar em Aécio também na formação do que chamou de ¿modelo enxuto de transição¿e apresentou quatro colaboradores que foram designados para a missão, entre eles o vice-governador eleito, Luiz Fernando Pezão, e o suplente que assumiu sua cadeira no Senado, Régis Fichner. A equipe começará a trabalhar no dia 8 de novembro, na Fundação Getúlio Vargas, em Botafogo, onde contará com a assessoria de técnicos da instituição.

Na manhã da terça-feira, ele leva os nomes da equipe de transição à governadora Rosinha Garotinho. Em seguida, viaja para Brasília, onde vai se encontrar com Lula. Na quarta-feira, Cabral quer visitar o prefeito Cesar Maia (PFL), que apoiou a sua adversária, Denise Frossard. ¿Nossa intenção é fazer o governo do diálogo, do entendimento, objetivando o bem comum e o benefício da população. Homens públicos precisam ter maturidade para colocar isso em primeiro lugar.¿

`PENDURICALHOS¿

Cabral não quis adiantar nomes para o secretariado. Ele disse que essa decisão dependerá do levantamento de informações sobre o Estado e o reordenamento que pretende fazer nas secretarias. ¿Vamos desarmar todos os penduricalhos.¿

Aliados antigos e de última hora passaram pelo comitê para parabenizar o novo governador, como o senador eleito Francisco Dornelles (PP) e a ex-governadora Benedita da Silva (PT), coordenadora da campanha do presidente Lula no Rio. Garotinho e Rosinha permaneceram em Campos dos Goytacazes, no Norte Fluminense, onde votaram ontem.

MÃO DUPLA

Na avaliação do cientista político Charles Pessanha, da UFRJ, o eleitor fluminense foi sensível à ligação entre o peemedebista e o presidente petista. ¿O Rio tradicionalmente é oposição ao governo federal e isso tem causado prejuízos ao Estado. Vi nas ruas uma sustentação do pessoal do Cabral em favor da candidatura do Lula, que passou a ter palanque no Rio. Em geral, o político carioca é muito pouco centrado nas questões regionais, mas o Sérgio Cabral parece mudar essa tradição. Acredito que a aliança de Lula e Cabral tenha sido uma ajuda de mão dupla.¿

Ao votar, ontem, Cabral insistiu nas vantagens da parceria com Lula. ¿Tudo que o Rio de Janeiro precisa é de um governador que se entenda com o governo federal.¿ Para Cabral, o Rio vai se beneficiar com obras de infra-estrutura, como a prometida Linha 3 do metrô. ¿É no cotidiano do repasse de verbas, no entendimento dos ministros com os secretários que essa aliança tem importância capital¿, afirmou, com o filho Tiago, de 4 anos, sentado em suas costas.

No cenário político nacional, Cabral faz do Estado o principal governo do PMDB e marca uma derrota para o prefeito do Rio, estrategista da campanha de Frossard. Surpreendido com a necessidade de segundo turno quando as pesquisas, a menos de um mês da eleição, indicavam vitória em 1º de outubro, Cabral foi beneficiado por uma ampla aliança e, ao mesmo tempo, pela crise instalada na campanha da adversária.

Frossard reagiu ao apoio do ex-governador Anthony Garotinho e da governadora Rosinha ao candidato do PSDB à Presidência, Geraldo Alckmin, aliado da deputada no primeiro turno.

Chegou a ameaçar votar nulo e depois recuou. A candidata do PPS não conseguiu adesões de peso e foi prejudicada nos debates ao transmitir a impressão de não conhecer bem o Estado. Situação contrária à de Cabral, que construiu alianças com Lula, com três candidatos derrotados no primeiro turno - Marcelo Crivella (PRB), Vladimir Palmeira (PT) e Eduardo Paes (PSDB) - e com o senador eleito Francisco Dornelles (PP), além de setores do PV e do PDT.

`ESQUECI¿

Ao votar, ontem, Frossard cometeu um ato falho: deixou de escolher o presidente. Votou em si mesma e saiu da cabine, fazendo o ¿V¿ da vitória. Foi chamada pela mesária. ¿Esqueci de votar para presidente¿, disse a candidata antes de retornar à urna para completar a votação. Ela garantiu o voto em Alckmin. ¿Achei que o Alckmin já tinha ganho no primeiro turno. Foi um reflexo¿, despistou, para justificar o esquecimento.

O professor da PUC-Rio Cesar Romero acredita que o resultado no Estado expressa o efeito de uma frente anti-Cesar Maia. ¿Denise, na verdade, representa Cesar Maia e se ela ganhasse, a prefeitura da capital e o governo do Estado estariam com o mesmo grupo. Não interessa às outras forças esse domínio único¿, diz Romero.

CONTRAPARTIDAS

Com aliança tão ampla, Cabral terá de acomodar os parceiros no secretariado. Embora diga que não loteará o governo, o peemedebista sabe que os apoios não são gratuitos e os aliados esperam a contrapartida. Um dos possíveis integrantes do governo é a petista Benedita da Silva, ex-governadora e coordenadora da campanha de Lula.

Benedita, que aderiu fervorosamente à campanha de Cabral no segundo turno, foi pisoteada por eleitores em corpo a corpo em São João de Meriti e quebrou os dedos dos pés. Nem esse contratempo, porém, impediu que a petista acompanhasse o peemedebista ontem. Com as duas pernas enfaixadas, ela teve de andar devagar e amparada por assessores