Título: Não deixe o investimento para amanhã
Autor: Milton F. da Rocha Filho
Fonte: O Estado de São Paulo, 06/08/2006, Economia, p. B6

Empresário aconselha seus colegas a buscar já novas oportunidades nas exportações e também no mercado interno

Milton F. da Rocha Filho

O empresário Antonio Ermírio de Moraes, 78 anos, presidente do Conselho de Administração do Grupo Votorantim, aconselha seus colegas empresários a investir agora no País. Para ele, todos devem buscar oportunidades nas exportações, ¿que continuam indo muito bem¿, e no mercado interno, ¿que já reage com o aumento das compras por parte dos brasileiros¿. ¿Meu conselho é que invistam mesmo, não deixem para amanhã. Falo isto com experiência. Nós tentaremos investir muito bem agora, procurando novas oportunidades no futuro¿, disse Antonio Ermírio, em entrevista exclusiva ao Estado, concedida no 7º andar da sede do grupo, no centro de São Paulo.

O Grupo Votorantim tem projetos em andamento em praticamente todos os setores em que atua, afirmou o empresário. Muitas outras empresas, constata, estão fazendo o mesmo. ¿O Brasil de hoje é mais forte do que o de antigamente e seus produtos têm condições de competitividade no exterior. Precisamos continuar baixando os juros internamente e gerar mais trabalhadores especializados¿, afirmou. ¿Também não acredito na volta da inflação, ou de alguma explosão de preços. Tenho certeza de que vamos precisar mais de mão-de-obra especializada. Não há outra saída.¿

Apesar de manter o otimismo, Antonio Ermírio não deixa de apontar problemas na economia do País. Avalia, por exemplo, que o programa de geração de energia elétrica ¿é tímido¿. Na sua opinião, deveria ser mais agressivo, ¿sob pena de o País sofrer algum gargalo no momento em que estiver crescendo de 4% a 5% ao ano¿. Em 2006, ele acredita que o Brasil crescerá pouco mais de 4%.

A seguir, os principais trechos da entrevista:

Alguns setores industriais estão chegando ao seu limite de capacidade instalada, o que pode produzir inflação de demanda e redução nas exportações. Como o sr. vê essa situação?

Está na hora de voltar a investir, expandir a produção. Meu conselho para os empresários é que continuem fazendo seus investimentos até de forma pesada. Não tenho dúvidas ao dar esta receita. Este é o momento para investir. Nós estamos fazendo isso. É muito importante que o Brasil volte a crescer de forma sólida e sustentável, com liberdade e democracia. Outros países considerados em desenvolvimento não possuem esta liberdade ou a democracia, como temos aqui. Precisamos deixar de representar cerca de 1% do comércio internacional. Temos de ter ousadia e exportar mais, procurar desenvolver o mercado interno com muita força. Se exportamos, criamos empregos, melhores salários e, com isso, o mercado interno também se desenvolve.

O problema fiscal do Brasil terá de ser cuidado com mais atenção no próximo governo, para que se tenha mais sustentabilidade no desenvolvimento?

Sem dúvida. O governo vai ter de ajustar a questão fiscal, adequando a economia a uma realidade mais verdadeira para o País. O Brasil tem de crescer mais de 4% a 5% ao ano. Estamos crescendo pouco para as necessidades de geração de emprego que possuímos.Temos de procurar ver o que os países mais evoluídos fazem. Temos de fazer as alterações necessárias para a economia se desenvolver mais tranqüilamente, com juros menores e estabilidade. Por isso o sr. fez a peça de teatro `Acorda Brasil¿? Não há dúvidas de que está na hora de o Brasil acordar, ter um sistema de educação mais forte, que supra suas necessidades e do seu povo.

Como fazer isso?

A educação é essencial. Temos de preparar a mão-de-obra especializada que tanto necessitamos. Podemos paralisar um processo de crescimento por falta de mão-de-obra especializada. O brasileiro precisa de escolas para aproveitar a inteligência que possui. Tenho repetido isso ao longo dos anos. Repito aqui mais uma vez.

E no setor de energia elétrica, o que falta?

No momento, vemos no Brasil falta de vontade no setor. O Brasil tem potencial hidrelétrico enorme. Só a Rússia tem essa condição. Se quiser crescer, o País precisa de muita energia elétrica. E, no momento, os projetos são poucos, infelizmente. Estamos arriscados a ter um apagão no futuro por causa dessa falta de agilidade. O futuro deve ser pensado hoje, por isso entendo que os investimentos em energia elétrica deveriam encontrar mais apoio na sociedade de uma forma geral. A China, que está crescendo, precisa de energia. Hoje faz a Hidrelétrica de Três Gargantas, e tem muito pouco a fazer a partir de agora. Ela sente que haverá falta de energia para o seu desenvolvimento. Se o Brasil quiser crescer, precisa pensar em utilizar o seu potencial energético.

Como o sr. analisa o programa energético do Brasil e a sua legislação?

O plano é muito tímido. O Brasil tem de desenvolver seu plano de construção de hidrelétricas. Com a criação dos lagos das hidrelétricas, pode-se criar peixes. Precisamos aproveitar o potencial que Deus nos deu. Estamos perdendo tempo. É preciso mais coragem e ousadia para transformar este País numa nação desenvolvida, com participação de todos. Fico triste quando vejo que estamos perdendo tempo, com a timidez com que se age no setor elétrico, na aprovação de novos projetos energéticos que têm como base a hidreletricidade.

O que o sr. acha dos planos alternativos de geração de energia?

Acho muito bom, mas representam muito pouco em termos de geração. A energia eólica é simples, mas não dá para atender nossas necessidades. A energia do mar também existe, mas é cara. O que precisamos é desenvolver nosso potencial hidrelétrico, o que significa sonhar com os pés no chão. Isto é fundamental. É preciso que isto comece agora. Eu talvez não veja, mas os jovens de hoje verão um Brasil forte.

Como o sr. vê o Congresso hoje, com uma série de denuncias sérias como as levantadas pela CPI dos Sanguessugas, Polícia Federal e Justiça do Mato Grosso?

Acho que as eleições de outubro darão a oportunidade aos brasileiros de renovar o Congresso, procurando gente que tenha seriedade e competência. Ficamos tristes com o que ocorreu no Congresso nos últimos dois anos. Foi um tal de denunciar e depois se conseguir inocentar no plenário. Com um Congresso funcionando com honestidade e competência, só podemos evoluir. O brasileiro precisa escolher as pessoas certas.

Como o sr. vê as possibilidades dos candidatos para a presidência?

Que o eleito possa enxergar com clareza as grandes possibilidades do País. Acho que o Lula já observou os erros que cometeu na sua primeira administração e será inteligente para não repeti-los. Eu sou aqui de São Paulo e tenho simpatia pelo ex-governador (Geraldo) Alckmin, que realizou um bom governo por aqui. Ganhe quem ganhar, que pense muito no Brasil, no seu povo e no seu desenvolvimento.

O que o próximo governante poderá fazer de imediato para dar continuidade à estabilidade da economia?

Acho que o futuro governo deve rever nossa máquina burocrática, que é extremamente pesada, e que precisa se tornar mais leve. Este peso leva à prática de ilegalidades e da corrupção. Precisamos eliminar isso com um programa de desburocratização. A burocracia só causa entraves ao País, não só à economia. Temos de simplificar nossa máquina administrativa. Temos de simplificar mesmo. O futuro do Brasil é enorme, e tem uma grande perspectiva de evolução nos próximos 20 anos.

A economia continuará como é hoje, com um setor privado forte?

Sem dúvida alguma. Não voltaremos ao passado, pois o que foi privatizado deu certo. Basta comparar o comportamento atual de empresas que foram privatizadas com o anterior. Muitas companhias cumpriram com o seu papel desenvolvimentista como estatal, e depois pararam por falta de recursos. Como empresas privadas, melhoraram muito. Os próximos 30 anos serão os mais importantes para o desenvolvimento nacional. Quem ficar aqui verá que eu tenho razão. Por isso, repito meu conselho básico aos empresários: invistam, pensem no futuro.