Título: Anfavea defende corte em subsídios
Autor: Cleide Silva
Fonte: O Estado de São Paulo, 12/08/2006, Economia, p. B8

Depois do fracasso da Rodada Doha, a indústria automobilística brasileira decidiu liderar movimento de abertura do Brasil e demais países do Mercosul para facilitar acordos bilaterais. O setor, tradicionalmente protecionista, já admite que, mantendo a atual alíquota de importação de 35%, uma das mais altas do mundo, "significará a morte", disse a vice-presidente da Associação Nacional dos Fabricantes de Veículos Automotores (Anfavea), Elizabeth Carvalhaes.

Ela acredita que, para ser competitivo, o Mercosul precisa cortar a tarifa atual em 10 pontos porcentuais num prazo máximo de dez anos. "Aí chegaremos a um nível que dá para começar a negociar com outros grandes mercados". A proposta de baixar gradualmente o imposto de importação deve ser levada aos negociadores da União Européia em setembro, mês em que a Anfavea pretende agendar junto ao Itamaraty a retomada das negociações com o bloco europeu.

O fim de uma postura de aversão à abertura comercial foi manifestada por Elizabeth ontem a uma platéia de agentes dos governos do Brasil, Argentina, Paraguai, Uruguai e Venezuela, e de cerca de 200 empresários da área automotiva durante o primeiro congresso do setor de autopeças do Mercosul, realizado em Punta Del Este, Uruguai. Muitos dos empresários discordaram da posição da Anfavea por temerem que a abertura possibilite a entrada indiscriminada de produtos de outros países.

Para a executiva, que também dirige a Volkswagen do Brasil, mais do que a China, a grande preocupação deve ser os países do leste europeu, que receberam elevados investimentos e novas montadoras de todas as marcas. "O Brasil é especialista em carros compactos, mas precisa complementar sua produção com modelos médios e de luxo. É mais fácil fazer acordo com seus investidores", disse, referindo-se às matrizes de grandes montadoras brasileiras. "O melhor parceiro é o que comanda o dinheiro."

O secretário do Ministério do Desenvolvimento, Indústria e Comércio, Antonio Sergio Martins Mello, reforçou que o Brasil vem perdendo participação na produção mundial de veículos e que acordos com a UE e outras regiões como a África do Sul são fundamentais para o País e o Mercosul. Elizabeth afirmou ainda que não há espaço, na conjuntura atual, para conflitos entre membros do Mercosul. Durante o evento, realizado num luxuoso hotel no balneário, representantes do Uruguai e Paraguai reclamaram da pouca participação dos dois países nos negócios do bloco. "O Mercosul é um bloco bilateral, entre Brasil e Argentina, mas foi criado para ser multilateral", disse Roberto Álvarez Berro, da Câmara de Autopeças uruguaia.

Hoje, a produção conjunta dos quatro países e mais a Venezuela é de 3,1 milhões de veículos, sendo quase 80% da indústria brasileira e 13% da argentina. O Uruguai tem apenas duas montadoras de veículos especiais (caminhões e blindados) e o Paraguai não produz carros. Tem 7 fábricas de motocicletas, 5 delas chinesas e 2 indianas.

O presidente do Sindicato Nacional dos Fabricantes de Autopeças (Sindipeças), Paulo Butori, defende uma produção complementar no setor e a criação de uma política automotiva para o Mercosul. A indústria de autopeças dos quatro países fatura por ano US$ 35,5 bilhões, sendo US$ 28 bilhões no Brasil. "Precisamos empurrar mais a integração", afirmou. "Acordos mais amplos com outros blocos vão depender dessa integração", acrescentou o presidente da Anfavea, Rogelio Golfarb.