Título: Suicídios e assassinatos viram rotina entre os caiovás de MS
Autor: João Naves
Fonte: O Estado de São Paulo, 17/10/2006, Nacioanl, p. A15

Só no domingo, um jovem de 16 anos foi encontrado enforcado e um homem matou a sogra na reserva de Dourados, no sul do Estado; drogas e bebidas são apontadas como causas

João Naves

Um guarani-caiová de 16 anos foi encontrado morto anteontem na Reserva Indígena de Dourados, no sul de Mato Grosso do Sul. No dia 9, outro adolescente de 17 anos morreu numa aldeia vizinha na mesma reserva. Os dois cometeram suicídio, que, segundo a Fundação Nacional de Saúde (Funasa) - responsável pela saúde indígena no Estado -, é a causa da morte de pelo menos um índio por semana em Mato Grosso do Sul. Os crimes violentos também são freqüentes entre os índios sul-mato-grossenses - já foram quatro assassinatos apenas no mês de outubro, o último ocorreu no domingo.

Os números são alarmantes. De 1990 a 2000, foram registrados 278 suicídios de índios no Estado. Só nos últimos cinco anos (de 2001 a 2006), já ocorreram 300 suicídios. Na reserva de quase 3.500 hectares, vivem 11 mil índios.

A área fica a 5 quilômetros do centro de Dourados, o que torna o caminho mais curto para o consumo de bebidas alcoólicas e drogas, principalmente a maconha.

EM FAMÍLIA

Enquanto os policiais civis atendiam a primeira ocorrência no domingo - a do rapaz de 16 anos encontrado pendurado pela alça de uma bolsa em uma viga de sua casa -, chegava a notícia de um homicídio. Natália Benites, de 86 anos, foi achada morta na sua cama, com a cabeça esfacelada por pancadas desferidas provavelmente por corrente grossa de elos de aço.

A polícia prendeu o genro da vítima, de 62 anos, como o principal acusado. Ele contou que havia ingerido ¿muita cachaça¿ e não tinha a menor lembrança do que pode ter feito.

É o quarto assassinato de caiovás ocorrido este mês. Segundo dados do Conselho Indigenista Missionário (Cimi), em 2004, dos 37 índios assassinados em todo o País, 18 viviam em Mato Grosso do Sul. No ano passado, das 43 mortes entre indígenas no Brasil, 29 ocorreram no Estado.

TERRAS

Além do consumo de drogas e bebidas alcoólicas, as disputas por terra figuram como causa de homicídios.

A Aldeia Porto Lindo, que fica em Japorã, na divisa com o Paraguai, é uma das áreas de tensão no Estado. Em janeiro de 2004, os caiovás invadiram seis fazendas na região da aldeia e tomaram as propriedades dos fazendeiros.

No começo de junho deste ano, uma força-tarefa formada pelo Ministério Público Federal, pela Polícia Federal e pela Polícia Militar prendeu oito índios e fez uma varredura na Aldeia Porto Lindo, que abriga cerca de 4.500 caiovás-nhandevas.

Os presos foram identificados como responsáveis pelos conflitos ocorridos dias antes na área, quando cinco índios acabaram feridos por armas de fogo e outras rudimentares. O grupo detido também era suspeito de dois assassinatos.

Assim como na região de Dourados, em Japorã é alto o índice de consumo de drogas e suicídios entre os índios jovens. Outro problema recorrente nas aldeias de Mato Grosso do Sul são os casos de desnutrição de bebês e crianças.