Título: Congresso Brasileiro de Magistrados
Autor: Almir Pazzianotto Pinto
Fonte: O Estado de São Paulo, 11/08/2006, Espaço Aberto, p. A2

A Associação dos Magistrados Brasileiros (AMB) organizou o XIX Congresso Brasileiro dos Magistrados, que será levado a efeito entre 15 e 18 de novembro do corrente ano em Curitiba, para discutir o tema Desenvolvimento: uma questão de Justiça. Antecede a reunião minuciosa pesquisa, dirigida aos membros dos oito ramos em que se divide o Poder Judiciário, ativos ou aposentados. São 28 questões sobre assuntos variados, ¿todos relevantes e caros à magistratura brasileira¿, como afirma o material de divulgação. A partir das respostas, esclarece o prospecto, ¿em conjunto com as dos demais juízes de todo o Brasil, a AMB traçará parâmetros para sua atuação futura¿.

Aos magistrados se pede que se manifestem acerca da necessidade de legislação que proteja o trabalhador no que se refere às férias anuais, número de horas trabalhadas, piso salarial, repouso semanal remunerado, pagamento de horas extras, garantia de emprego e estabilidade, participação nos lucros ou resultados da empresa. São indagados, também, se concordam com a ¿adoção de financiamento público exclusivo das campanhas eleitorais¿, o ¿aumento das hipóteses de inelegibilidade¿, a ¿verticalização das coligações partidárias¿, o ¿voto facultativo¿. Há ainda perguntas relativas à maioridade penal e ao fornecimento gratuito de medicamentos dispendiosos pelo sistema público de saúde. Foram, também, formuladas 23 questões referentes à importância que têm, para o desenvolvimento nacional, fatores como instabilidade política, instabilidade legislativa, excesso de exigências burocráticas, extensão do papel do Ministério Público, legislação ambiental, alta carga tributária, morosidade do Judiciário, legislação trabalhista, corrupção, impunidade, etc.

Duas ausências chamam a atenção no rol de perguntas: a primeira, a respeito das contribuições que os magistrados poderiam oferecer para reduzir a angustiante lentidão das decisões judiciais; a outra, e talvez um pouco mais complexa, concernente à unificação das legislações processuais civil, trabalhista e fiscal.

Desenvolvimento é, sem dúvida, questão de Justiça. Outros fatores são, da mesma forma, indispensáveis, e um deles consiste na prestação jurisdicional rápida, objetiva, eficaz, equilibrada, calcada na Constituição e na lei e, sobretudo, informada pelo desejo de fazer justiça às partes.

Jônatas Milhomens, autor de conhecido Manual de Prática Forense, escreveu que ¿a teoria do direito é indispensável, pois esclarece os princípios gerais dos sistemas jurídicos. Mas a prática é a concretização desses princípios nos fatos da vida. O direito processual é essencialmente prático. Autores nacionais e estrangeiros teimam em classificá-lo como ciência ou arte. Não interessa aos fins desta obra dissertar a respeito. Certo, o direito processual tem os seus princípios científicos e pode ser tratado cientificamente, mas os seus fins são essencialmente práticos: a realização do direito objetivo¿.

Com ele parecem concordar outros renomados juristas. Pontes de Miranda, por exemplo, lecionou que a finalidade do processo é ¿aplicar a lei ao caso concreto¿. Para Moacyr Amaral Santos, ¿o meio pelo qual se faz atuar a lei à espécie é o que se chama processo. Este consiste numa série de atos coordenados, tendentes à atuação da lei, tendo por escopo a composição da lide¿. Para Frederico Marques, ¿é o conjunto de atos destinados à aplicação do direito objetivo a uma situação contenciosa¿.

A esse conjunto de atos, denominado devido processo legal, compete assegurar o contraditório e garantir o amplo direito de defesa, sem o que assumiriam características autoritárias, incompatíveis com a missão relevante do Poder Judiciário.

O processo judiciário do trabalho nasceu simples, fundado na concentração dos atos e na oralidade, e tinha como objetivo promover a conciliação entre as partes, quer na vigência, quer na extinção da relação de emprego. Sua matriz é o Código de Processo Civil (CPC), ao qual cada vez mais recorre em caráter subsidiário, ao ser constatada alguma omissão, e desde que não haja incompatibilidade. Para os trâmites e incidentes da execução, fonte subsidiária, ao lado do CPC, é a Lei de Execuções Fiscais.

O desaparecimento da representação classista, a extinção do poder normativo, as recentes alterações de competência provocadas pela Emenda nº 45 e a necessidade de recorrer a institutos que a Consolidação das Leis do Trabalho (CLT) desconhece, embora presentes no processo geral, fazem com que o rito trabalhista se assemelhe e se aproxime, cada vez mais, do processo comum. Tal circunstância obriga os operadores do direito do trabalho a recorrerem, simultaneamente, a três complexas legislações na busca daquilo que lhes parece ser a correta aplicação da lei material ao caso concreto.

Nenhuma razão de ordem científica ou social encontro para que se conservem três legislações processuais, independentes, mas interdependentes, em vigor. Bastaria uma, que imprimisse uniformidade a prazos, recursos e a todos os demais requisitos formais inerentes ao processo. O objetivo seria atender, de maneira simples e única, às necessidades de empregadores e empregados, pois são eles os principais protagonistas das relações de trabalho e os grandes interessados em justiça célere e econômica.

Como escreveu Jônatas Milhomens, ¿o direito processual é prático¿. Duas legislações sobre o processo de conhecimento, e três interferindo na execução, comprometem a praticidade e contribuem desnecessariamente para o agravamento da morosidade, que compromete a boa imagem do Judiciário, além de se converter em poderoso desestímulo a investimentos geradores de empregos.