Título: Sandinista tentou disfarçar laços com Chávez
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Fonte: O Estado de São Paulo, 07/11/2006, Internacional, p. A14

Daniel Ortega Saavedra, que completa 61 anos no sábado, procurou disfarçar seus vínculos com o presidente venezuelano, Hugo Chávez, durante a campanha eleitoral da Nicarágua, o segundo país mais pobre do continente - atrás apenas do Haiti -, com 5,5 milhões de habitantes. Também procurou atenuar o radicalismo dos tempos áureos da Frente Sandinista de Libertação Nacional (FSLN), dando um tom cor-de-rosa à sua campanha, em lugar do tradicional vermelho e preto sandinista, e substituindo o hino da frente ('Lutamos contra o ianque inimigo da humanidade') pela canção pacifista Give a Peace a Chance, de John Lennon. As palavras de ordem do sandinismo perderam o lugar para mensagens recheadas de referências religiosas, que teriam reaproximado o ex-líder rebelde marxista com a Igreja Católica.

Mas a embalagem 'Orteguinha Paz e Amor' tem sido vista como a pele de cordeiro que camufla o lobo guerrilheiro, cuja sede de poder dividiu e enfraqueceu a FSLN ao longo dos anos. A imagem de moderação se explica também por uma razão pragmática: desde o fim da União Soviética, mais da metade das receitas da Nicarágua provém de remessas enviadas por nicaragüenses que vivem no exterior e da ajuda de países estrangeiros. E Washington faz ameaças veladas de cortar a ajuda, caso um governo de Ortega se alinhe automaticamente com Chávez, o atual ícone do antiamericanismo no continente.

'Há um contexto muito diferente no mundo, que obrigará Ortega a atuar de um modo muito distinto do que quando esteve no poder pela primeira vez, entre 1979 e 1990', declarou o ex-embaixador da Nicarágua na ONU Carlos Tunnerman. 'Ele espera que os EUA lhes dêem ao menos o benefício da dúvida, após o esforço declarado de Washington para impedir sua vitória.'

Originário de uma família de classe média, Ortega entrou para a guerrilha em 1967 e pouco depois foi preso por um assalto a banco destinado a financiar as operações guerrilheiras. Libertado em 1974, ele passou vários anos em Cuba antes de ressurgir, em 1979, como líder da FSLN quando a guerrilha sandinista depôs o ditador Anastasio Somoza. Inicialmente, ele liderou a junta de governo que assumiu o poder no país. Em 1984, após eleições boicotadas pela oposição, tornou-se presidente da Nicarágua.

Deixou o poder depois de perder a eleição de 1990 para Violeta Chamorro. Tentou retornar à presidência nas duas eleições seguidas, mas acusações de corrupção e uma denúncia de sua enteada, Zoilamérica Narváez, segundo a qual Ortega teria abusado dela sexualmente, minaram a popularidade do sandinista.

Nos últimos anos, buscou alianças com antigos rivais da direita, como o ex-presidente Arnoldo Alemán, preso por desviar milhões de dólares do Estado para contas no exterior.