Título: Projeto de lei no Senado pode dificultar o acesso à internet
Autor: Renato Cruz
Fonte: O Estado de São Paulo, 07/11/2006, Negócios, p. B13

Com o objetivo de combater fraudes, um projeto de lei em tramitação no Senado pode dificultar o acesso à internet no Brasil. Ele exige a identificação do usuária a cada operação que exija interatividade. A Comissão de Constituição e Justiça deve votá-lo amanhã. 'O internauta precisaria ser validado pelo provedor', afirmou o senador Eduardo Azeredo (PSDB-MG), relator do projeto, que consolida várias propostas apresentadas por outros senadores. 'Para consultar alguma página, o usuário não precisará se identificar.'

Existe, de saída, uma dificuldade simples: como saber se o internauta consulta alguma informação ou se está engajado em alguma atividade 'interativa', como correio eletrônico, bate-papo ou download de música e vídeo. A princípio, toda a internet é interativa. Quando alguém consulta uma página, na verdade faz download de textos, fotos e até música e vídeo.

O projeto quer colocar o controle do usuário sob responsabilidade do provedor de acesso, que poderia ser punido com dois a quatro anos de reclusão. 'A lei escolhe um vilão, que é o provedor', afirmou o presidente de Associação Brasileira dos Provedores de Acesso, Serviços e Informações da Rede Internet (Abranet), António Tavares. 'Não posso concordar com leis que não sejam exeqüíveis.'

O grande problema de se legislar sobre a internet é que a rede é mundial. Nada impede que criminosos brasileiros usem provedores de outros países para praticarem seus delitos aqui. No fim, uma medida como a prevista pelo projeto afetaria principalmente cidadãos comuns. 'O bom usuário não terá trabalho a mais', garantiu Azeredo. 'Ainda é um projeto aberto.'

O internauta precisaria enviar seu nome, endereço, telefone, número da identidade e do CPF ao provedor, que funcionaria como fiscal. 'Isso provocaria a migração dos grandes provedores para outros países', alertou Tavares. Tecnicamente, não haveria empecilho para alguém atender usuários brasileiros a partir de outros lugares. Se transformado em lei, o projeto faria com que os provedores precisassem pedir cópias dos documentos dos usuários, o que dificultaria o acesso à rede em locais públicos e no trabalho.

'A comunidade quer mais segurança, para melhorar o comércio eletrônico, mas precisaria ser de uma forma racional', afirmou Cássio Vecchiatti, conselheiro do Comitê Gestor da Internet no Brasil, representante da comunidade de empresas usuárias. 'O projeto é uma colcha de retalhos.'

Existem alternativas ao registro do usuário. Cada computador que acessa a internet tem um endereço de protocolo de internet (IP, na sigla em inglês). O provedor consegue informar o acesso dos usuários a partir desse número. O controle de segurança poderia ser feito a partir dessa informação, que seria revelada com ordem judicial.

EXIGÊNCIAS

Cadastro: Todo usuário deverá se cadastrar, e caberá ao provedor verificar se as informações são verdadeiras. O internauta precisará fornecer nome completo, data de nascimento, número de identidade e endereço completo.

Registros: Os provedores precisarão manter os registros das conexões, com identificação do usuário, endereço eletrônico, data, hora de início e de término da conexão, por três anos.

Informação: O provedor precisará informar ao usuário, quando pedir sua identificação, que a conexão obedece às leis brasileiras e que qualquer comunicação será de sua responsabilidade. O responsável pelo provedor poderá ser condenado a uma pena de dois a quatro anos de prisão, se não identificar o usuário.