Título: Fã do presidente, tia erra e anula o voto
Autor: Vera Rosa, Tânia Monteiro, Leonencio Nossa
Fonte: O Estado de São Paulo, 02/10/2006, Especial, p. H4

Vestida com sua melhor roupa - um costume cor-de-rosa, enfeitado com jóias douradas -, Corina Guilhermina da Silva, 77 anos, tia do presidente Lula e sua parenta mais próxima em Caetés, onde ele nasceu no agreste pernambucano, gastou cinco minutos para votar.

Entrou na seção eleitoral às 10h, deixou as impressões digitais do polegar direito na ficha e dirigiu-se à urna eletrônica. Na hora de escolher o presidente, marcou o número 38 e confirmou com a tecla verde.

Voto nulo. Não adiantou um fotógrafo do Recife soprar 13 nem duas mesárias ajudarem à distância. Uma mensagem na tela advertia que o número estava errado, mas Corina não corrigiu sua opção.

Analfabeta, ela nem percebeu que o sobrinho perdeu seu voto.

¿Enquanto eu viver, voto no Lula, porque ele é honesto e eu não acredito nessas coisas que andam dizendo contra o governo¿, disse Corina, ao voltar para casa, no Sítio Poços de Caetés, a 6 quilômetros da cidade.

Irmã do pai de Lula, que tinha gleba de pouco mais de 13 hectares, ali ao lado, na Várzea Comprida, Corina vive com o marido, José Caetano da Silva, da renda da aposentadoria, um salário mínimo para cada um. O casal planta milho e feijão para despesa.

Ruth, a neta de 17 anos que faz companhia aos avós, não sabe ler nem escrever porque Corina não deixa que ela freqüente uma escola vizinha. A casa tem luz, televisão e geladeira, mas não tem banheiro. ¿A gente vai ali no mato¿, informa José Caetano, apontando umas moitas no quintal.

Outra tia de Lula, Maria, mora em Venturosa, na mesma região de Garanhuns, município ao qual pertencia Caetés, quando ele nasceu em 1945 e migrou para São Paulo, sete anos depois. A maioria dos primos que deixou aqui - mais de 40, contando as novas gerações - são parente por parte da mãe.

¿Ninguém tira essa eleição de Lula¿, previa no sábado José Florêncio Filho, o Duda, 68 anos, um dos primos mais próximos. ¿Moramos juntos na Vila Carioca quando trabalhei uns anos em São Paulo¿, disse ele, folheando fotografias da família. ¿Quero deixar isso para os tataranetos, porque em mil anos não vai sair mais matuto daqui pra ser presidente¿, orgulha-se.

Apesar de tudo o que se falou contra Lula, ele teve 85% dos votos válidos no município de Caetés, de 26 mil habitantes e 15 mil eleitores, de acordo com o juiz eleitoral local. A previsão era de maioria também em Garanhuns - 126 mil habitantes, 79 mil eleitores -, que considera Lula um filho da terra, já que Várzea Comprida pertencia ao município quando ele nasceu.