Título: Somos mais diferentes do que parecia
Autor: Giovana Girardi
Fonte: O Estado de São Paulo, 23/11/2006, Vida&, p. A19

Na busca para saber o que faz uma pessoa ser diferente da outra, não só na aparência ¿ cor dos olhos, tipo de cabelo, porte físico ¿, mas principalmente na incidência de doenças congênitas ou propensão a desenvolver certos males, um grupo de pesquisadores construiu um novo mapa do genoma humano que identifica variações de um indivíduo para outro em grandes trechos do DNA e mostra que somos muito mais diferentes do se que imaginava.

Até pouco tempo atrás a ciência considerava que a humanidade era 99,9% igual. Agora os cientistas perceberam que as variações podem ser de até 0,5% entre um indivíduo e outro. Pode parecer pouco, mas, para se ter uma idéia, essa é a diferença entre o Homo sapiens e os neandertais na comparação direta dos genomas.

Há tempos os cientistas já sabiam que as diferenças genéticas podem assumir diversas formas, de anomalias em cromossomos (como na síndrome de Down, na qual, em vez de duas cópias do cromossomo 21, a pessoa tem três) a alterações nos pares de bases nitrogenadas (as letras químicas do DNA). Daí se supunha que as diferenças eram de apenas 0,1%.

Os pesquisadores descobriram que as variações são bem mais significativas ao escanear o código genético de 270 pessoas de populações com ancestrais na Europa, na África e na Ásia. O grupo de 12 instituições de todo o mundo lideradas pela equipe do Instituto Sanger (que participou do seqüenciamento do DNA em 2000), do Reino Unido, mostrou em detalhes como grandes segmentos de DNA, e não apenas uma letra aqui outra acolá, diferem entre os indivíduos.

Usando uma nova técnica de mapeamento, eles buscaram as chamadas variações no número de cópias (CNV, na sigla em inglês) de seqüências de DNA. Na prática, conjuntos de letras, que podem chegar a compor vários genes, aparecem deletados ou duplicados. Ou seja, em vez das tradicionais duas cópias de cada gene (um do pai e outro da mãe), às vezes as pessoas não apresentam nenhuma, às vezes três, como no caso dos pacientes com Down.

O estudo mostra que, somadas as peculiaridades observadas em cada voluntário, há pelo menos 1.447 variações, que cobrem 12% do genoma humano. Mas individualmente, em vez de sermos diferentes em 3 milhões de letras, como se imaginava (o tal 0,1%), acredita-se que a variação entre indivíduos pode ser entre 5 milhões e 20 milhões (0,5%). Com essa comparação, os pesquisadores tentam delimitar o que é ¿normal¿ e o que não é. O que determina mudanças na aparência e o que representa problemas.

Das variações localizadas, 285 estão associadas a doenças ¿ de esquizofrenia a problemas coronários. ¿Com a nova ferramenta, seremos capazes de detectar previamente deleções ou duplicações no genoma do paciente e identificar quais dessas mudanças são relativas a uma doença¿, diz Nigel Carter, do Instituto Sanger. O trabalho foi descrito nas revistas Nature, Nature Genetics e Genoma Research.