Título: Economista quer política industrial 'turbinada'
Autor: Nilson Brandão Junior
Fonte: O Estado de São Paulo, 04/10/2006, Economia, p. B3

A política industrial precisa ser turbinada pelo próximo governo, independentemente do candidato que vença a disputa presidencial, para compensar as perdas provocadas pelo câmbio fraco ao setor. A avaliação foi feita pelo coordenador do Grupo de Indústria do Instituto de Economia da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), David Kupfer. De forma geral, na avaliação de especialistas, a estratégia, considerada de longo prazo, não surtiu ainda os efeitos esperados.

'Ativar mais a política industrial é uma missão para o governo que vem, embora o debate sobre a necessidade de política industrial no País permaneça vivo', diz Kupfer. Autor de livros sobre o assunto, ele explica que justamente os quatro setores considerados prioritários na política - fármacos, bens de capital, software e semicondutores - são diretamente prejudicados pelo câmbio baixo, que favorece a entrada de produto estrangeiro no País.

Kupfer argumentou que, ainda que o futuro governo tenha 'mais propensão ou menos' para praticar política industrial, a necessidade de novas medidas aumenta, com a progressiva perda de competitividade. 'No horizonte de médio prazo, a capacidade de sobrevivência de alguns setores piora', explica. O economista comenta que não estão totalmente nítidos, ainda, os programas econômicos dos candidatos em geral nem quanto à política industrial, em particular.

LONGO PRAZO

Editor do Boletim de Conjuntura Industrial do Ipea, Francisco Luna, reconhece que havia uma grande expectativa quando do lançamento da atual política industrial, mas seus efeitos não foram sentidos ainda porque 'são de mais longo prazo'. Além das ações ligadas aos quatro setores prioritários, a política inclui outras ações, como a Lei de Inovação, reestruturações na área de propriedade industrial e novos mecanismos de financiamento.

'Não é uma política de resultados imediatos', pondera Luna. O economista da UFRJ defende, contudo, 'um reforço na artilharia', com linhas de financiamento maiores, maior abrangência . Kupfer explica que a política foi concebida numa situação diferente da atual, com o real mais desvalorizado, de 2002 para 2003. 'O objetivo é meritório, mas se tornou mais difícil de alcançar nas condições atuais', afirma Kupfer.

O diretor de Desenvolvimento da Agência Brasileira de Desenvolvimento da Indústria (ABDI), Mário Salerno, concorda que o câmbio provoca impactos na produção, mas afirma que são diferenciados pelos segmentos. No caso das máquinas, a equação para determinados segmentos piora, mas o financiamento atrelado às compras acaba tendo peso mais significativo. No caso da microeletrônica, há articulações para montagem de fábrica de chips no País.

Salerno reconhece, contudo, que a política industrial precisa ser aprofundada e antecipa alguns caminhos. Um deles é a nova ação setorial, como a em estudo para a cadeia de produção do etanol, além de outras atividades. Indica também o foco em 'começar a rodar' alguns instrumentos recentes, como incentivos fiscais para pesquisa e desenvolvimento. Regulamentados por decreto em junho, as regras dos incentivos ainda estão sendo assimiladas pelas empresas.

No âmbito do BNDES, as linhas de crédito ligadas aos quatro setores prioritários somam financiamentos perto de R$ 5 bilhões. Voltado ao segmento de máquinas e equipamentos, o Modermaq liberou R$ 3,5 bilhões, até agosto, informou o banco. Já o Profarma, linha para o segmento farmacêutico, financiou R$ 891 milhões, segundo o boletim do Ipea.