Título: Cemig acelera e busca fatia maior do setor elétrico
Autor: Renée Pereira
Fonte: O Estado de São Paulo, 21/10/2006, Economia, p. B6

A Companhia Energética de Minas Gerais (Cemig) decidiu pisar no acelerador e seguir os passos da estatal federal Eletrobrás, que tem elevado de forma agressiva sua participação no setor elétrico brasileiro. Nos últimos meses, a companhia controlada pelo governo mineiro anunciou a compra de importantes ativos fora de sua área de concessão, ganhou a disputa de licitações de hidrelétricas e ainda estreou no mercado internacional - fazendo jus ao espírito desenvolvimentista de seu fundador Juscelino Kubitschek, na década de 50.

O objetivo da empresa, que atua em geração, distribuição, transmissão e comercialização, é tornar-se a consolidadora do setor, a exemplo da Eletrobrás. Para isso, pretende investir na expansão de suas atividades até o limite permitido pela regulação da Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel). O pontapé inicial para alcançar a meta foi dado com a aquisição, em parceria com Andrade Gutierrez e Pactual Energia, da concessionária Light do Rio de Janeiro, por US$ 319,8 milhões.

A compra anunciada em março elevou para 14,12% a participação da empresa no mercado nacional de distribuição, nível ainda longe do limite legal permitido pela Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel). Um sinal de que a companhia ainda tem espaço para crescer no segmento, que tem 64 distribuidoras no território nacional.

Na área de transmissão de energia, a Cemig adquiriu cinco empreendimentos da Schahin e fez a sua estréia nas Regiões Norte, Nordeste e Sul do Brasil. Foram comprados 2.159,5 km de extensão de linhas, em parceria com a canadense Brascan e a americana MDU. Antes do negócio, a malha da estatal mineira era de 4.858 km. Além disso, a empresa vai disputar 6 das 14 linhas a serem leiloadas em novembro pelo governo federal.

Em geração, um dos negócios mais esperados é a compra da termoelétrica Norte Fluminense (780 MW), do grupo francês EDF. 'Mas ainda não há nada concluído. Apenas tivemos autorização do comitê para fazermos propostas', afirma o superintendente de Relações com Investidores, Luiz Fernando Rolla. Ele lembra ainda que a Cemig ganhou, em dezembro, a concessão para construir a Usina de Baguari (140 MW), em parceria com Furnas.

O executivo destaca que o volume de investimento da estatal neste ano vai chegar à casa de R$ 2 bilhões, valor que deve ser repetido em 2007. Uma parte disso vai para compra de empresas e empreendimentos e outra fatia para a construção de obras. Rolla, que está há 32 anos na Cemig, afirma que a estratégia de crescer por meio de aquisições é resultado da mudança do marco regulatório do País, a partir de 2003.

Isso é explicado por um ex-diretor, que trabalhou 30 anos na estatal e hoje é presidente da Associação Brasileira dos Geradores de Energia Elétrica (Abrage), Flávio Neiva. Segundo ele, no passado a empresa crescia por meio da construção de usinas autorizadas pelo governo. Hoje essas hidrelétricas são concedidas por meio de disputa em leilão público. 'Por isso, desenhamos um plano estratégico que buscava aumentar a participação da empresa no mercado e colocar a Cemig como um dos consolidadores do setor', afirma Rolla.

Na avaliação dele, a exemplo do que está ocorrendo no resto do mundo, o setor elétrico brasileiro terá no futuro entre 6 e 10 grandes empresas à frente da expansão. No mercado externo, a Cemig está construindo uma linha de transmissão no Chile, fato considerado um grande passo para a internacionalização da companhia. O direito de implantação e exploração do empreendimento foi concedido em 2005, quando a Cemig venceu o processo de licitação ao lado da Alusa, de São Paulo.

Para os investidores privados, o avanço de uma estatal no setor sempre causa reclamações pelo fato de as empresas não obedecerem os princípios de racionalidade econômica. Mas, nesse caso, não há queixas. O presidente do Instituto Acende Brasil, que representa investidores privados, Cláudio Sales, explica que a Cemig avalia de forma criteriosa o retorno dos empreendimentos, ao contrário do que ocorre com a Eletrobrás. 'A empresa tem um comitê interno que avalia cada projeto antes de investir. '

ÁREA FINANCEIRA

A explicação para esse rigor está no mercado de capitais. As ações da estatal mineira são negociadas em Nova York e Madri, além da Bolsa de Valores de São Paulo (Bovespa). No período de um ano, as ações ordinárias da Cemig tiveram valorização de 31,76%, ante 20,67% do índice Bovespa. Segundo o vice-presidente da Moody's América Latina, Richard Sippli, em termos financeiros a empresa teve uma melhora significativa na geração de caixa, o que deverá permitir a revisão para cima do rating da companhia.

De acordo com o executivo, isso será possível pela melhora da governança corporativa e dos indicadores de crédito, com elevação do caixa e melhora do perfil de vencimento da dívida. 'Em geral, as empresas conseguiram recuperar as perdas do racionamento e tiveram mais acesso ao mercado financeiro, que também melhorou pelo excesso de liquidez no mercado internacional. Com isso, conseguiram recuperar o caixa, rolaram dívidas e readequaram o perfil dos débitos', afirma Sippli.

Outra missão da Cemig nos próximos meses - além de disputar a compra dos empreendimentos no mercado - é resolver a situação de algumas usinas cujo contrato de concessão está terminando. A empresa terá de trabalhar ao lado da Aneel para renovar os contratos e manter o controle das usinas.