Título: Grupo do Ceará produz cabrito com gene humano
Autor: Cristina Amorim
Fonte: O Estado de São Paulo, 21/10/2006, Vida&, p. A37

O primeiro cabrito transgênico da América do Sul nasceu - e morreu - no Ceará. A intenção é que os bichos, vivos, produzam uma proteína humana no leite usada por pacientes com sistema imunológico debilitado.

A confirmação de que Carlos, como foi chamado, era mesmo transgênico só veio no início do mês, na segunda análise do DNA. Ele era o único cabrito dessa primeira experiência, que gerou 14 filhotes, com o gene da proteína.

Segundo o coordenador do projeto, o pesquisador Vicente Freitas, da Universidade Estadual do Ceará (Uece), a morte do animal - causada por uma nefrite (inflamação nos rins) - não está relacionada à transgenia. Carlos e sua irmã gêmea nasceram prematuramente e parecem ter sido contaminados no parto. A mãe morreu dois dias depois de dar à luz por causa de uma infecção.

¿Tivemos azar. Mas isso não diminui o feito¿, diz Freitas. ¿Agora podemos repetir a experiência com a certeza de que estamos habilitados, de que os embriões são viáveis e de qualidade, e de que temos uma taxa de sucesso alta em relação aos índices dos experimentos no exterior.¿

A técnica usada foi desenvolvida em parceria com cientistas ligados à Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), mas até então só havia sido aplicada em camundongos. O grupo da Uece injetou nos embriões, logo após a fertilização, o gene humano da proteína G-CSF, que estimula a produção de glóbulos brancos e recruta células-tronco da medula óssea para fortalecer o organismo.

A equipe se prepara para o segundo teste, que acontece no primeiro semestre do ano que vem. Freitas promete publicar os dados do teste em breve em uma revista científica.

RETORNO FINANCEIRO

Transgênicos usados como fonte de medicamento são chamados de biorreatores. A indústria farmacêutica aposta que animais que secretem insulina para diabéticos, fator coagulante para hemofílicos e toda a sorte de proteínas de uso terapêutico podem baratear a produção - após o investimento inicial em pesquisa, normalmente alto, ser amortizado.

Há um mês, a Agência Européia de Medicina aprovou o ATryn, droga da americana GTC Bhioterapeutics feita a partir de cabras transgênicas. Ela contém um agente anticoagulante para pessoas com uma doença rara - a deficiência antitrombina hereditária, que as torna vulneráveis à trombose.

Esse é o primeiro remédio do mundo produzido por animais alterados geneticamente. Espera-se que chegue ao mercado europeu no ano que vem. Uma empresa holandesa prepara-se para fazer um pedido semelhante.

No Brasil, a Embrapa Recursos Genéticos e Biotecnologia tenta criar vacas transgênicas com o gene humano do fator 9 de coagulação do sangue.