Título: 'Temo que Lula sofra tentações chavistas', diz Cristovam
Autor: Gabriel Manzano Filho
Fonte: O Estado de São Paulo, 19/08/2006, Nacional, p. A16

Se o presidente Luiz Inácio Lula da Silva for reeleito no primeiro turno com grande quantidade de votos, poderá ter "tentações chavistas", advertiu ontem o candidato do PDT à Presidência, Cristovam Buarque, numa referência ao presidente venezuelano Hugo Chávez. "Não penso em golpe, em prisão nem em censura", afirmou ele, "mas no risco de ele usar o poder carismático, diante de um Congresso desmoralizado, para governar por plebiscito."

A advertência foi feita no ciclo de entrevistas Eleições 2006 no Estadão, ontem de manhã, no auditório do Estado. Cristovam, que tem se mantido em torno de 1% das intenções de voto nas principais pesquisas, foi o segundo entrevistado da série, iniciada na quarta-feira com o candidato Geraldo Alckmin. O próximo debate será no dia 22, terça-feira, com o candidato do PT ao governo paulista, Aloizio Mercadante.

O risco de um presidente muito forte e com minoria no Congresso, advertiu Cristovam, torna importante um segundo turno, que vai obrigar o vencedor "a negociar, conversar, saber que há outras visões do mundo e do Brasil", não só a dele. "Se Lula tiver 60 milhões de votos no primeiro turno e o PT só fizer uns 30 deputados, pode começar a convocar plebiscitos para aprovar seus projetos por cima do Congresso. E, de repente, tentar um terceiro mandato, como outros já fizeram na América Latina, através de um plebiscito."

Ele teme essa possibilidade não porque Lula tenha vocação autoritária, mas por considerar que, em política, os homens atuam conforme as circunstâncias. A recente sugestão de uma Constituinte exclusiva para fazer a reforma política pode, para Cristovam, ser considerada um exemplo inicial de traços chavistas. "O Chávez fez um pouco isso", comparou. "Até ditar uma Constituição. Por isso o segundo turno é muito importante."

E a desmoralização do Congresso pode até legitimar esse tipo de iniciativa. "Nós, congressistas, estamos colaborando para essa alternativa, se o povo não se mobilizar."

Na entrevista, o candidato voltou a falar de seu projeto prioritário - uma "revolução pela educação" -, mas discutiu, também segurança pública, reforma agrária, corrupção, diplomacia. Não se furtou a falar de seus modestos índices nas pesquisas. "É difícil viabilizar uma mudança de mentalidade", observou.

E fez seguidas críticas a Lula. Disse que o presidente "já saiu do PT" e, como governante, "tem medo de metas".

Detalhou em seguida alguns de seus projetos. Por exemplo, convocar 1 milhão de jovens para um serviço cívico e militar, para tirá-los das ruas. Também criticou a diplomacia do governo Lula. Para ele, não vale a pena brigar com a Argentina por causa de uma cadeira na ONU

A entrevista teve como mediador o jornalista Roberto Godoy. Participaram Sonia Racy, Dora Kramer, Luiz Henrique Fruet, Filomena Saleme e Daniel Galvão, todos jornalistas do Grupo Estado.