Título: Proclamado vencedor, Calderón governará um México dividido
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Fonte: O Estado de São Paulo, 06/09/2006, Internacional, p. A15

A Justiça Eleitoral mexicana proclamou ontem o governista Felipe Calderón, do Partido Ação Nacional (PAN), presidente eleito do México, pondo fim a uma disputa legal iniciada logo depois do fechamento das urnas da eleição presidencial de 2 de julho. A declaração da vitória foi um alívio para a cúpula do PAN, mas está longe de acabar com a crise mexicana. O presidente eleito receberá, em 1º de dezembro, um país dividido e à beira da desobediência civil.

O candidato centro-esquerdista Andrés Manuel López Obrador, do Partido da Revolução Democrática (PRD), reiterou que não reconhecerá o governo de Calderón. López Obrador insiste que houve fraude e seus partidários continuam bloqueando as principais vias do centro da capital, onde estão há mais de um mês exigindo a recontagem total dos votos. Já Calderón voltou a pedir o diálogo e a união de todas as forças políticas.

O resultado da eleição ratificado pela Justiça Eleitoral indicou uma vantagem de apenas 233.831 votos (0,56% do total de 41,6 milhões de eleitores) de Calderón sobre López Obrador. A divisão que ficou explícita nas urnas teve mais dois exemplos, um antes e outro após o anúncio oficial de ontem. Numa demonstração da tensão que predomina no país, os juízes do tribunal eleitoral tiveram de passar a noite de segunda para terça-feira no edifício da corte, para evitar que os manifestantes os impedissem de entrar. E, quando o tribunal tornou pública sua decisão de proclamar Calderón, centenas de partidários de López Obrador se puseram em prantos, enquanto uma ensurdecedora salva de fogos de artifício festejava a vitória do candidato do PAN. "Sinto-me mal, mas isso não importa. Calderón cairá tão depressa quanto o impuseram", comentou o médico Alejandro Tovar.

Embora suas ações sejam reprovadas por mais de 70% dos mexicanos - o que inclui uma parte dos 35% de eleitores que votaram em López Obrador -, partidários do PRD advertem que manterão o protesto pelo menos até o dia 16, data nacional, quando realizarão uma "convenção" para escolher "um presidente legítimo" e rejeitam propostas de diálogo. Impasses regionais - como uma violenta greve de professores que se estende por três meses em Oaxaca, no sul do país, e já deixou o saldo de pelo menos três mortos - complicam ainda mais o quadro político.

A missão de observadores da União Européia deu ontem seu aval à decisão da Justiça, atestando que o processo eleitoral foi justo. Mas os partidários do PRD queixam-se não só de irregularidades na apuração, mas também durante a campanha eleitoral. Uma das queixas se refere a um capítulo da telenovela La fea más bella, na qual uma das personagens declarou que votaria no candidato governista. O PAN espera que os governadores e parte dos deputados do PRD convençam López Obrador a baixar o tom.