Título: Governo anuncia redução de 11% no ritmo de desmatamento da Amazônia
Autor: Lígia Formenti
Fonte: O Estado de São Paulo, 06/09/2006, Vida&, p. A18

Entre agosto de 2005 e julho de 2006, a Amazônia Legal perdeu 10.943 quilômetros quadrados de sua floresta - volume equivalente a mais de 3 milhões de caminhões com toras de madeira. O valor, medido pelo sistema de monitoramento em tempo real, o Deter, é 11% menor do que o registrado entre 2004 e 2005 e confirma uma queda no ritmo de desmatamento da região pelo segundo ano consecutivo. Até hoje, a floresta amazônica já perdeu pelo menos 17,49% de sua área original.

Os ambientalistas comemoram a queda, mas lembram que o índice ainda é muito alto: comparada ao registro histórico, a taxa dos últimos dois anos equivale à média da década de 90. "Toda queda só pode ser entendida como notícia boa. Mas ainda é muita coisa", diz Cláudio Maretti, da ONG Fundo Mundial para o Meio Ambiente (WWF). Sobretudo considerando-se o pico atingido no período 2003/2004, quando foram desmatados 26 mil quilômetros quadrados de floresta.

"Contrariando as avaliações feitas por alguns grupos, a redução registrada ano passado não foi episódica. Representa uma resposta à política de governança desencadeada nos últimos anos", afirmou a ministra do Meio Ambiente, Marina Silva. "Conseguimos alcançar índices de 2002. Já é um ótimo sinal."

O número oficial do desmatamento ainda será fechado nos próximos meses, baseado em outro sistema de avaliação por satélite, o Prodes. Por ele, foram devastados em 2005 18,7 mil quilômetros quadrados de floresta - 31% a menos do que em 2004.

INCLINAÇÃO

O secretário de Biodiversidade e Florestas do ministério, João Paulo Capobianco, arrisca uma projeção para o índice oficial da destruição em 2006 pelo Prodes: ela ficaria nos mesmos 11% menos do que a registrada no ano anterior, ou 16,7 km2 a menos de árvores derrubadas entre agosto de 2005 e agosto de 2006.

Para o pesquisador Carlos Souza Júnior, do Instituto Imazon, a projeção é precipitada. Sobretudo porque o sistema Deter capta apenas grandes desmatamentos. "A experiência mostra que as estatísticas do Deter são entre 10% e 20% menores do que a realidade", pondera. No ano passado, o Imazon mostrou uma metodologia para calcular oscilações de desmatamento com as informações do Deter - que tem a base de dados disponível na internet, ao contrário do Prodes.

"Há uma tendência na redução do ritmo de desmatamento, fruto, sobretudo, da criação das unidades de conservação e da maior fiscalização", avalia Souza Júnior. Mas há outros fatores.

AGRONEGÓCIO

Um deles é a queda do preço da soja - cuja cultura sempre foi relacionada à devastação. Não é à toa que a maior queda ocorreu no Mato Grosso, grande produtor do grão. Houve uma redução significativa no ritmo de corte no Estado, que, nos últimos anos, tem sido o principal foco de desmatamento do País. A derrubada no período 2005/2006 foi 34% menor do que entre 2004 e 2005. Ainda assim, Mato Grosso ainda é o campeão do desmatamento, onde boa parte da floresta caiu para dar lugar às plantações.

A ministra não escondeu sua irritação ao ser questionada sobre uma eventual relação entre menor ritmo de devastação e desaquecimento do agronegócio. "É um bom exercício de projeção. Mas precisaríamos ver o que ocorreria também se não tivessem sido feitas as operações para desbaratar quadrilhas, se não tivéssemos fechado empresas que operavam de forma ilegal, se não inibíssemos a venda irregular de terras", rebateu.

Os ambientalistas não desprezam as ações defendidas por Marina como importantes. Aliás, é exatamente por isso que olham os dados com preocupação. A queda vem depois de um pico de mais de 26 mil km2 de floresta derrubada (a segunda maior taxa registrada), e após dois anos de coação, fiscalização e criação de novas unidades de conservação.

"Os dados indicam que o problema é estrutural, não um fenômeno da conjuntura", diz Roberto Smeraldi, diretor da ONG Amigos da Terra. "Se com todas as ações do governo e a crise da soja tivemos um número desses, então podemos ver que um terço do desmatamento tem causa variável, enquanto dois terços vêm de problemas estruturais, como a falta de ordenamento fundiário."

Para Maretti, da WWF, a reação do governo se mostra pequena para o tamanho do problema. "Precisamos de novas áreas de conservação. Enquanto o governo permitir o agronegócio com base ilegal, ações pontuais não geram resultados."

REALIDADE

Ao contrário da tendência geral verificada pelo Deter, em alguns Estados, a velocidade do desmatamento ganhou força. Foi o caso, por exemplo, do Maranhão (pelo crescimento da atividade com ferro gusa ) e do Tocantins.

No Amazonas, a suspeita é de que o aumento seja reflexo da construção da BR-319, entre Manaus e Porto Velho (RO).