Título: Indústria têxtil protesta contra a política econômica do governo
Autor: Marcelo Rehder
Fonte: O Estado de São Paulo, 06/09/2006, Economia, p. B8

Pela primeira vez, empresários e trabalhadores da indústria têxtil e de confecção dividiram o palanque para protestar contra a política econômica. A manifestação, realizada ontem em São Paulo e em mais 20 cidades do País, foi contra fatores macroeconômicos que vêm roubando competitividade das empresas do setor, que se dizem obrigadas a demitir para compensar a perda de vendas.

Entre as dificuldades, a indústria e os trabalhadores criticaram a pesada carga tributária, o câmbio supervalorizado e a concorrência desleal das importações chinesas, além do fato de o País ter os juros mais altos do mundo.

"Somos competitivos até a porteira das fábricas e não queremos esmola, apenas equilíbrio na competição com outros países", disse o diretor-superintendente da Associação Brasileira da Indústria Têxtil e de Confecção (Abit), Fernando Pimentel, durante ato no vão livre do Masp, com cerca de 1 mil pessoas. Segundo ele, o setor já demitiu 260 mil pessoas nos últimos quatro anos e tem sofrido com o aumento das importações e a queda das exportações.

De janeiro a agosto, as importações cresceram 38,8% ante igual período de 2005 e atingiram US$ 1,381 bilhão. Já as exportações somaram US$ 1,309 bilhão, uma queda de 1,1%.

Até agosto, o saldo comercial estava negativo em US$ 72,4 milhões, ante um superávit de US$ 255,4 milhões em igual período de 2004. "Mantido esse ritmo, vamos fechar 2006 com déficit de US$ 200 milhões a US$ 300 milhões", observa Pimentel. Se isso se confirmar, será a primeira vez em seis anos que a balança comercial do setor ficará deficitária.

Os produtos chineses que entram legalmente no País são vendidos a preços 40% menores que os similares nacionais. "O problema é que boa parte deles entra por baixo do pano, sem pagar impostos", diz Pedro Fortes, presidente do Sindicato da Indústria do Vestuário.

A Brasil Modas, confecção paulista de ternos, é um bom exemplo da crise no setor. Sem ter como enfrentar os ternos chineses, que chegam a ser vendidos no País por R$ 40, a empresa já demitiu 300 funcionários e há dois meses não consegue pagar o salário dos 100 que continuam trabalhando.

A empresa está parada porque teve a eletricidade cortada. "Depois de dois meses sem receber, a gente não tem nem o que comer", reclama a costureira Márcia Roseli, que participava do protesto com um grupo de colegas.

O presidente da Abit, Josué Gomes da Silva, filho do vice-presidente da República, José Alencar, não compareceu ao protesto, que tinha como principal alvo a política econômica do governo. Nenhum assessor soube explicar o motivo de sua ausência, embora a entidade dirigida por ele fosse a principal organizadora do ato.

Já o presidente licenciado da Força Sindical e candidato a deputado federal pelo PDT de São Paulo, Paulo Pereira da Silva, o Paulinho, foi um dos participantes mais eloqüentes. Paulinho chegou a propor o bloqueio dos desembarques de produtos têxteis chineses no Porto de Santos. "Vamos segurar os navios com produtos chineses e tacar fogo na baixada (Santista)", afirmou o candidato a deputado.

Em Americana (SP), cerca de 3 mil empresários e trabalhadores de quatro cidades do pólo têxtil, participaram do protesto. Eles interromperam por meia hora a Rodovia Anhangüera, no quilômetro 125.

Maior produtor de tecidos planos de fibras artificiais e sintéticas da América Latina , o pólo de Americana é responsável por 85% da produção brasileira. Em 2004, chegou a fabricar 160 milhões de metros lineares por mês. Com a invasão dos chineses, a produção estimada para este ano é de 130 milhões de metros, segundo o Sindicato das Indústrias de Tecelagens de Americana e Região.